domingo, 10 de novembro de 2024

 

RESISTÊNCIA COMO ESTRATÉGIA À NÃO MUNICIPALIZAÇÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DE SC.

As últimas avaliações do IDEB comprovaram o quão decadente está a educação pública brasileira. Diante de tal realidade nada animadora o que se esperava era o engajamento das forças políticas junto com a sociedade na construção de propostas emergentes que assegurasse maior aporte do PIB no financiamento das estruturas físicas, pedagógicas e salariais dos trabalhadores da educação. Parece que não é exatamente essa a intenção dos gestores públicos de estados e municípios que vem cumprindo a risca as políticas impostas pelo grande capital que é flexibilizar ao máximo os serviços públicos, como a entrega de escolas públicas estaduais a grupos empresariais visando exclusivamente o lucro.     

O caso recente ocorrido no estado do Paraná onde foi criado o famigerado “parceiro da escola”, são empresas que terceirizaram cerca de 200 unidades de ensino públicas.  Esses segmentos particulares terão autonomia de contratar merendeiras, servidores gerais e até mesmo ACTs.   Claro que a intenção do governo é se ver livre desse compromisso constitucional, precarizando ainda mais o já decadente ensino público. Todos sabem que quando uma corporação adquire uma instituição pública, saúde por meio das OSS (Organizações Sociais da Saúde); tele comunicação; transporte, etc, o objetivo principal é o lucro, e na educação não é diferente.

O Paraná é um exemplo revelador de como o Estado vem se utilizando de instrumentos legais sórdidos para  privatizar escolas públicas. Lá o governo criou uma nomenclatura palatável, o “parceiro da escola”, que nada mais é do que entregar de inicio 200 escolas para que o parceiro mercado gerencie. Mesmo com toda a pressão da sociedade não foi possível impedir que a assembleia legislativa paranaense, de maioria entreguista, aprovasse o PL 345/24 que culminou na fragilização ainda maior da escola pública.

Proposta parecida ao do estado paranaense também aconteceu em Santa Catarina quando o governo Jorginho Melo, bolsonarista de carteirinha, em 2023, sancionou lei concedendo bilhões de reais dos cofres públicos para as chamadas universidades comunitárias. O que deveria ter feio o governo, em vez de agradar esse segmento que ajudou a sagrar-se vitorioso no pleito de 2022, era ter disponibilizado esses mesmos recursos para melhorar a infraestrutura e o processo de ensino da rede pública básica. Sem esquecer que o Estado tem a sua instituição de ensino superior, a UDESC, que sofre sucateamento e falta de campis em várias regiões do estado.

A redução da intervenção do Estado na educação básica também se estende para outros estados, como São Paulo, onde nos últimos dias o governo, também bolsonarista, leiloou 33 escolas básicas para grupos empresariais, tanto para a construção e manutenção num prazo de 25 anos. O governo do estado paulista reiterou que o processo pedagógico continuará sob a responsabilidade do Estado, ficando apenas a estrutura física e demais serviços de responsabilidade das empresas. A crítica lançada tanto pelo sindicato da rede estadual paulista, como pelos demais profissionais da educação, é que esse é o primeiro passo para que essas e outras escolas sejam integralmente entregues ao mercado, acabando definitivamente com concursos de acesso de docentes e planos de carreira.

No estado de Santa Catarina, desde o final da década de 1990, o magistério público estadual vem convivendo com o fantasma da municipalização das escolas geridas pelo Estado. De acordo com a LDB tanto os estados como os municípios podem compartilhar a gestão da educação fundamental. Entretanto, é de responsabilidade dos municípios a gestão do ensino infantil, garantindo espaços físicos ideais e profissionais capacitados no exercício das funções.    Os governos estaduais que se sucederam a partir das primeiras décadas do século XXI tentaram ininterruptamente fazer valer seu autoritarismo, estragando muitas escolas aos gestores municipais, sucateando-as ainda mais. Na realidade, um dos objetivos da entrega é sim livrar-se de compromissos como contratação de professores.  

As experiências mais contundentes de municipalização ocorreram durante o governo de Raimundo Colombo, porém, medidas essas passaram a se repetir mais frequentemente no atual governo de Jorginho Melo. Comprovadamente muitas das escolas que se municipalizaram não obtiveram êxitos em relação à melhoria na qualidade do ensino. Um dos agravantes é que o apadrinhamento político prevalece e irá prevalecer ainda mais em vários municípios, principalmente no aspecto gestão escolar, cujos diretores continuam sendo por indicação política.

Em 2023 o governo de Jorginho Melo entregou quatro escolas estaduais de ensino fundamental aos municípios, sendo uma delas a Eufrásia Rocha, no município de Maracajá. É claro que esse procedimento não segue princípios democráticos, como a consulta à população se concorda ou não com o repasse da unidade de ensino ao município. Muitos podem até querer argumentar que seria perda de tempo resistir a imposições verticalizadas, de um lado, o estado, oferecendo-as, e do outro, o município, recebendo-as.

Mas não foi o que ocorreu em Araranguá, sendo duas escolas estaduais indicadas para serem municipalizadas, uma delas, a EEF Mota Pires, situada no bairro Sanga da Toca. Informações repassadas confirmaram que o estado ofereceu ao município outras três ou quatro escolas, além dessas duas destacadas acima. Quando se imaginava que seria mais uma entrega de escola sem resistência, os fatos mostraram o oposto, a comunidade da Sanga da Toca, junto com os professores e o corpo gestor, se ergueram e foram para o enfrentamento com o município e o Estado. Claro que o epicentro da resistência foi corpo gestor, eleito pela comunidade, que tomou a frente na luta pela permanência da escola à rede estadual de ensino.

Depois de ter havido manifestação em frente à prefeitura do município, onde o prefeito simplesmente virou as costas aos manifestantes, o corpo gestor articulou reunião na escola, convidando a comunidade escolar, a secretária da educação municipal e o coordenador regional ensino, representando o governo do estado. Por cerca de uma hora todos os presentes puderam se manifestar expondo seus argumentos favoráveis e desfavoráveis acerca da municipalização. Em relação à escola Mota Pires, a gestora da escola foi enfática em afirmar que não havia motivo para a entrega da mesma ao município, pelo fato de ser a unidade de ensino, referencia no estado em inclusão de estudantes com deficiência visual. Diante disso, não havia qualquer certeza de que o município daria continuidade a esse projeto premiado em âmbito estadual e federal.

Alguns dias depois da realização da reunião e que teve forte mobilização da comunidade, a gestora da escola, gravou vídeo, expondo aos moradores do bairro que o município de Araranguá havia desistido de municipalizar a respectiva escola. Uma vitória da mobilização, que deve servir de exemplo para outras escolas que estão no radar da municipalização. É preciso aqui entender a jogada sórdida do atual governo. Há poucos dias o governo usou as principais redes de comunicação do estado para divulgar que havia promovido um dos maiores concursos públicos para o magistério estadual. Gastou milhões de reais com tais publicidades.  

Acontece que milhares dos professores aprovados no concurso poderão ficar por anos sem acessar as escolas. Como assim? Com a municipalização muitos dos professores efetivos dessas unidades de ensino terão de ser removidas ocupando vagas excedentes, que seriam preenchidas pelos concursados. Portanto, com a municipalização o governo estadual irá economizar milhões de reais, é claro que todo esse dinheiro não será revertido em melhorias das escolas do ensino médio, nem melhorar a remuneração dos professores, parte dele é para financiar campanhas eleitorais, como já é de praxe.

Prof. Jairo Cesa          

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