AS
VEIAS CONTINUAM ABERTAS DA AMÉRICA LATINA
Quando
em 1986 entrei na FESC, hoje UNUSUL, para cursar história, pude ter contato com
uma das obras primas da literatura latino americana, cuja leitura mudou minha
compreensão sobre o processo de ocupação da América latina durante a expansão
marítima espanhola e portuguesa, o real motivo da população até aquele momento manter-se
subjugada a um quadro de miséria assustadora. A obra literária a qual me refiro se chamava
as Veias Abertas da America latina, escrita pelo professor uruguaio Eduardo
Galeano.
O
professor Galeano trouxe a superfície, cenários assustadores de indígenas submetidos
a trabalhos estafantes nas minas de prata, cobre, ouro, para saciar o desejo de
poder e ostentação dos nobres e seus asseclas. Por estar quase toda a America Latina
sob o domínio espanhol, exceto uma pequena fração de terra mais ao sul,
controlada pelos portugueses, ambos adotaram modelos organizacionais
semelhantes, mercantilista escravocrata.
O
pau brasil, cana de açúcar, café, algodão, borracha, entre outros produtos de
extrativismo vegetal e mineral, financiaram impérios e transformaram a Europa,
tirando-a de um atraso econômico secular. Ainda hoje é visto nas decorações de
igrejas e suntuosos palacetes aqui e na Europa o brilho reluzente do ouro, da
prata, onde ainda verte o sangue, suor e lágrimas, de homens, mulheres e
crianças que sacrificaram suas vidas sob as ordens dos déspotas.
Embora
o domínio português e espanhol sobre a América latina tenha sido suprimido e
surgido nações autônomas, com governos próprios, as marcas do colonizador
jamais foram dissipadas. A submissão de homens, mulheres e crianças a trabalhos
insalubres e com salários baixos permaneceram enraizadas nas culturas. Muitos séculos se passaram, a América latina
se modernizou, porém não suficientes para romper definitivamente com os grandes
bolsões de miséria e o jugo dominador das grandes potências econômicas mundiais.
Inglaterra
e depois Estados Unidos, final do século XIX e começo do XX, fincaram aqui suas
afiadas garras, subjugando governos para a aplicação de modelos produtivos que
os tornariam dependentes, como colônias fornecedoras de produtos primários. Terminou
o século XX, e o cenário econômico, político e social de quase todas as
ex-colônias espanholas e portuguesas na América Latina continuavam desolador.
Freqüentes
golpes de Estados e a ascensão de regimes ditatoriais sangrentos deram o tom em
muitos países latinos, financiados por potências econômicas interessadas em
manter aqui seu domínio econômico. Algumas experiências de governos populares
promoveram discretas transformações sociais, não ao ponto de reverter as
profundas desigualdades sociais que insistem em permanecer como um vírus incurável.
Todos os problemas que assolam milhões de cidadãos e cidadãs latino americanos
têm sua raízes no modo como a região foi ocupada há mais de cinco séculos.
O
século XXI tem se configurando como um período de grandes retrocessos econômicos
e sociais. Os modelos econômicos neoliberais protagonizados por grandes
potências econômicas, disseminados entre os países periféricos como o Brasil através
do FMI e Banco Mundial, vêm provando que a América Latina permanece com suas
veias abertas, onde alimenta com seu sangue os privilégios de uma pequena
fração de bem nascidos cidadãos.
A
ascensão de governos ultra liberais, a exemplo do Brasil, é uma demonstração
cabal do impacto resultante do baixo investimento em educação e cultura. Quando
vemos governos se vangloriando por assinar acordos de livre comércio entre a União
Européia e o MERCOSUL, isso prova que nada aprendemos com o passado. O levante popular
no Chile contra as políticas reformistas sanguinárias, a vitória eleitoral de
Fernandes na Argentina e Morales na Bolívia, são sinais de que ainda pulsa
esperança de um dia conquistarmos nossa verdadeira liberdade.
Prof.
Jairo Cezar
Nenhum comentário:
Postar um comentário