segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

 

AGROTOXICOS E O AUMENTO DOS DIAGNÓSTICOS DE CÂNCERES E OUTRAS DOENÇAS DEGENERATIVAS

 

Antes de aprofundar o tema agrotóxico quero aqui testemunhar um fato ocorrido no Hospital Regional de Araranguá. Foi numa sexta-feira, pela manha, quando meu pai teve que ser internado no setor de emergência devido a uma crise respiratória. No quarto onde ele estava, um cidadão aparentando sessenta ou setenta anos, com corpo quase esquelético esperava por atendimento. Como é de costume das inúmeras vezes que acompanhei meu pai nas internações realizadas, sempre procurei conversar com os pacientes para saber mais sobre o histórico delas, pois geralmente nas falas estão as respostas das enfermidades das quais estão acometidos.

O cidadão que dividia o quarto de emergência com o meu pai me falou que estava enfrentando um câncer de pulmão há algum tempo, que sua idade era bem aquém do que eu havia presumido quando o vi, não sessenta ou setenta, mas cinquenta anos. Ainda era muito jovem de acordo com sua idade cronológica, porém, a doença estava lhe consumindo dia após dia, apresentando mínimas as chances de cura.

O paciente me confessou que havia fumado por trinta e quatro anos, que trabalhou bastante tempo no cultivo de tabaco e arroz. Perguntei se ele usava com rigor o EPI – Equipamento de Proteção Individual. Respondeu que quando trabalhou com o cultivo de arroz não havia equipamentos mais complexos como as atuais máquinas para pulverização de agrotóxicos, que na época o processo era manual, que não sabe o número de quantas vezes ficou intoxicado com o veneno.

Ouvindo-o pude ter mais clareza de que dezenas, centenas de pacientes que procuram as unidades de pronto atendimento, hospitais e centros de tratamento de doenças degenerativas como câncer, tem, sim, a/as doença/as motivada/as por contato contínuo com venenos aplicados na agricultura. Lembro que há pouco tempo uma das poderosas corporações que controla o segmento de sementes transgênico e agrotóxico foi condenada nos EUA a pagar indenização bilionária de 7,6 bilhões de reais a quatro pessoas por ter sido ela responsável por melanomas contraídos decorrente da exposição ao glifosato, um dos principais agrotóxicos comercializados pela empresa.

Se a decisão não for derrubada por liminares essa decisão poderá sofrer efeito cascata e valer para o resto do planeta onde o produto é comercializado e existir outros casos confirmados de ter sido o principio ativo Monsanto o causador. Voltando ao caso do cidadão internado no Hospital Regional de Araranguá, acometido por melanoma no pulmão, é fato que a doença contraída teve relação direta e indireta com o consumo de cigarros e contaminação por agrotóxicos durante o cultivo de tabaco e o arroz.

Claro que tanto ele quanto outros milhões de brasileiros, muitos dos quais já falecidos por doenças semelhantes, se tivessem acessado a justiça durante a enfermidade processando as empresas, principalmente as companhias de tabaco, por crime de responsabilidade, dificilmente as investidas teriam sucesso, pois uma das alegações atenuantes às empresas seria liberdade de escolha. Ninguém forçou o agricultor cultivar tabaco ou fumar, foi escolha voluntária, argumentariam os responsáveis. Muitos devem se lembrar das décadas de 1970, 1980.. da enormidade de publicidades transmitidas pelas mídias, principalmente emissoras de TV, incitando a população ao consumo de cigarro.

A estratégia era conquistar o jovem tímido, retraído, a partir de um pool de profissionais capacitados, marqueteiros, psicólogos, etc, para bolar meios eficazes que convencessem o frágil cidadão a fumar, pois seria o caminho seguro para alcançar o sucesso individual, profissional.  As próprias marcas de cigarros eram pensadas nessa direção. Hollywood, minister, Arizona. Charme, nomes de cigarros que geralmente eram artistas, jogadores ou certas celebridades de sucesso os contratados para atuarem nas publicidades, não era mesmo?

O fato é que essas companhias lucrarem e vem lucrando rios de dinheiro no comercio de insumos e cigarros.  Nos países que atuam o legado que deixam são os passivos de milhões de doentes e sequelados cujo Estado se coloca, obrigatoriamente, como principal fiador no tratamento, por meio do SUS, a exemplo do Brasil. Quem visita ou já visitou locais como o UNACON (Unidade de Alta Complexidade Oncológica) distribuídos em diversas cidades do estado de Santa Catarina, deve ter notado o turbilhão de pacientes fazendo tratamento contra tumores todos os dias. Contatando alguns pacientes, agricultores, por exemplo, ambos relataram terem tido contato com agrotóxicos por longo tempo em suas vidas.

Nas décadas passadas quando se falava em veneno/pesticida/agrotóxicos, o que vinha em mente era o cultivo de tabaco, atividade predominante no sul do Brasil. Também nessa época não tão comum a prática da capina química com glifosato em áreas urbanas como acontece hoje. A difusão desse agrotóxico, junto com outras dezenas de princípios ativos tóxicos disponíveis para todos os tipos de “pragas”, no campo e áreas urbanas, vem progressivamente colapsando os sistemas de saúde pública no Brasil. O problema é que muitos desses aditivos químicos aplicados no campo foi há muito tempo banidos em outras partes do planeta por serem causadores de cânceres e tantas outras doenças degenerativas.

Se hoje as legislações em vigor impedem a divulgação de publicidades estimulando o consumo de cigarros, o mesmo não ocorre com os agrotóxicos. De modo sutil, os meios de comunicação de massa recebem pagamentos polpudos de companhias multinacionais que comercializam sementes e insumos para o agronegócio brasileiro. Durante a onda do cigarro, décadas passadas, as publicidades tinham por estratégia provocar o desejo em crianças e jovens ao consumo de cigarros, argüindo que fumar era uma questão de “classe” e “sucesso”, porém, omitindo riscos eminentes de ficarem viciados, doentes e virem a falecer.

Atualmente as estratégias das corporações que controlam o comércio de venenos e das sementes modificadas, seguem princípios muito parecidos, porém, mais agressivos até que durante a onda do tabaco. Quem cultiva milho, soja, sorgo, algodão, entre outras variedades de cultivares é estimulado a comprar sementes geneticamente melhoradas, por produzirem mais, com menos trabalho e menor custo de produção. A empresa força o produtor a adquirir um combo, ou seja, sementes e insumos, onde tudo tem de ser consumido naquela safra. Na safra seguinte, o ciclo se repete, e assim sucessivamente por tempo ininterrupto.

Se o cigarro escravizava as mentes dos jovens, porém com chances de se libertarem depois de um longo tratamento, as grandes corporações e o agronegócio adotam hoje mecanismos de escravização tão ou mais perversos que das pretéritas companhias de cigarros. No instante que o agricultor opta pelo modelo agrícola convencional ele está assinando de modo não oficial um termo para se tornar cativo dessas estruturas de poder. Um exemplo é com o milho geneticamente modificado, cujas sementes colhidas não poderão ser cultivadas no ano seguinte pelo fato da fraca germinação. Outro agravante, a cada safra o agricultor tenderá a elevar as doses de agrotóxicos nos cultivos devido a incidência de “novas pragas”, mais e mais resistentes aos venenos.

O agravante disso é o fato de segmentos políticos, membros do congresso nacional e até mesmo governos ditos progressistas estarem compactuando com essa ciranda destrutiva dos biomas e da vida humana. Nos últimos anos houve crescimento assustador de fórmulas de agrotóxicos liberadas para o uso agrícola. Como havia descrito no inicio desse texto, muitos dos princípios ativos autorizados à agricultura já foram banidos na União Europeia e outras regiões do planeta. Até meados de julho de 2023, o presidente Lula já havia liberado o registro de 231 agrotóxicos. O ritmo se equipara a do primeiro mandato do governo Bolsonaro, e superando a soma anual de qualquer mandato petista.   

Prof. Jairo Cesa       

      

 

 

 

 

 

 

 

 

 

            

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