sábado, 5 de outubro de 2019


TRAGÉDIAS EVITÁVEIS ESTÃO SOLAPANDO ECOSSISTEMAS E  COMUNIDADES INTEIRAS NA AMAZÔNIA

É algo inimaginável um presidente da república provocar tantos estragos e retrocessos sociais em tão pouco tempo a frente do cargo. Todas as minhas escritas publicadas nesse blog, expressiva parcela delas, discorrem sobre economia, política, educação, meio ambiente, dos governos que antecederam o atual a partir da abertura política. Em nenhum momento poupei criticas as políticas equivocadas de todos os governos, especialmente no período cuja população teve a experiência de ter no poder pessoas ligadas ao partido dos trabalhadores.
Embora tivesse forte afinidade a essa sigla, tendo até me candidatado à disputa legislativa municipal no final da década de 1990, sem sucesso, já encerrada a ciclo do partido dos trabalhadores em âmbito federal, a decepção foi tamanha que me forçou a uma ruptura definitiva com a sigla. Na área ambiental os fatos comprovam que muitas das decisões tomadas como das inúmeras hidrelétricas construídas na Amazônia legal, a exemplo da hidrelétrica de Belo Monte, os impactos ao ambiente e as comunidades tradicionais do entorno se tornaram quase que irreversíveis.
Mesmo com todas as contrariedades de um partido e governos gerados nas periferias, no imaginário social pairava o sentimento pouco pessimista do futuro, pois jamais os governos se esquivaram dos debates, de encaminhar proposições criativas nas conferências e encontros sobre o clima global. O modo como a ex-presidente Dilma foi execrada do cargo e toda a articulação das forças conservadoras para o sucesso da empreitada acendeu uma luz ameaçadora no fundo do túnel.
Os acontecimentos que se sucediam após o impeachment lançavam uma névoa espessa sobre o futuro da sociedade bem como meio ambiente. A gestão de Temer foi apenas uma demonstração terrível de como um governo, atrelado ao capital, poderia em pouco tempo produzir tanto retrocesso. No entanto, sua presença no cargo seria curta, por exercer um mandato tampão até a eleição seguinte em 2018, quando seria eleito o próximo presidente da república. De repente, sem que ninguém pudesse imaginar, brota das profundezas do inferno a imagem de uma figura na convencional, que adquiriu corpo, convergindo para sim uma legião de seguidores entorpecidos pelo seu discurso ameaçador.  
Numa cultura fortemente influenciada pelo catolicismo, na bíblia tem uma passagem onde afirma que no final dos tempos a humanidade receberá a visita do messias, cuja tarefa é escolher os bom e os juntos para o paraíso eterno. Os resultados das eleições de 2019 me parecem que tal profecia se consolidou, será que finalmente chegamos aos finais dos tempos? Muitas foram as suplicas e incontáveis alertas de que uma possível vitória do candidato Bolsonaro, o Brasil estaria caminhando para o abismo ambiental e social, fatos sem precedentes na história da república brasileira.
O comportamento e os discursos dos quais proferiam nos comícios e entrevistas, deixava explícito seu desejo sórdido de levar o Brasil a um retrocesso inimaginável. No entanto, a população talvez, embrutecida, decepcionada com os desmandos dos governos passados, ou por protestos, ou por acreditar, lançou seu voto a Jair Bolsonaro. Não foram necessários muitos dias no cargo para que seus eleitores não fanáticos se apercebessem da burrada que haviam cometido.  Já era tarde. Independente das críticas e denúncias em todos os quadrantes do território brasileiro, o governo permanecia com sua postura de campanha, prometendo e executando seus planos sórdidos, a maioria sob a forma de decretos, muito semelhante a do regime militar.  
Primeiro a Reforma Trabalhista, Temer, vindo sem seguida a Reforma da Previdência, entre outras tantas medidas anti sociais foram sendo executadas uma a uma. Um dos temas polêmicos do governo Bolsonaro e passivo de críticas de entidades de defesa de direitos humanos, a liberação do porte de armas, foi levada à frente com o aval de parcela significativa da sociedade. Um país no qual vem alcançando níveis recordes de assassinatos, tanto nas áreas urbanas quanto rurais, a liberação do porte de armas é sem dúvida a sentença à limpeza étnica, comparada ao holocausto.
Foram tantas em tão pouco tempo as ações destrutivas e ameaçadoras do atual governo à integridade física e moral da sociedade, suficiente ao ponto de a sociedade ter esquecido o curto/longo período Temer, protagonista de uma avalanche de ações impopulares. O governo Bolsonaro, dia após dia, sua popularidade passou a decrescer diante de seu discurso tosco e comportamento autoritário. É claro que por trás dessa postura esdrúxula, caricata, setores da sociedade como o agronegócio, representantes do segmento evangélico no congresso, ente outros, lhe dão guarida. Sua pauta política de governo os agradava muito, pais lhes favoreciam mediante a liberação quase incondicional de agrotóxicos e a reestruturação da moralidade, dita por ele, judaico cristã.
A indicação de figuras alinhadas ao seu discurso aos principais ministérios dava o tom de como seria o Brasil nas áreas econômicas, educacionais e ambientais. Economia, Educação e Meio ambiente, os gestores foram estrategicamente escolhidos cujos desafios eram a execução de planos dos quais deixariam cicatrizes por gerações. Isso mesmo, gerações.     Na economia, coordenada pelo “super ministro Guedes”, o plano principal era a aprovação da reforma da previdência, da qual como foi a reforma trabalhista, restabeleceria a escravatura, tendo a população que trabalhar até a morte.
Na educação, tanto o primeiro ministro escolhido, demitido por demonstrar incapacidade intelectual, o segundo, ninguém imaginava que pudesse ser pior que o primeiro e que causasse tantos estragos na educação em tão pouco tempo no cargo. Suas atitudes na pasta deixaram nítidas mostras que é muito mais cômodo eleger governos sem qualquer capacidade para o cargo, para manter a população ignorante e submissa. O ataque aos professores e principalmente as universidades públicas com cortes expressivos de recursos foi o primeiro cartão de visita, mostrando seu verdadeiro objetivo no ministério da educação. Se as condições estruturais das universidades públicas e dos institutos federais já eram precárias sem os cortes, imaginamos agora com os “contingenciamentos”.   
Desde a primeira aparição na TV, ainda como pré candidato à presidência, Bolsonaro já lançava pinceladas de que a mira de seu governo estaria apontada ao segmento ambiental. Isso se tornou realidade no instante que afirmou que fundiria os ministérios da agricultura e o meio ambiente. A proposta poderia ser comparada a fábula onde as galinhas seriam cuidadas das raposas. Pressões de todos os lados fizeram que o mudasse de ideia, mantendo os ministérios separados. Porém, tal atitude não foi suficiente para assegurar que os respectivos postos pudessem proporcionar cenários tão terríveis à preservação das florestas.
A indicação de dois ministros, uma para o ministério da agricultura, ligada ao agronegócio, e outro do meio ambiente, tendo sido condenado por crime de responsabilidade quando atuava no governo do estado de São Paulo, se transformou em figuras conhecidas nos noticiários diários por suas peripécias a frente das pastas. Jamais no passado um presidente havia liberado em tão pouco tempo tantas marcas de agrotóxico, em comparação a Bolsonaro.
O agravante é que muitos dos princípios ativos presentes nesses pesticidas já haviam sido banidos há anos tanto na comunidade européia quanto nos Estados Unidos. Infelizmente a pressão social, de ambientalistas e comunidades científicas nacionais e internacionais não foi suficiente para conter a fúria gananciosa e genocida do agronegócio. Como já era de esperar, embora os dois ministérios, agricultura e meio ambiente, estivessem atuando em separados, suas ações se convergiam, pois suas políticas estavam direcionadas em promover um dos maiores desmontes e retrocessos na área ambiental, de forte repercussão global.
A perseguição e criminalização de órgãos governamentais ambientais, como o IBAMA, ICMbio, ativistas ambientais, entre outros, se configurou como estratégica de limpar o caminho qualquer obstáculo àquilo que viriam a ser meses depois uma das maiores tragédias ambientais, os incêndios florestais no bioma da Amazônia e de outros espalhados pelo Brasil. Se havia agora no poder um presidente com um discurso incitando à violência, a homofobia, a grilagem, a invasão de terras indígenas e de demais grupos tradicionais, psicologicamente, o sentimento que perpassaria sobre o bioma do serrado e da Amazônia, por exemplo, era de que tudo agora seria permitido, pois os fins justificariam os meios.
As queimadas na Amazônia se transformaram num dos principais acontecimentos de repercussão planetária, fato que mobilizou autoridades de dezenas de país pressionando o governo brasileiro para que tomasse providências enérgicas ao combate dos incêndios. Como já vem sendo praxe às queimadas na Amazônia nos últimos tempos, muitas das quais criminosas com vista a expansão da fronteira agrícola, o que chamou a atenção dessa vez foi o elevado número, superando todas as estatísticas históricas conhecidas. Era visível aos olhos de todos que o fogo sobre as florestas da região tinha mão humana.
Denúncias confirmaram que fazendeiros, pecuaristas, entre outros, articularam pelas redes sociais a campanha macabra o dia do fogo. Florestas inteiras foram sendo derrubadas e incendiadas para dar lugar à pecuária e a agricultura. Nos encontros de cúpula sobre o clima o Brasil sempre compartilhou as decisões da COP se propondo em adotar políticas para a redução das emissões de CO2, resultantes da queima de florestas.  
A floresta amazônica concentra parcela significativa de carbono retido nas florestas. Uma das propostas acatadas pelo Brasil na última COP, em Paris, foi compromisso de nos próximos 20 ou trinta anos combater os desmatamentos ilegais, ou seja, zero desmatamento. A chegada de Bolsonaro ao Poder colocou uma pá de cal em todos os avanços obtidos pelo Brasil sobre as florestas e o clima planetário.
Não podemos nos iludir que o problema na Amazônia se limita aos incêndios e suas conseqüências para o planeta. A região já vem sendo assolada por outros tantos problemas ambientais de proporções avassaladoras à região. Muitos devem não lembrar mais das abomináveis barragens construídas sobre o leio dos principais rios da bacia amazônica, entre eles a mortal hidrelétrica de Belo Monte.
Na época, pesquisadores e ambientalistas alertavam os governos Lula e Dilma que a execução desse bilionário projeto, bem como de outras barragens similares na região provocaria impactos terríveis aos frágeis ecossistemas e sociedades tradicionais. Os alertas não foram suficientes para impedir sua execução. Quase dez anos depois do início do projeto, nesse ou no próximo ano, o governo brasileiro irá inaugurar a última turbina da hidrelétrica que entrará em funcionamento. É incrível como no Brasil algumas tragédias se sobrepõe a outras como num passe de mágica. Porém, pouco tempo é suficiente para cair no esquecimento.
A hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, foi uma das maiores manobras de corrupção envolvendo políticos, empreiteiras na execução da obra. Desde o seu início críticas eram lançadas alertando sobra a inviabilidade econômica da obra, pelo fato do rio Xingu, nas estações de estiagem, não fornecer água suficiente para movimentar as turbinas. Um dos acordos assinados era para que o fluxo de vazão da água da barragem seria monitorado e controlado para o não comprometimento das comunidades situadas a montante do rio cuja sobrevivência dependia do fluxo normal da água do Xingu.
Reportagens dão conta que comunidades inteiras como os povos Juruna estão vivendo em condições quase subumanas em decorrência da redução drástica de pescado, uma de suas principais fontes de subsistência. Alegam que os administradores da barragem não estão cumprindo o que foi pré-estabelecido. E não para por aí. A Belo Monte também é protagonista de outra tragédia que está matando de fome e pela violência centenas, milhares de pessoas todos os anos.
Tais acontecimentos trágicos fazem referência à cidade de Altamira, no Pará, que a partir da hidrelétrica de Belo Monte viu crescer sua população em números alarmantes. A maioria da população ou foram expulsas de suas terras pressionadas pela barragem ou migraram de outras regiões atraídas pela promessa de emprego. A cidade de Altamira é atualmente considerada uma das mais violentas do Brasil. Na região da Amazônia já é considerada a mais violenta.
Há poucos dias os/as brasileiros/as ficaram estáticos frente a televisão acompanhando os horrores em Altamira, quando 62 pessoas foram brutalmente assassinadas por gangs rivais no interior do principal presídio do município. A tragédia em Altamira só perdeu para o massacre do Carandiru, RJ, onde morreram mais de duas centenas de pessoas assassinadas pela polícia.
Todo o problema na região tem relação direta e indireta com as políticas equivocadas dos governos anteriores, alucinados pelo “vírus” do nefasto do desenvolvimentismo, que tão mal proporcionou à sociedade, a exemplo do regime militar. Altamira é um reflexo desse equivoco político. O que é gritante é saber que ninguém mais ousa trazer para o debate Belo Monte, como de outras barragens construídas equivocadamente na região. Nem o atual governo fez ou faz qualquer menção ao fato, pois os projetos muito lhe interessam.
Na realidade esses projetos se encaixam ao seu programa neo-desenvolvimentista, porém mais sórdido ainda que dos governos anteriores. A expansão da fronteira agrícola não é o principal problema enfrentado pelas populações indígenas na Amazônia. O apoio incondicional à prática da mineração na Amazônia pode acelerar a tragédia ambiental e humana na mesma proporção das barragens. Populações inteiras, indígenas, ribeirinhas, que dependia diretamente do rio Xingu para sua sobrevivência, poderão sucumbir.
O restabelecimento da mineração em Serra Pelada, no estado do Pará, poderá resultar no crescimento desordenado do fluxo migratório para a região, com impactos ambientais e sociais dramáticos a exemplo do município de Altamira. Do mesmo modo que a Belo Monte é responsabilizada por um etnocídio em toda a região abrangida pela hidrelétrica, a mineração na serra pelada poderá ser responsabilizada no futuro por outro genocídio, de proporção gigantesca.
Antes da instalação da hidrelétrica Belo Monte, a população de Altamira beirava os 80 mil habitantes. Mesmo com as dificuldades de uma região pouco assistida pelo Estado, a população encontra saídas para sobreviver. Em 2019, a população da cidade já alcançava os 111 mil habitantes. Com pouca infraestrutura e emprego, a violência e os homicídios tornaram-se freqüentes. Em termos comparativos, o município do Rio de Janeiro as cifras de homicídio chegam a 35,6 mortes por cem mil. Altamira, o número de homicídios por cem mil habitantes atingiu os assustadores 133,7 mortes. É bom frisar que a população na qual inchou o município de Altamira são os retirantes das áreas ocupadas pela represa.
É importante também frisar que jamais o governo federal, durante a gestão Rousseff, jamais deveria ter permitido a funcionamento da hidrelétrica de Belo Monte sem que os responsáveis da obra tivessem comprido com as ações mitigatórias. A construção de um complexo penitenciário em Vitória do Xingu, a quarenta e oito quilômetros de Altamira, era uma dessas obrigações da empresa. Não cumpriu.
Para a execução desse elefante Branco no coração da Amazônia somente foi possível graças a um bem sucedido plano macabro de suspensão da lei para a concretização da obra. O custo da Belo Monte solapou dos cofres públicos cerca de quarenta bilhões de reais. A corrupção e um plano estratégico para silenciar indígenas fizeram parte desse plano.
Prof. Jairo Cezar

https://brasil.elpais.com/brasil/2014/12/01/opinion/1417437633_930086.html Belo Monte: a anatomia de um etnocídio.

https://brasil.elpais.com/brasil/2015/07/06/opinion/1436195768_857181.html  Belo Monte, empreiteiras e espelhinhos.

https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/14/opinion/1565799016_403909.html As crianças de Altamira - O massacre dos inocentes nos denuncia na mais violenta cidade amazônica.



https://brasil.elpais.com/brasil/2019/09/12/opinion/1568300730_780955.html?fbclid=IwAR1qOfaLLGNwS1Euw-QS2sAL-G1qDa-bn0rvYlp98_aQK7w3rf6WGsu6FNw “A notícia é esta: o Xingu vai morrer”

                 

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