segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

AS DEMANDAS DO PROJETO ORLA E OS DESAFIOS PARA SUA EXECUÇÃO EM TODA FAIXA COSTEIRA DO MUNICÍPIO DE ARARANGUÁ



Quanto ao projeto orla, embora inúmeros dispositivos contidos no documento tenham sido incluído na lei do plano diretor que trata sobre Zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, aprovado pela câmara de vereadores no dia 14 de dezembro de 2016, inexpressiva são as pessoas que conhecem o documento integral que cotem sete volumes: apresentação; diagnóstico socioambiental; cenário da orla; estratégias de gestão; instrumentos e normativa; cronograma e considerações e mapa temáticos.
Seria quase que impossível detalhar o que consta em cada volume. No entanto é cabível traçar considerações importantes mostrando o que poderá acontecer especificamente no balneário Morro dos Conventos se as mais de 80 proposições discutidas e encaminhadas nas reuniões e oficinas forem realmente concretizadas. Devido a sua peculiaridade ambiental, dentre os temas polêmicos discutidos a questão do saneamento básico, coleta e tratamento de esgoto e uso e ocupação do solo sem dúvida foram os que nortearam os debates.
A partir da década de 1950 o Morro dos Conventos começou a atrair turistas e especialmente veranistas que iniciaram a ocupação da sua faixa costeira. Na época, talvez aproveitando a fragilidade das legislações ambientais, empresários do setor hoteleiro, entre outros, quadricularam todo trecho que começava do loteamento Paiquerê até a foz do rio Araranguá. Observando o mapa elaborado naquele momento, causa espanto como o legislativo e o executivo municipal teve ousadia de aprovar tamanho descalabro.
As décadas se passaram e o Morro, contemplado pela geologia e geografia, seu complexo e frágil solo continuou cedendo lugar a novas residências e edifícios contendo até quatro pavimentos. Novas legislações mais restritivas e disciplinadoras à ocupação desses espaços foram sancionadas em âmbito federal e estadual, porém muitas delas que obrigam o poder público a implantação de políticas de destinação do lixo e o tratamento de esgoto ainda estão muito longe de se tornar realidade no balneário.



O fato é que na própria sede do município mesmo tendo as duas ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) já inauguradas no final de 2016, não se sabe com precisão quando entrarão em funcionamento. A ETE mais importante, construída no bairro vila são Jose depois de inúmeros entraves, não possui ainda nem mesmo rede de energia elétrica, cujos testes dos equipamentos e a manutenção dos motores e lâmpadas acesas foram graças à gentileza de um produtor de arroz que cedeu um dos seus postes para conectar na rede da estação.[1]       
Os órgãos ambientais e o próprio poder público, cujas funções seriam restringir ao máximo e fiscalizar possíveis ocupações irregulares em App, fazem vistas grossas chegando ao extremo de conceder licenças ambientais para novos empreendimentos com status duvidosos de proteção ambiental. Exemplos são os que não faltam no balneário, basta subir até aos vários mirantes do balneário e observar quantas infrações cometidas. E o descalabro ocorreu até mesmo durante os encontros do projeto Orla, quando vários empreendimentos e terraplanagens se sucederam e tendo sido passiveis de denúncias por parte de entidades ambientais.
A tendência, isso se não houver uma rígida fiscalização mesmo com a homologação do projeto orla, é repetir no Morro dos Conventos, parte baixa, o que se sucedeu no loteamento paiquerê, que foi embargado pelo poder judiciário por não cumprir dispositivos ambientais pré acordados. Um deles é a insuficiência do tratamento de efluentes domésticos por fossa séptica e sumidouro indicado no licenciamento feito pela FATMA quando da homologação do loteamento. O fato é que toda a área de faixa costeira onde estão os loteamentos Paiquerê e Morro dos Conventos, o lençol freático tem baixa profundidade, podendo os efluentes domésticos contaminar todo o ecossistema do entorno e a própria água do oceano.


A análise de balneabilidade realizada pela FATMA em 2015, que detectou alto índice de contaminantes na água do oceano, deve servir de alerta quanto aos novos licenciamentos sem considerar as diretrizes contidas no documento do projeto orla. Delimitar áreas de APP e aquelas possíveis de ocupação turística e residenciais transformou os encontros do orla em momentos de extrema tensão. A participação foi muito maior de representantes de grupos econômicos interessados em limitar ao máximo as áreas protegidas. Algo que pode servir de atenuante a forte pressão do capital no Morro dos Conventos é a unidade de conservação que foi homologada via decreto no final de 2015.
O balneário, parte baixa, muitas das residências foram construídas há muitos anos e cujos sistemas de esgotamento estão deficitários. Temos exemplos parecidos na parte superior do bairro, de um empreendimento hoteleiro, cuja fossa séptica foi construída há cerca de trinta anos e os resíduos da lavanderia estão sendo lançados na fossa pluvial, que por sua vez escoam para um lago extinto no bairro. A ocupação com construções também foi outro item muito discutido nos encontros. Pelas peculiaridades da geografia do local, residências ou prédios com verticalização acentuada, ou seja, acima de dois pavimentos, pode comprometer toda dinâmica do complexo ecossistema. Por isso a restrição para no máximo dois compartimentos a altura das futuras residências.
A constituição de dunas móveis e fixas nas áreas do entorno da paleofalesia tem relação direta com a dinâmica dos ventos. A proliferação de residências ou edifícios com quatro pavimentos, bem como a proliferação de espécies exóticas da flora, pinos SSP e casuarinas, estão paulatinamente produzindo mudanças na direção dos ventos que moldam o desenho das dunas.[2]
Conforme decisão do MPF e resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente, que impede plantação e comercialização de casuarinas, a FAMA processou o corte de tais espécies e de pinos em trecho de dunas da orla do Morro dos Conventos. No entanto, a resolução estabelece que feita a supressão o órgão ambiental deveria repovoar a área com espécies nativas, que não o fez. O agravante é que a FAMA não executou o trabalho na sua totalidade como havia prometido, conforme reportagem publicada pela revista W3 em julho de 2016.[3] 
A questão turística nos balneários que congregam o município de Araranguá é outro gargalo que vem impedindo a região de fortalecer o turismo como uma das opções para o desenvolvimento local e do extremo sul de Santa Catarina. Desde a década de 1950 com a construção do campo de aviação e do Hotel Morro dos Conventos deu início os primeiros passos de um ousado projeto que por décadas inseriu o balneário e o município no cenário regional, nacional e internacional como uma das rotas mais procuradas e apreciadas.


A falta de uma cultura empreendedora de trabalho coletivo, somada a incompetência administrativa e política, fez com que o balneário e o próprio município, num todo, regredissem nesse seguimento nas últimas décadas em níveis vergonhosos. O declínio do Camping Morro dos Conventos premiado na década de 1980 com o título de um dos mais estruturados da América latina está cedendo lugar a um empreendimento imobiliário duvidoso em termos econômicos e ambientais. Além do município não possuir uma secretaria vinculada ao turismo, a fragilidade desse seguimento salta aos olhos da população do bairro e dos veranistas e turistas que freqüentam sazonalmente o balneário.
Não há o mínimo de infraestrutura compatível às necessidades sociais e ambientais e que foram discutidas no Orla, como posto de atendimento ao turista; banheiros públicos; equipamentos de lazer; sinalização compatível nas vias públicas e orla; lixeiras distribuídas pelas principais ruas do bairro; placas informativas e guias para transitar sobre as trilhas, as que possuem erros de ortografia;  estudo e estruturação dos sítios arqueológicos para visitação; sistema de transporte coletivo para levar as pessoas à barra e outros pontos turísticos, etc.            
O projeto orla e os três decretos assinados no final de 2015, que criaram a MONA (Monumento Natural Morro dos Conventos; APA (Morro Agudo) e a RESEX (Ilhas) alimentaram as esperanças de um futuro mais promissor no setor turístico para o município de Araranguá. Mais uma vez, toda essa expectativa de tentativa de despertar a vocação do município para o turismo, vai depender da vontade dos novos integrantes do legislativo, executivo e da própria Fundação Ambiental do municipal de Araranguá. Ambas como entidades políticas têm por tarefas mobilizar todas as forças vivas da sociedade organizada. O trabalho de educação ambiental e patrimonial deverá ser uma das primeiras iniciativas do poder público e da FAMA, entidade ambiental municipal criada em 2007 com a lei 2.608.
Dos 25 artigos que constituem a lei, o art. 4 trata sobre as 27 finalidades, que aplicadas promoveriam uma extraordinária revolução no seguimento ambiental e patrimonial no município.  Um exemplo é o inciso II sobre as finalidades onde estabelece a implantação, fiscalização e administração de unidades de conservação e áreas ambientais e arqueológicas protegidas do Município, em consonância com o que dispõe a legislação vigente, visando à proteção de mananciais, ecossistemas naturais, flora e fauna, recursos genéticos, e outros bens de interesse ambiental e arqueológico.
Promover o desenvolvimento econômico com o mínimo possível de impacto ambiental em todo o trecho da faixa costeira nos limites do município de Araranguá deverá ser compromisso de todos. As três unidades, criadas em 2016, (MONA, APA E RESEX) junto com o documento do projeto Orla, atuarão como mediadores desse processo. Portanto, o empenho agora é fazer cumprir as etapas sistematizadas a partir da elaboração de um plano de manejo consistente e possível de ser realizado.
Prof. Jairo Cezar      

              



[2] http://morrodosconventos-jairo.blogspot.com.br/2014_02_01_archive.html
[3] https://www.revistaw3.com.br/ararangua/2016/07/04/fama-realiza-corte-e-poda-de-casuarinas-em-morro-dos-conventos.html

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