O
RETRATO DESOLADOR DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL
Foto - acervo Jairo
Na
coordenação do projeto escola sustentável junto com a colega de trabalho da
EEBA - Araranguá, entre as várias temáticas abordadas nos quase dois anos de atividades,
uma das demandas elencadas para 2018 foi discutir o saneamento básico como um dos vetores à
saúde da população. Sabendo que legislação em vigor estabelece que todos os
municípios brasileiros tenham seu plano de saneamento já concluído, é possível
contar nos dedos aqueles que coletam e tratam 100% dos seus efluentes domésticos
e industriais.
O
cenário vislumbrado no horizonte não é nada animador. Os gestores públicos
municipais justificam o atraso no cumprimento dos planos devido a crise
econômica, pois o governo federal alega falta de recursos para o financiamento
de obras de infraestrutura. Uma rápida radiografia do saneamento básico no
Brasil deixa explícito um cenário parecido ao da Europa do século XII, XIII,
idade média, quando não havia cuidado algum cuidado com a água e esgoto.
Em
se tratando de saneamento básico, entre as cinco regiões brasileiras não há
grandes contrastes quando o assunto é sistemas rede coletora de efluentes
domésticos e industriais. No total, 55% do esgoto produzido no Brasil são jogados
na natureza. São 35 milhões de brasileiros sem água tratada em suas casas.
Regiões como norte e nordeste, lideram o ranque nacional de desassistidos
nesses seguimentos. Apenas 26,8% dos moradores dos nove estados do nordeste são
contemplados com rede de esgoto. Dos 22 entre os 27 estados que compõe o
território brasileiro, menos da metade do esgoto produzido por ambos passa por
tratamento.
O
estado de Pernambuco a situação é quase catastrófica, sete em cada 10 moradores
não tem saneamento básico. O tratamento dos efluentes atinge somente 30% da
população do estado. Na região norte, os números mostrados fazem qualquer um acreditar
que são dados falsos, mal intencionados, de agências pesquisadoras. O pior é
que os números são realmente verdadeiros. A região que concentra o maior
percentual de água doce do país, quiçá do planeta, apenas 55,37% dos habitantes
possui água encanada. No quesito tratamento dos efluentes, o índice é
vergonhoso, pouco supera os 10%.
Isso
significa que parte desse resíduo não coletado é lançado nos rios e igarapés, responsável
por inúmeras enfermidades. O estado do Amapá comemorou a façanha de ter elevado
sua cobertura de esgoto tratado de 3,8 para 5,9%. A capital, Macapá, somente 40%
dos habitantes tem rede de água tratada. Agora, o município que lidera a lista
dos piores em saneamento básico está no estado do Pará, e se chama Ananindeua,
com 0,75% das casas com rede de esgoto, já com água tratada são 29,98% da
população. A situação calamitosa desse município paraense é uma mostra de um
problema que atinge todo aquele estado, especialmente a capital, Pará, onde
todos os bairros não são atendidos por saneamento básico. O percentual de residências atendidas com rede
de esgoto em Belém é de 12%.
O
Centro Oeste e Sudeste parcela significativa da população também padecem de
saneamento básico. É 89,7% o percentual
de pessoas nos quatro estados da região centro oeste que recebem em suas casas
água tratada. Contudo, o problema começa quando a metade da população não tem
coleta de esgoto. Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, é um dos únicos
estados da região que coleta 77,88% do esgoto. O contraste entre água tratada e
rede de coleta de esgoto é observado em Cuiabá – Mato Grosso.
Ao
mesmo tempo em que 98,13% população da capital tem acesso a água, 48,61% não tem
rede de esgoto. Apenas um terço, dos 48,61%, é tratado. O que gera mais
apreensão disso tudo é que um dos principais rios do estado, o rio Cuiabá, é
formador do pantanal. Todos os dias o rio despeja nesse que é um dos mais
complexos ecossistemas do planeta, toneladas de efluentes poluidores. O estado
de Goiás fica atrás do seu vizinho Mato Grosso em tratamento de água, são
87,99% da população atendida, porém fica pouquinho acima em rede de esgoto,
50%.
Quando
imaginávamos que a região sudeste por ser a “locomotiva do Brasil” já atendesse
100% da população com rede de água, veio a surpresa, 8,8% da população ainda é
desassistida desse serviço. Isso também ocorre com coleta de esgoto, 78,6% da
população é beneficiada. O Rio de Janeiro que durante algum tempo vem dominando
os noticiários televisivos com reportagens nada agradáveis, também é um estado desassistido
em saneamento básico. De cada 10 cidadãos fluminenses, quatro não recebem água tratada
em suas residências.
O
caso mais assustador no estado é o município de Duque de Caxias, na baixada
fluminense, que ser comparado ao município Ananindeua, no Pará. Numa lista de 100 municípios, Duque de Caxias
fica em 92 em saneamento básico. O lixo e o esgoto é tanto, cujo rio Calombé,
que corta a cidade, chegou a pegar fogo devido a grande quantidade de resíduos
químicos lançados no seu leito.
A
região sul do Brasil, que sempre é vangloriada pelos gestores públicos e pela
mídia corporativa como exemplo em qualidade de vida, também amarga um triste
cenário no quesito saneamento básico. Embora a cobertura com água tratada
atenda 90% dos três estados, no tratamento de esgoto o percentual baixa
abruptamente para 42,5%. O estado do Paraná lidera no tratamento de esgoto,
chegando a 67,9% dos moradores. Já com água tratada, o percentual é de 93,33%. É
possível que quase a totalidade do esgoto coletado e tratado no estado do
Paraná se concentre nas principais cidades, a exemplo de Curitiba. Tal certeza
é fundamentada nos relatórios divulgados afirmando que 91 municípios do estado
apresentam índices de saneamento abaixo da média nacional.
O
estado de Santa Catarina continua envergonhando os seus cidadãos, quando
números mostram que apenas 20,9% de todo o esgoto é coletado é tratado. Alguns
municípios catarinenses apresentam cenários muito parecidos com os do norte e
nordeste. O exemplo é a Palhoça, na grande Florianópolis, dos 170 mil
habitantes, 20 mil tem rede de esgoto. Florianópolis, a capital dos
catarinenses e a preferida das celebridades, têm 60,25% do esgoto coletado e
tratado. O restante é despejado em córregos que desembocam nas várias baias e
mangues que circundam a cidade.
A região do extremo sul de santa Catarina o
cenário é mais desolador ainda. Incluindo a região da AMREC e AMESC, ou seja, 16
municípios com 600 mil habitantes que estão inseridos na Bacia do Rio
Araranguá, na época da aprovação do plano de recursos hídricos, em 2015, a
quantidade de esgoto coletado e tratado era de 4%. Hoje, inclusão Araranguá e a
ampliação da rede em Criciúma o percentual pode ter se elevado para 10 ou 15%.
Quando
afirmamos que a quantidade de rede de tratamento de esgoto construída na região
da bacia hidrográfica de Araranguá é de 10 a 15%, não significa que tal
percentual esteja sendo coletado na sua totalidade. Para entender melhor tudo
isso vamos usar como exemplo o município de Araranguá. Na visita realizada
pelos/as estudantes da EEBA a ETE I, próxima a câmara de vereadores, a técnica
informou que as duas estações jutas têm capacidade para coletar e tratar esgoto
de 30.600 habitantes, quase a metade da população, que é de quase 68 mil
habitantes. O problema, segundo a monitora, é que hoje, depois de quase um ano
de ter sido inaugurado do sistema, são coletados e tratado menos de 4% dos
efluentes.
A
ETE I, na qual tem capacidade para tratar 37 mil metros por segundo de
efluentes domésticos e industriais, processa apenas pouco mais de 3 mil litros,
que é 10% da capacidade da estação. É preciso sensibilizar a população
araranguaense da necessidade de se ligar a rede de tratamento, ressaltou a
monitora. Sem a conexão das residências e empresas nas tubulações distribuídas por
cinco bairros e o centro, o complexo sistema, além de trabalhar na sua
capacidade mínima, os efluentes continuarão sendo lançados na natureza. Para
comprovar tal realidade, basta dar uma olhada na “água” que escorre pelo córrego
que atravessa a Avenida 15 de novembro, nas proximidades do ginásio de esportes
“bolha”. É desanimador.
É
possível, portanto, que o município de Araranguá também esteja incluído no rol
dos demais municípios espalhados pelo Brasil que gastaram cerca de 100 milhões
de reais do SUS em 2017 com tratamento de doenças oriundas da falta de
saneamento básico, como diarréias, doenças de pele, dengue, entre outras. Foram
263,4 mil pessoas internadas, segundo o Ministério da Saúde naquele ano. O
mesmo órgão afirma que o resultado de 2017 foi melhor que o ano anterior, 2016,
quando foram atendidos 350,4 mil pelo SUS, com gasto de 129 milhões de reais.
Segundo
a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada $1 investido em saneamento básico,
seriam economizados $ 4,3 em saúde no mundo. Conforme estabelecido no plano
nacional de saneamento básico, a meta do Brasil é universalizar esses serviços
até 2033. São hoje, cerca de 1.600 dos 5.570 municípios brasileiros que possuem
pelo menos um sistema de coleta e tratamento de esgoto. Se o sistema fosse hoje
universalizado, o governo estaria economizando cerca de R$ 1,4 bilhão em
saúde.
Ao
longo dos 15 anos que restam para expirar o prazo estipulado para a
universalização do saneamento básico, municípios, estados e o governo federal, juntos
necessitariam desembolsar aproximadamente R$ 30 bilhões por ano. Se até o
momento, pouco mais de 20% dos municípios já cumpriram parcialmente com o
programa, é acreditar em Papai Noel achar que em 15 anos o restante dos
municípios, 3.970, cumpram as metas.
Por
que todo esse pessimismo? Em 2015 o governo brasileiro investiu R$ 13.2 bilhões
de reais com saneamento. No ano seguinte, justificando contenção de despesas,
os investimentos encolheram 1.7 bilhão. Com a crise que se segue e o aumento da
dívida pública, somada a corrupção, é de se prever que os anos seguintes, 2017
e 2018, o valores devem ter sido reduzido ainda mais.
Prof.
Jairo Cezar
Nenhum comentário:
Postar um comentário