domingo, 30 de agosto de 2020

 

A ACELERADA DEVASTAÇÃO DO QUE AINDA RESTA DO  BIOMA DA MATA ATLÂNTICA 

https://www.sosma.org.br/wp-content/uploads/2020/06/2020_Atlas_Mata_Atlantica_2018-2019_relatorio_tecnico_final-1.pdf


Nos últimos meses a mídia nacional e internacional deu expressiva cobertura exclusiva aos desmatamentos e as queimadas na Amazônia legal e ao centro oeste brasileiro, com destaque aos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Os impactos desses episódios, na sua maioria criminosos, são irreversíveis à saúde dos biomas e ao clima no planeta. Não há dúvida que esses ecossistemas são importantes e que deveriam receber toda a atenção das autoridades, que não ocorrem.

No entanto, não podemos esquecer que em termos de biodiversidade, o bioma da mata atlântica guarda um tesouro singular e diverso, não encontrado em nenhuma parte do planeta. O fato é que esse bioma se estende do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. Ao todo são 17 estados, quatorze deles costeiros. Mais de 70% da população vive sobre esse ecossistema, totalizando 145 milhões de pessoas, que estão distribuídas em 3.429 municípios, de um total de 5.570.

Enquanto o processo de devastação da floresta amazônica, sendo sua intensificação mais evidenciada nas últimas décadas, a mata atlântica, a destruição vem acontecendo há mais de cinco séculos, desde a ocupação portuguesa.  A extração da madeira do pau Brasil, a cultura da cana, do café, entre outras atividades, foram atividades que resultaram na perda de parcela significativa de cobertura florestal desse ecossistema.

São dezesseis capitais cujas sedes administrativas ficam próximas a orla oceânica. Esse, portanto, foi um dos fatores para o vertiginoso processo de migração da população do interior para esses centros.  A falta de planos diretores sustentáveis para atender tal demanda populacional, somada as políticas de cunho eleitoreiras, colocaram abaixo milhões de hectares de mata para dar lugar a projetos imobiliários, além de ocupações irregulares de morros e áreas inundáveis.  

Hoje em dia restam pouco mais de 12% de toda a cobertura da mata atlântica. Todos os anos são apresentados diagnósticos de ganhos e perdas dessa cobertura dessa cobertura vegetal. O trabalho desenvolvido por alguns gestores públicos, bem como a intensa fiscalização dos órgãos ambientais municipais e estaduais contribuíram para reduzir significativamente o desmatamento em algumas regiões do Brasil em níveis satisfatórios. Porém, isso ainda é uma exceção.

Quase todos os dezessete estados que congregam a mata atlântica continuam apresentando perdas desse bioma. Porém, estados como Minas Gerais, Paraná, Bahia, Piauí, estão aparecendo no topo do ranque dos que mais sofreram desmatamentos. O agronegócio e a pressão imobiliária são considerados um dos principais vetores do desflorestamento. O que chamou a atenção no último relatório apresentado em maio foram os dez municípios com maiores perdas de cobertura vegetal. Ambos integram três estados, Piauí, Minas Gerais e Paraná.

O município que apareceu entre os que mais desmataram foi Manoel Emídio, do estado do Piauí, com 879 hectares de desmatamento. Na segunda posição, mais um município piauiense se destacou.  Um dos fatores responsáveis pelo crescimento da supressão da mata atlântica no estado do Piauí é o agronegócio da soja e da pecuária, onde florestas são devastadas, a exemplo do bioma do cerrado. A tendência é a intensificação dos ataques sobre esses biomas, motivado pela elevação dos preços de commodities no mercado internacional. 

O estado da Bahia também apareceu no relatório com elevados índices de desmatamentos. O município que aparece na sexta posição em nível de desmatamento foi Porto Seguro. Foram 240 hectares de mata suprimida. Quando se ouve falar dessa cidade, o que vem primeiro a mente o momento da chegada da esquadra portuguesa na costa sul da Bahia em 1500. Todos devem lembrar também da madeira pau Brasil, espécie em abundância na região, que foi completamente erradicada na época da ocupação portuguesa e transportada para a Europa.

Porto Seguro – 08/2006 (google Earth)


Porto Seguro – 04/2020 (Google Earth)

Ainda hoje, permanece em ritmo acelerado a supressão do que resta do remanescente desse bioma, principalmente na área do parque nacional de Monte Pascoal.  No estado de Minas Gerais, que também está entre os que mais desmataram, uma das principais causas é a produção de carvão vegetal usado nas usinas siderúrgicas para a produção do ferro-gusa. A indústria de papel celulose exerce importante pressão áreas de florestas nativas, dando lugar ao cultivo de espécies exóticas como eucaliptos.

Parque Nacional Monte Pascoal/ BA – 12/1985 (Google Earth)

Parque Nacional Monte Pascoal/BA – 12/2012 (Google Earth)

 

O pouco do que resta das araucárias também não ficaram isentas dos criminosos ambientais. Embora haja legislação específica que assegura a preservação dessa espécie em extinção, o estado do Paraná, continua em escala crescente o corte criminoso dessa espécie nativa. O setor madeireiro tem sido identificado como um dos principais responsáveis pela extração ilegal da araucária. Se os relatórios sobre o desmatamento da mata atlântica confirmam que houve mais perda de espécies desse bioma em um semestre que em todo o período de 2019, isso se deve ao modo negligente como o governo federal vem atuando sobre o meio ambiente.

Nova Laranjeiras/PR – 05/08/2010 (Google Earth)

Nova Laranjeiras/PR – 04/08/2019 (Google Earth)

Deixar passar a boiada, frase dita pelo ministro do meio ambiente, no começo do ano, em reunião com o presidente, é uma prova que poderia imputá-lo como responsável pelos desmatamentos e as queimadas que devastam importantes biomas brasileiros. Os ataques desferidos a lei da mata atlântica, na tentativa criminosa de reduzir em 10% a abrangência desse bioma, também serviu como fator motivador para o aumento dos desmatamentos.

Santa Catarina, embora no relatório 2018-2019 não há nenhum município entre os dez que mais desmataram a mata atlântica, o percentual de perda de espécies da flora continua significativo. Os números mostram uma redução de 22% em relação ao biênio anterior, cuja área devastada foi de 910 hectares. Foram 710 hectares o tamanho da devastação no último biênio.

Resultados quantitativos do desmatamento em SC

 

 Analisando a tabela acima que mostra os desmatamentos da mata atlântica no estado entre os anos de 2010 a 2018 mantiveram um patamar de estabilidade, ora aumentando, ora diminuindo de modo sensível. No entanto, diante do baixo percentual desse bioma no estado, qualquer fração perdida, resulta em danos significativos ao ambiente no seu todo. O que deve ser considerado nessa tabela, principalmente o levantamento feito a partir de 2018 que as áreas captadas pelo satélite reduzem de três para um hectare. Sendo assim, pequenas frações de desmatamentos são observadas pelos órgãos fiscalizadores.

Ainda assim, o monitoramento não é totalmente seguro. Áreas menores que um hectare não aparece nas imagens. É muito comum hoje em dia o proprietário de um terreno fazer pequenas supressões de mata nativa, visando elevar sua área cultivável. O PRA, um pequeno avanço obtido no Código Florestal poderá auxiliar num controle mais efetivo dos desmatamentos. A perda, mesmo discreta dessa cobertura está refletindo diretamente no micro clima de algumas regiões do estado, que registram redução significativa dos fluxos pluviométricos.  

No último relatório apresentado, a região que congrega a AMESC, formada por quinze municípios, os índices de desmatamentos manteve-se num patamar de sensível crescimento, comparado com o biênio 2015-2016. De todos os municípios, seis tiveram o aumento de área florestada, enquanto nove perderam parcela da cobertura florestada. Os municípios com percentuais negativos foram aqueles que estão sobre a orla marítima, como Balneário Arroio do Silva, Balneário Gaivota e Passo de Torres.

A conclusão que se chega é que a pressão imobiliária está contribuindo na acelerada transformação do cenário geográfico costeiro. O micro bioma que sofre mais impacto com tais atividades é a vegetação de restinga, constituída por espécies arbustivas fixadoras de dunas. Uma infinidade de tipos distintos de animais, muitos dos quais endêmicos povoam esses biomas e estão ameaçados de extinção.

Segundo pesquisadores que monitoram esse bioma, a tendência é o agravamento ainda maior. São centenas de imóveis, terrenos, situados nesse bioma, cujos proprietários residem em outros municípios ou estados, a exemplo do Rio Grande do Sul. Com a duplicação da rodovia 101 e a conclusão da pavimentação asfáltica da BR 405, ligando o extremo sul de santa Catarina ao oeste do Rio Grande do Sul, através da serra da rocinha, um boom imobiliário poderá ocorrer na região.

Diante da crise econômica advinda da pandemia do Covid 19, os administradores públicos dos municípios costeiros tenderão dar incentivos às obras de infraestrutura imobiliária. A flexibilização ou até mesmo a não observância das legislações ambientais nesses municípios, poderão se tornar práticas corriqueiras dos futuros gestores, legisladores e fundações ambientais.   

Analisando alguns recortes de imagens dos municípios costeiros do extremo sul de santa Catarina das duas últimas décadas, obtidos por meio do aplicativo Google Earth, são espantosas as mudanças ocorridas na geografia de toda a faixa. Nenhum município mostrado nas imagens tem o plano municipal de saneamento básico aplicado na sua totalidade, especialmente no que tange ao tratamento dos esgotos. Isso significa que além da supressão de remanescentes da mata atlântica, a contaminação dos lençóis freáticos e da orla já é uma realidade. Durante a alta temporada, milhares de veranistas se deslocam para esses balneários, elevando ainda mais os níveis de contaminação.

Os gestores públicos que assumirão as prefeituras no próximo ano deverão ter como prioridade nos programas de governo, o cumprimento das políticas de saneamento básico, bem como ações voltadas para o desenvolvimento econômico sustentável. Tudo indica, observando o cenário político partidário pré-eleitoral, com a apresentação dos candidatos que cogitam participar do pleito, que o quadro ambiental desses municípios tenderão a se agravar ainda mais nos próximos anos. 

Prof. Jairo Cezar


https://www.sosma.org.br/noticias/desmatamento-municipios-mata-atlantica-2018-2019/https://www.sosma.org.br/noticias/desmatamento-municipios-mata-atlantica-2018-2019/

https://portalvarada.com/ultimas-noticias/expansao-urbana-e-agronegocio-ameacam-mata-atlantica-alerta-especialista/

https://www.ovale.com.br/_conteudo/brasil/2020/05/105026-desmatamento-em-areas-de-mata-atlantica-cresceu-27-2--em-2019.html

https://www.facebook.com/491930514172001/videos/492215430810176https://www.facebook.com/491930514172001/videos/492215430810176

https://www.nsctotal.com.br/noticias/dia-da-mata-atlantica-desmatamento-cresce-52-em-santa-catarina

 Passo de Torres – 07/02/2007

Passo de Torres – 05/12/2019


Passo de Torres – 07/02/2007

Passo de Torres – 05/12/2019


Balneário Gaivota – 17/02/2003

Balneário Gaivota – 09/10/2019


Balneário Gaivota – 17/02/2003

Balneário Gaivota – 09/10/2019


Balneário Arroio do Silva – 01/11/2005

Balneário Arroio do Silva - 09/10/2019



Balneário Morro Agudo – 01/11/2005


 

Balneário Morro Agudo - 19/12/2018




Balneário Ilhas – 01/06/2011


Balneário Ilhas – 19/12/2018