ESTUDANTES E PROFESSORES/AS DA EEBA VISITAM A TRADICIONAL COMUNIDADE DE ILHAS, ARARANGUÁ, EM CUMPRIMENTO A MAIS UMA ETAPA DO PROJETO ESCOLA SUSTENTÁVEL
Aos 27 dias do mês de setembro de 2017, cerca de 40
estudantes, cinco professores e uma engenheira ambiental estiveram no Balneário
Ilhas, Araranguá, para conhecer a foz do rio Araranguá, os problemas e as
potencialidades que cercam a região. É importante salientar que essa atividade
se constituiu em mais uma etapa do projeto Escola Sustentável, iniciado em
fevereiro de 2016. A escolha de Ilhas para visitação se deu pelo fato de ter
havido há cerca de dois meses, saída de campo ao município do Treviso, onde o
grupo teve contato com duas nascentes do rio Mão Luzia, afluente
do rio Ararangua. A água, num raio de 2 km apresentava-se cristalina, porém, sua
tonalidade vai modificando no instante que passa receber inúmeros dejetos,
dentre eles resíduos de carvão mineral.
Na comunidade de Ilhas, o grupo manteve contato com uma das lideranças do bairro, ex-presidente da colônia de pescadores e ativista
social. Na sua fala relatou que no passado a pesca era uma das principais
fontes de renda da comunidade, sendo o peixe capturado pelos homens e salgado
pelas mulheres. O comércio dos pescados ocorria no próprio local ou nos
municípios próximos como Criciúma. Explicou também que a partir da década de
1970 o peixe escasseou devido a incidência de resíduos das minas de carvão
mineral, lançadas no rio, que contaminou a água e matou os peixes.
Ressaltou que o peixe, gradativamente está
retornando ao rio devido a menor presença de rejeitos piritosos na água. A
presença de partículas de carvão era tanta no fundo do rio no passado, que os proprietários de minas as recolhiam para reaproveitar
ganhando muito dinheiro. Destacou também as mutações sofridas pela barra nas
últimas décadas, que há longo tempo vem se trabalhando para sua fixação, porém,
os projetos jamais saíram do papel.
Explicou que no passado a foz dor rio Araranguá estava mais ao norte,
cerca de 4 km, onde hoje está a comunidade de Barra Velha. Por isso o
nome de Barra Velha.
Porém, a barra continua e vai continuar recuando,
tanto para o norte quanto para o sul. Disse que já houve várias iniciativas de
administradores públicos no passado tentando abri-la com escavadeiras em outros
locais, porém, todas as ações não foram bem sucedidas. Há cerca de 10 anos deu-se inicio ao debate
do projeto que propunha sua fixação definitiva. Entretanto, por questões
técnicas, o projeto foi abortado. Informou que os interesses individuais se
sobrepujaram ao da coletividade, que o órgão ambiental federal (IBAMA) se
posicionou pelo arquivamento do projeto, pois os estudos de viabilidade
apresentados pelos técnicos confirmavam que a fixação não amenizaria o problema
das cheias do rio Araranguá, um dos objetivos do empreendimento.
No entanto, o poder público conseguiu na época
promover desentendimentos entre as várias comunidades envolvidas diretamente
com o projeto, como a Barranca, Ilhas, Morro Agudo, Morro dos Conventos. O que
gerou, portanto, maior revolta dos moradores de ilhas foi quando o poder
público decidiu pela fixação nas proximidades do Morro Agudo. Decisão não
técnica, e sim política. Se a empreendimento se concretizasse Ilhas se
transformaria em uma “Barra Velha”, pois o rio que margeia a comunidade
secaria, a areia ou dunas tomariam conta da comunidade.
O representante da comunidade também discorreu sobre a polêmica pesca de
caniço as margens do rio Araranguá. Insistiu em afirmar que tal atividade
prejudica diretamente os pescadores profissionais. Que a atitude dos políticos
em querer resolver o problema com a construção de pesqueiros fixos trará
impactos negativos à economia pesqueira da região. Numa reunião que participou
em Balneário Arroio do Silva, para discutir os critérios de concessão de
carteirinhas para pescadores profissionais, ouviu que já havia cerca de um
milhão de reais disponíveis para tal projeto trapiches.
Alertou que estão enganando o povo com informações
falsas, que poucas ou nenhuma das pessoas que pescam de caniço, têm carteira de
pescador profissional. O pior é que os peixes capturados nesses pesqueiros não
são de boa qualidade, pois se alimentam de farelo e outros derivados, bem como
carniças de animais mortos que os próprios pescadores recolhem e jogam no rio
como engodo. O peixe não circula pelo rio, disse, ficando somente num local.
Quem pesca de tarrafa ou rede, é diretamente afetado por tais práticas. Se
fizer uma enquete nas comunidades de Ilhas, Morro Agudo e naquelas onde atuam os
pescadores, nenhum dos moradores é favorável aos pesqueiros. O motivo é que
quase todos que ali atuam não residem na comunidade e nem dependem dessa
atividade para sobreviver.
Muitos são aposentados, pessoas bem aquinhoadas que
pescam por esporte, diversão. Quanto a
fiscalização da pesca, a situação hoje está extremante complicada, disse o líder comunitário. Expôs alguns exemplos de como a comunidade se organizava no passado.
Na época era a própria colônia de pescadores quem definia as políticas de
captura, fiscalização e comercialização dos pescados. Quando foi tirada a
competência da entidade e transferida para o IBAMA, Polícia Ambiental e a FAMA,
a situação piorou muito. Isso porque, ambos não apresentam estruturas para
aturarem, sempre alegando falta de efetivos.
Portanto, virou bagunça, disse. Atualmente dependem
da pesca cerca de 30 famílias na comunidade de Ilhas, oito na de Morro Agudo e
outras oito na de Barra Velha. No passado eram aproximadamente 300 famílias de
pescadores dependendo diretamente da captura do peixe. Atualmente, para
sobreviver, as 30 famílias têm de fazer bicos para completar a renda. Os filhos
dessas famílias tiveram que sair para procurar trabalho. Citou um fato ocorrido
na década de 1980, quando na comunidade havia um condomínio com 113 pescadores,
que possuíam uma rede de arrastão.
Num único arrastão capturaram cerca de 80 toneladas
de bagre. Em dois ou três meses, período permitido antes do defeso, capturaram
entre 200 a 300 toneladas de bagre. A safra do bagre garantia para cada um dos
113 pescadores renda média mensal de dois salários mínimos. Sem contar as
safras da tainha e outros pescados. Relatou que na época nas proximidades da
barra havia uma espécie de viveiro, onde o peixe se recolhia durante alguns
períodos do ano. Um “capataz” era indicado para monitorar o local, que avisava
os pescadores soprando uma aspa de boi (berrante).
Cerca de 500 canoas se deslocavam para o local,
todos munidos de tarrafas. Capturavam em
uma ou duas horas os peixes necessários. Ouvindo o sinal do capataz (berrante),
todos tinham que cessar a pesca. Quem descumprisse a ordem teria que pagar
multa à associação de pescadores. Hoje virou bagunça, os órgãos fiscalizadores
não cumprem suas funções, nem mesmo a FAMA, que virou cabide de emprego. A
pesca predatória na boca da barra é outro problema, parece irreversível,
destacou o líder comunitário. É comum pescadores clandestinos lançarem suas redes
capturando o peixe que entra na barra, que antes de se deslocarem rio acima
passam por um período de quarentena, adaptação, ou seja, transição da água
salgada para doce.
Jairo relatou que no final de 2016 o prefeito
anterior sancionou três decretos criando a MONA, Unidade de Conservação Morro
dos Conventos, a Área de Preservação Ambiental e a RESEX, Reserva Extrativista
em Ilhas e Barra Velha. Segundo o líder comunitário, não há boa vontade da atual
administração e do Órgão ambiental Municipal em dar continuidade ao processo
dos decretos, que são agora agilizar os planos de manejo, especialmente da
Resex. O plano de manejo começaria com o cadastramento de todos os pescadores
profissionais da comunidade. Os que não forem cadastrados não teriam direito de
pescar na região.
Sobre a extração de areia, informou que na
comunidade tal atividade não está resultando em impactos significativos,
diferente, portanto, da comunidade de Mãe Luzia, onde está havendo o
rebaixamento dos lençóis freáticos, comprometendo o abastecimento nas
residências. Em Ilhas e Morro Agudo, o problema mesmo da água do rio, segundo o líder comunitário, são os agrotóxicos, os esgotos domésticos, industriais e os resíduos
de carvão que mais impactam. A FAMA não
executa sua real função que é fiscalizar. Há pouco tempo fixou placas nas proximidades
da barra destacando os limites para o exercício da pesca, porém, muitas delas
foram arrancadas, sem que fossem repostas. É uma tristeza, disse o morador.
Quanto à balsa, a proposta da administração de decidir pela cobrança para
travessia prejudicará em muito o parco turismo na comunidade. Não é arrecadando
30 mil reais por ano que resolverá o problema das dívidas do município, disse.
A engenheira Michele relatou que as nascentes do rio
Mãe Luzia, no município de Treviso, visitadas pelos os estudantes da EEBA, são
uma das poucas que não sofreram o processo de degradação por resíduos de
carvão. Explicou que a bacia do rio Araranguá é formada por 16 municípios,
cujos rios, afluentes e subafluentes, totalizam cerca de seis mil km de
extensão. Toda a água que passa por Ilhas e deságua no oceano atlântico, recebe
rejeitos de 300 mil pessoas, incluindo esgotos industriais, agrotóxicos e
resíduos de carvão.
Esclareceu que nas décadas de 1940 a 1960 o processo
de extração e beneficiamento do carvão não possuía qualquer regulamento. O
carão quando extraído era lavado no leito do próprio rio. Que a cor laranja,
avermelhada da água vista em Siderópolis e Treviso, é devido a grande
incidência de metais pesados na água como ferro, enxofre, etc. Grande parte desse
material ficava e ainda fica depositado no fundo do rio, com o movimento da
água todas as partículas são removidas chegando até a barra.
Relatou que em 1981 foi criada a primeira resolução
do CONAMA para regulação de quaisquer atividades que prejudicasse o ambiente.
Até então tudo era permitido. O setor empresarial e outros segmentos, se
sentindo prejudicado com as resoluções começaram a demonizar os órgãos
ambientais, culpando-os pelos prejuízos das baixas produtividades e dos imensos
lucros obtidos. No entanto, o próprio Estado vem precarizando os órgãos
fiscalizadores como IBAMA, Polícia Ambiental, Fama, com reduzido plantel de
profissionais para aturarem.
À distância em linha reta, entre o mar e a serra,
que é o caminho percorrido pela água até a barra é de aproximadamente 60
km. Outro importante item no quesito
enchente na região da bacia é a declividade do solo entre o topo da escarpa à
barra, que atinge cerca de 1000 metros. São aproximadamente dois dias o tempo
necessário para que á água que cai nas cabeceiras do rio cheguem à barra. Esses fatores geográficos e topológicos são determinantes
para o acúmulo de água as margens do rio durante chuvas torrenciais.
Atualmente a
região da bacia vem sofrendo o problema do abastecimento de água, tendo a
necessidade de projetos de açudes e barramentos para o abastecimento humano e
agrícola. Relatou também que o Brasil não está nesse momento tendo influência
do El ninõ e la ninã, e esse é o motivo do imenso calor e falta de chuva na
região. Michele também levantou alguns questionamentos aos estudantes, como
quais as ações que poderiam fazer para dinamizar ainda mais o projeto escola
sustentável que vem participando.
Quais os espaços de atuação que poderiam ocupar? O que cada um poderia
fazer? Informou que a escola onde atuam, é representada no comitê da bacia do
rio Araranguá e que vem discutindo políticas de gestão da água. Que os
estudantes podem participar na câmara municipal como vereadores mirins,
encaminhando projetos sustentáveis de gestão da água. Deixou explícito, que não
podemos esperar que algum resolva os problemas e ficarmos de braços cruzados. É
importante permanecermos alertas, pois Ararangua não possui fontes alternativas
de abastecimento. Se hipoteticamente secar o açude belinzoni e a lagoa da
serra, não poderemos utilizar a água do rio, pelo fato de a mesma estar
contaminada por metais pesados e outros rejeitos. Existem espaços para discussão. Precisamos
conhecer a história de quem tem história, e conhecer quem tem vivência para
fazer a diferença.
Prof. Jairo Cezar
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