APROVAÇÃO DO PL DO VENENO (PL 6.299/02) AUMENTARÁ
OS CASOS DE CÂNCERES, MUTAÇÕES GENÉTICAS E DEMAIS DOENÇAS DEGENERATIVAS
Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados |
A
aprovação na comissão especial de câmara federal do parecer do projeto que
procura entre outros objetivos facilitar a comercialização de agrotóxicos até
então proibidos pela legislação em vigor, é o primeira etapa vitoriosa do
agronegócio que insiste em condenar à
morte milhões de pessoas por consumir
alimentos contaminados. O que é condenável é constatar que em vez da comunidade parlamentar estar
discutido maneiras de limitar ou até mesmo eliminar por definitivo o uso de
pesticidas, fazem exatamente o inverso, tentam intensificar ainda maior o uso
do veneno na agricultura. O Brasil sem a aprovação da dessa PL já lidera o
ranque mundial em consumo do agrotóxicos.
Os
alertas de que tais medidas perigosas à saúde humana e ao meio ambiente não
estão sendo suficientes para sensibilizar setores na linha de frente desse
negócio perigoso como a bancada ruralista no Congresso Nacional. Como querer conscientizar
uma categoria se um dos principais protagonistas da criação do projeto de lei está no comando da pasta do
Ministério da Agricultura, o mega empresário da soja Blario Magi. O projeto de
lei tem, entre tantas outras prerrogativas, dar maior autonomia a esse
ministério na tomada de decisões para autorizar a liberação de novos pesticidas.
Em
2015 a ABRASCO (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) publicou dossiê de 700
páginas contendo pesquisas sobre agrotóxicos realizadas nos últimos 10 anos,
cujos resultados preocuparam ainda mais as comunidades científicas brasileiras
e internacionais. Os laudos realizados com os principais alimentos consumidos
pela população, concluíram que 70% possuíam algum tipo de resíduo toxicológico.
Deste montante, um terço ou 30% apresentavam algum tipo de partícula
proveniente de agrotóxicos não autorizados pela legislação brasileira (ANVISA).
Não há dúvida que por longos anos já vêm
sendo disseminado nas lavouras em todo território brasileiro de venenos não
autorizados, pior ainda, muitos são contrabandeados.
Uma
das alegações dos defensores da PL é que as legislações em vigor são morosas
para avaliação de princípios ativos para sua posterior liberação. Na realidade
é uma justificativa tosca, pelo fato de ser o próprio governo o responsável
pela situação de demora. No Brasil, o número de profissionais envolvidos
diretamente nos processos de avaliações e controle de agrotóxicos são cerca de 50.
Nos Estados Unidos o número é próximo de mil. Outro detalhe é o custo ínfimo
cobrado para o registro de algum novo produto químico.
Nos
estados Unidos, o valor cobrado pelos laboratórios credenciados é próximo de um
milhão de dólares. O custo alto é uma prova da responsabilidade que é liberar
para o mercado um novo princípio ativo. O lado ruim desse festival de venenos
cada vez mais letais e acessíveis a todos os públicos é o elevado custo social
e ambiental. São poucas as pesquisas concluídas e em andamento no país que
confirmam os impactos do uso de pesticidas, fungicidas e outros tantos do
gênero na saúde da população. Os resultados já apresentados não deixam dúvidas
que a elevada incidência de cânceres, deformações fetais, doenças neurológicas,
depressão, etc, estão relacionadas aos agrotóxicos.
Anualmente
milhões de reais são disponibilizados para o tratamento de doenças que tem
alguma relação com a contaminação de pesticidas. Enquanto o setor do
agronegócio capitaliza os lucros com legislações cada vez mais permissivas a
aplicação de químicos na agricultura, o
prejuízo dessa ganância é socializado por todos. O que está se tentando
difundir no país atualmente é o mesmo modelo desenvolvimentista adotado na
época dos militares, quando regiões como de Cubatão, as fábricas lá instaladas
que exalavam fumaça e contaminação eram tidas como marca de orgulho do
progresso.
Todos/as
sabem o passivo ambiental deixado, até hoje ainda impactam os ecossistemas da
região. As toneladas de veneno lançadas ao solo todos os anos no Brasil estão
contaminando ecossistemas inteiros, provocando o desaparecimento de espécies
importantes da fauna e mutações em tantas outras. Além das manifestações
contrárias à PL por dezenas de entidades científicas, instituições de ensino e
organizações ambientais, o MPF (Ministério Público Federal) também se
posicionou contrário ao projeto alegando haver inconstitucionalidade no texto
por infringir inúmeros artigos e dispositivos da Constituição Federal, com
destaques os artigos 23, 24, 170, 196, 220 e 225.
É
de se prever como já descrito na própria constituição que a nota técnica do MPF
sobre o Projeto de Lei Nº 6.299/2002 será protocolada nas instâncias superiores
da justiça na tentativa de impedir sua apreciação e votação nos plenários da
câmara e do senado. Se prevalecer o comportamento nada imparcial do judiciário
nas instâncias máximas de decisão, o PL do veneno será mais um dos inúmeros
projetos que mesmo tendo comprovação de violação de princípios constitucionais,
irá se tornar lei.
Na
leitura das nove páginas da nota técnica do MPF manifestando veto imediato ao
projeto de lei sobre a liberação de agrotóxicos cabe aqui destacar alguns dos
pontos relevantes mencionados e lançar reflexões que facilite a compreensão do
público sobre o assunto. A CF no seu artigo 23 diz que é de competência da
União, Estados, Municípios e o Distrito Federal, legislarem quando questões forem
voltadas à defesa da saúde, proteção do meio ambiente, fauna e flora.
Na
PL do veneno, no seu artigo 9, já escancara a nítida intenção dos parlamentares
ruralistas de desconsiderar o art. 23, da CF, quando defendem que os estados, os municípios e o distrito federal não deverão
propor restrições à comercialização de agrotóxicos já autorizados por decisão
superior. Subtende-se que qualquer lei aprovada ou pretendida nas
instâncias inferiores, não terá validade legal, pois se confrontará ao dispositivo da nova lei caso
aprovada, mesmo comprovada a sua periculosidade à saúde humana e ao ambiente.
Quando
se trata de matéria vinculada à saúde pública, não é conveniente restringir os
estados e municípios de legislarem para estabelecer regras mais restritivas ao
uso de agrotóxicos, seguindo as peculiaridades geográficas e ambientais de cada
região e município brasileiro. Essa é uma prerrogativa assegurada na lei
7.802/09[1] e
no art. 30 da CF, quando afirma que os
municípios devem prestar, através de cooperação técnica financeira da União e do Estado, serviços de
atendimento à saúde da população. Como ficariam as leis orgânicas e os
códigos ambientais municipais que definiram resoluções específicas sobre o
assunto, muitos dos quais impondo critérios mais rígidos quanto a
comercialização de certos agrotóxicos?
A
PL do veneno propõe dar caráter deliberativo ao CTNFito (Comissão Técnica
Nacional de Fitossanitários) sobre aprovação ou não dos novos agrotóxicos,
reduzindo por sua vez o poder de órgãos como a ANVISA e o IBAMA que não terão
mais poder de veto. Com a criação do
conselho técnico, inúmeras entidades terão assento, muitas das quais
integrantes do seguimento do agronegócio que poderão influenciar na criação de
regras mais brandas para os químicos, supervalorizando questões técnicas e
produtivistas das indústrias químicas.
No
imaginário da população quando o assunto agrotóxico a primeira imagem que vem à
é de uma caveira, a mesma descrita nos rótulos dos produtos hoje comercializados.
O que se quer na PL é desconstruir o conceito
maléfico dado aos pesticidas, herbicidas, etc, suavizando-o com nova nomenclatura que se
chamará produto FITOSSANITÁRIO. A Atual
legislação sobre os agrotóxicos veda a comercialização de substâncias
TERATOGÊNICAS, CARCINOGÊNICAS OU MUTAGÊNICAS. Com a PL esses mesmos componentes
ativos proibidos poderão ser registrados e liberados. O não registro somente ocorrerá
quando for comprovada cientificamente que ambos são causadores de doenças como cânceres.[2]
É
quase rotina nas cidades brasileiras especialmente nas do interior o uso da
capina química para supressão de plantas invasoras. Entretanto a legislação
ambiental libera o uso exclusivamente no campo, sendo proibindo nos perímetros
urbanos conforme resolução de 2010, ANVISA datada de 2010. O que se pretendo
com a PL, acerca do espaço urbano e industrial, é a aplicação da legislação que
versa sobre a vigilância sanitária, lei n. 6.360/1976. A lei, porém, não versa sobre
agrotóxicos, e caso venha prevalecer haverá dificuldades em manter uma
fiscalização mais efetiva.
Quando
um produto novo é lançado no mercado são necessários longos anos de
acompanhamento para verificar seus efeitos à saúde humana e ao ambiente.
Portanto, não há prazo para liberação comercial. No instante que o produto for
disponibilizado ao mercado, se for comprovado algum prejuízo ambiental, os
órgãos reguladores terão cerca de 90 dias para encaminhar o seu cancelamento.
Com a PL, as entidades reguladoras terão 180 dias para se manifestar acerca do
registro do novo produto. Ao mesmo tempo o MAPA (Ministério da Agricultura
Pecuária e Abastecimento) é determinado prazo de 90 dias para expedir o
registro.
É
possível que muitos dos laudos dos novos produtos avaliados apresentem tipos de
imperfeição, devido ao número insuficiente de profissionais disponíveis e o
pouco tempo para o controle das variáveis dos princípios ativos testados. Hoje
são cerca de 30 a 40 profissionais que atuam no Brasil inteiro para atender uma
demanda enorme de pedidos solicitados. Por isso que alguns produtos chegam demorar
10 anos para serem avaliados. Prazo de 180 dias, sem estruturar melhor órgãos
como a ANVISA e o IBAMA é praticamente impossível de se ter uma avaliação mais
segura sobre os agrotóxicos.
Como
acontece com os medicamentos de uso humano e animal, existe uma política que
regula a propaganda sobre os mesmos. Isso também acontece com os agrotóxicos. A
lei em vigor obriga que os veículos de comunicação alertem os consumidores
sobre a necessidade de conferir os rótulos dos produtos, dos riscos que correm
quando manipulam o produto e da necessidade do uso de equipamentos adequados
quando for aplicá-lo no campo. Conforme
o art. 60 da PL, não haverá regras especificas sobre a propaganda, passando a
valer as regras contidas na lei n. 9292/96, que as torna mais frágil, até mesmo
incentivando o uso, pelo fato de não se tratar mais de agrotóxico e sim DEFENSIVO
FITOSANITÁRIO.
Todo/a
cidadão/a que deseja adquirir alguma marca de agrotóxico deve por lei apresentar receituário devidamente elaborado
por profissional dá área, nesse caso um agrônomo. A PL, porém, retira a obrigatoriedade por meio do art. 54. É de se
imaginar que haverá o aumento substantivo de intoxicações por desconhecimento
dos usuários na aplicação das dosagens indicadas e uso incorrendo de equipamentos de proteção. As
intoxicações mesmo com todo rigor da legislação, os registros vem crescendo significativamente em todas a
regiões brasileiras.
A
comercialização de agrotóxicos genéricos e equivalentes também é permitida no
Brasil. Entretanto, no quesito equivalência
fica a cargo dos órgãos do meio ambiente e da saúde, seguindo padrões técnicos estabelecidos
pela FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação). Se a
PL for aprovada, sem emendas, essa função passa ser de responsabilidade
exclusiva do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, conforme as
diretrizes aprovadas pela CNTFito. Agrotóxicos
equivalentes permitidos na PL é outro problema e de grave risco a saúde. O fato
é que a fórmula tende a ser diferente do produto original. Quando isso
ocorre cabe aos órgãos reguladores fazerem estudos de acompanhamentos avaliando
os riscos potenciais à saúde. O texto do PL nada diz sobre tal obrigatoriedade.
Quando
se adquire um medicamento sua formulação foi preparada para atender certo tipo
específico de moléstia. No processo de
fabricação de agrotóxicos a metodologia não é diferente. O que consta no texto da PL 6.299 é a flexibilização da regulação
autorizando o mesmo componente químico para culturas diversas, ou seja, um
produto preparado para combater o inseto do milho poderá ser utilizado combater
o inseto da soja, por exemplo. A CNTFito
terá 30 dias para analisar os pedidos. É consenso dos entendidos que avaliam a
toxidade dos produtos que o prazo de um
mês é absurdamente curto para lançar pareceres tão complexos, até mesmo
promover consultas públicas sobre tais pedidos.
Um
dos artigos inseridos no PL discorre sobre risco
inaceitável à saúde quando comprovado cientificamente que levaria o não
registro de certos agrotóxicos. Varias pesquisas já finalizadas concluíram que
certas doenças e até mesmo casos de má formação congênita em bebês estão
relacionadas ao contato direto e indireto com agrotóxicos. A mais recente
pesquisa foi divulgada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do
Ceará, mostrando os efeitos dos agrotóxicos à saúde dos moradores da cidade de
Limoeiro do Norte, estado do Ceará. O
município fica situado na Chapada do Apodi, uma das regiões produtoras de
frutas para a exportação, cujos trabalhadores são expostos aos agrotóxicos por
longos períodos.[3]
Os
levantamentos laboratoriais realizados comprovaram a presença de resíduos
químicos no leite materno, bem como a incidência de bebês meninas com puberdade
precoce e deformação fetal. Quase toda a população do município trabalha na
agricultura e tem contato direto e indireto com agrotóxicos. Há revelações de
trabalhadores terem tomado banho de veneno no momento da aplicação do produto.
Ninguém está imune aos agrotóxicos no município devido ao fato de serem usados
aviões para pulverização das lavouras, sendo que essa prática já é proibida na
União Européia desde 2009.
Embora
proibido por lei, agrotóxicos do tipo 2.4 D, conhecido como agente laranja e
utilizado durante a guerra do Vietnã, seu uso na agricultura brasileira vem se
tornando rotina. É de se acreditar que a toxidade desse agente seja um dos
principais vetores das anomalias detectadas pelos cientistas da universidade
federal do Ceará nos habitantes de Limoeiro do Norte. Tantos os pesquisadores
quanto a própria população da região da chapada do APODI estão pessimistas com
o texto da PL caso seja aprovada como está. Novos produtos até então proibidos e altamente cancerígenos como o 2.4 D poderão
fazer parte da rotina diária dos trabalhadores da chapada.
Os
defensores do projeto afirmam que houve alterações significativas no texto
original atendendo às solicitações de entidades e da população. Afirmam também que substituíram o termo
defensivo agrícola por pesticida, seguindo regra internacional. Outro argumento defendido: a partir de agora haverá o controle mais sistemático sobre a
aplicação de químicos na agricultura não ultrapassando os “limites toleráveis”
recomendados pelas organizações de saúde. Limites toleráveis significa
então que pode ser consumido maçã, laranja ou qualquer tipo de alimento
contendo partículas em níveis aceitáveis de organoclorados e outros pesticidas.
E o processo acumulativo dessas partículas no organismo, como fica?
Mais
uma vez é importante ratificar que a estratégia do governo brasileiro na difusão
do agrotóxico na atividade produtiva agrícola caminha na contramão do que está sendo
pensado e adotado no mundo, que é a
difusão de alimentos orgânicos. É tecnicamente comprovado que fungos, insetos,
plantas reagem a ação dos pesticidas tornando-se resistentes, exigindo doses
maiores e até mesmo o emprego de fórmulas mais tóxicas. Contrariando essa
tendência perversa do uso dos agrotóxicos, há mais de trinta anos a FAO vem
atuando em programas agrícolas de manejo integrado com resultados expressivos
na ordem de 10% a menos de pesticidas nas culturas na Ásia.
Esse
sistema poderia tranquilamente ser aplicado no Brasil ao ponto de zerar o uso
de químicos na agricultura. Entretanto uma das barreiras enfrentadas é o modelo
das propriedades, constituída de grandes latifúndios contínuos. A própria
monocultura se caracteriza como uma aberração à natureza, pelo fato de torná-la
vulnerável ao ataque de espécies invasoras. A transição de um sistema
convencional para o orgânico, pautado na diversidade de culturas, já é prática
comum em muitos países como a Dinamarca, Suécia, Suíça, etc. No Brasil, está se
adotando em algumas culturas procedimentos orgânicos. O cultivo de cana de
açúcar sem agrotóxicos no estado de São Paulo é um bom exemplo. Porém, a
rentabilidade na produção é menor comparada à atividade familiar, que adota um
sistema integrado, ou seja, várias culturas intercaladas.
Prof.
Jairo Cezar
[1]
Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem,
o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a
utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e
embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a
fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras
providências.
[2]
file:///C:/Users/Jairo/Downloads/An%C3%A1lise%20PL%20Agrot%C3%B3xicos%20(1).pdf
[3]
http://reporterbrasil.org.br/2018/06/agrotoxicos-seriam-causa-de-puberdade-precoce-em-bebes-aponta-pesquisa/
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