TRAGÉDIAS
EVITÁVEIS ESTÃO SOLAPANDO ECOSSISTEMAS E COMUNIDADES INTEIRAS NA AMAZÔNIA
É
algo inimaginável um presidente da república provocar tantos estragos e
retrocessos sociais em tão pouco tempo a frente do cargo. Todas as minhas
escritas publicadas nesse blog, expressiva parcela delas, discorrem sobre
economia, política, educação, meio ambiente, dos governos que antecederam o
atual a partir da abertura política. Em nenhum momento poupei criticas as
políticas equivocadas de todos os governos, especialmente no período cuja
população teve a experiência de ter no poder pessoas ligadas ao partido dos
trabalhadores.
Embora
tivesse forte afinidade a essa sigla, tendo até me candidatado à disputa legislativa
municipal no final da década de 1990, sem sucesso, já encerrada a ciclo do
partido dos trabalhadores em âmbito federal, a decepção foi tamanha que me
forçou a uma ruptura definitiva com a sigla. Na área ambiental os fatos
comprovam que muitas das decisões tomadas como das inúmeras hidrelétricas
construídas na Amazônia legal, a exemplo da hidrelétrica de Belo Monte, os
impactos ao ambiente e as comunidades tradicionais do entorno se tornaram quase
que irreversíveis.
Mesmo
com todas as contrariedades de um partido e governos gerados nas periferias, no
imaginário social pairava o sentimento pouco pessimista do futuro, pois jamais os
governos se esquivaram dos debates, de encaminhar proposições criativas nas
conferências e encontros sobre o clima global. O modo como a ex-presidente
Dilma foi execrada do cargo e toda a articulação das forças conservadoras para
o sucesso da empreitada acendeu uma luz ameaçadora no fundo do túnel.
Os
acontecimentos que se sucediam após o impeachment lançavam uma névoa espessa
sobre o futuro da sociedade bem como meio ambiente. A gestão de Temer foi
apenas uma demonstração terrível de como um governo, atrelado ao capital, poderia
em pouco tempo produzir tanto retrocesso. No entanto, sua presença no cargo
seria curta, por exercer um mandato tampão até a eleição seguinte em 2018,
quando seria eleito o próximo presidente da república. De repente, sem que
ninguém pudesse imaginar, brota das profundezas do inferno a imagem de uma
figura na convencional, que adquiriu corpo, convergindo para sim uma legião de
seguidores entorpecidos pelo seu discurso ameaçador.
Numa
cultura fortemente influenciada pelo catolicismo, na bíblia tem uma passagem
onde afirma que no final dos tempos a humanidade receberá a visita do messias,
cuja tarefa é escolher os bom e os juntos para o paraíso eterno. Os resultados
das eleições de 2019 me parecem que tal profecia se consolidou, será que finalmente
chegamos aos finais dos tempos? Muitas foram as suplicas e incontáveis alertas
de que uma possível vitória do candidato Bolsonaro, o Brasil estaria caminhando
para o abismo ambiental e social, fatos sem precedentes na história da
república brasileira.
O
comportamento e os discursos dos quais proferiam nos comícios e entrevistas,
deixava explícito seu desejo sórdido de levar o Brasil a um retrocesso inimaginável.
No entanto, a população talvez, embrutecida, decepcionada com os desmandos dos
governos passados, ou por protestos, ou por acreditar, lançou seu voto a Jair
Bolsonaro. Não foram necessários muitos dias no cargo para que seus eleitores
não fanáticos se apercebessem da burrada que haviam cometido. Já era tarde. Independente das críticas e
denúncias em todos os quadrantes do território brasileiro, o governo permanecia
com sua postura de campanha, prometendo e executando seus planos sórdidos, a
maioria sob a forma de decretos, muito semelhante a do regime militar.
Primeiro
a Reforma Trabalhista, Temer, vindo sem seguida a Reforma da Previdência, entre
outras tantas medidas anti sociais foram sendo executadas uma a uma. Um dos
temas polêmicos do governo Bolsonaro e passivo de críticas de entidades de
defesa de direitos humanos, a liberação do porte de armas, foi levada à frente
com o aval de parcela significativa da sociedade. Um país no qual vem
alcançando níveis recordes de assassinatos, tanto nas áreas urbanas quanto
rurais, a liberação do porte de armas é sem dúvida a sentença à limpeza étnica,
comparada ao holocausto.
Foram
tantas em tão pouco tempo as ações destrutivas e ameaçadoras do atual governo à
integridade física e moral da sociedade, suficiente ao ponto de a sociedade ter
esquecido o curto/longo período Temer, protagonista de uma avalanche de ações
impopulares. O governo Bolsonaro, dia após dia, sua popularidade passou a decrescer
diante de seu discurso tosco e comportamento autoritário. É claro que por trás
dessa postura esdrúxula, caricata, setores da sociedade como o agronegócio, representantes
do segmento evangélico no congresso, ente outros, lhe dão guarida. Sua pauta
política de governo os agradava muito, pais lhes favoreciam mediante a
liberação quase incondicional de agrotóxicos e a reestruturação da moralidade,
dita por ele, judaico cristã.
A
indicação de figuras alinhadas ao seu discurso aos principais ministérios dava
o tom de como seria o Brasil nas áreas econômicas, educacionais e ambientais. Economia,
Educação e Meio ambiente, os gestores foram estrategicamente escolhidos cujos
desafios eram a execução de planos dos quais deixariam cicatrizes por gerações.
Isso mesmo, gerações. Na
economia, coordenada pelo “super ministro Guedes”, o plano principal era a
aprovação da reforma da previdência, da qual como foi a reforma trabalhista,
restabeleceria a escravatura, tendo a população que trabalhar até a morte.
Na
educação, tanto o primeiro ministro escolhido, demitido por demonstrar
incapacidade intelectual, o segundo, ninguém imaginava que pudesse ser pior que
o primeiro e que causasse tantos estragos na educação em tão pouco tempo no
cargo. Suas atitudes na pasta deixaram nítidas mostras que é muito mais cômodo
eleger governos sem qualquer capacidade para o cargo, para manter a população
ignorante e submissa. O ataque aos professores e principalmente as
universidades públicas com cortes expressivos de recursos foi o primeiro cartão
de visita, mostrando seu verdadeiro objetivo no ministério da educação. Se as condições
estruturais das universidades públicas e dos institutos federais já eram
precárias sem os cortes, imaginamos agora com os “contingenciamentos”.
Desde
a primeira aparição na TV, ainda como pré candidato à presidência, Bolsonaro já
lançava pinceladas de que a mira de seu governo estaria apontada ao segmento
ambiental. Isso se tornou realidade no instante que afirmou que fundiria os
ministérios da agricultura e o meio ambiente. A proposta poderia ser comparada
a fábula onde as galinhas seriam cuidadas das raposas. Pressões de todos os
lados fizeram que o mudasse de ideia, mantendo os ministérios separados. Porém,
tal atitude não foi suficiente para assegurar que os respectivos postos
pudessem proporcionar cenários tão terríveis à preservação das florestas.
A
indicação de dois ministros, uma para o ministério da agricultura, ligada ao
agronegócio, e outro do meio ambiente, tendo sido condenado por crime de
responsabilidade quando atuava no governo do estado de São Paulo, se transformou
em figuras conhecidas nos noticiários diários por suas peripécias a frente das
pastas. Jamais no passado um presidente havia liberado em tão pouco tempo
tantas marcas de agrotóxico, em comparação a Bolsonaro.
O
agravante é que muitos dos princípios ativos presentes nesses pesticidas já
haviam sido banidos há anos tanto na comunidade européia quanto nos Estados Unidos.
Infelizmente a pressão social, de ambientalistas e comunidades científicas
nacionais e internacionais não foi suficiente para conter a fúria gananciosa e
genocida do agronegócio. Como já era de esperar, embora os dois ministérios,
agricultura e meio ambiente, estivessem atuando em separados, suas ações se
convergiam, pois suas políticas estavam direcionadas em promover um dos maiores
desmontes e retrocessos na área ambiental, de forte repercussão global.
A
perseguição e criminalização de órgãos governamentais ambientais, como o IBAMA,
ICMbio, ativistas ambientais, entre outros, se configurou como estratégica de
limpar o caminho qualquer obstáculo àquilo que viriam a ser meses depois uma
das maiores tragédias ambientais, os incêndios florestais no bioma da Amazônia
e de outros espalhados pelo Brasil. Se havia agora no poder um presidente com
um discurso incitando à violência, a homofobia, a grilagem, a invasão de terras
indígenas e de demais grupos tradicionais, psicologicamente, o sentimento que
perpassaria sobre o bioma do serrado e da Amazônia, por exemplo, era de que
tudo agora seria permitido, pois os fins justificariam os meios.
As
queimadas na Amazônia se transformaram num dos principais acontecimentos de
repercussão planetária, fato que mobilizou autoridades de dezenas de país
pressionando o governo brasileiro para que tomasse providências enérgicas ao
combate dos incêndios. Como já vem sendo praxe às queimadas na Amazônia nos
últimos tempos, muitas das quais criminosas com vista a expansão da fronteira
agrícola, o que chamou a atenção dessa vez foi o elevado número, superando
todas as estatísticas históricas conhecidas. Era visível aos olhos de todos que
o fogo sobre as florestas da região tinha mão humana.
Denúncias
confirmaram que fazendeiros, pecuaristas, entre outros, articularam pelas redes
sociais a campanha macabra o dia do fogo. Florestas inteiras foram sendo derrubadas
e incendiadas para dar lugar à pecuária e a agricultura. Nos encontros de
cúpula sobre o clima o Brasil sempre compartilhou as decisões da COP se
propondo em adotar políticas para a redução das emissões de CO2, resultantes da
queima de florestas.
A
floresta amazônica concentra parcela significativa de carbono retido nas
florestas. Uma das propostas acatadas pelo Brasil na última COP, em Paris, foi
compromisso de nos próximos 20 ou trinta anos combater os desmatamentos ilegais,
ou seja, zero desmatamento. A chegada de Bolsonaro ao Poder colocou uma pá de
cal em todos os avanços obtidos pelo Brasil sobre as florestas e o clima
planetário.
Não
podemos nos iludir que o problema na Amazônia se limita aos incêndios e suas
conseqüências para o planeta. A região já vem sendo assolada por outros tantos
problemas ambientais de proporções avassaladoras à região. Muitos devem não
lembrar mais das abomináveis barragens construídas sobre o leio dos principais
rios da bacia amazônica, entre eles a mortal hidrelétrica de Belo Monte.
Na
época, pesquisadores e ambientalistas alertavam os governos Lula e Dilma que a
execução desse bilionário projeto, bem como de outras barragens similares na
região provocaria impactos terríveis aos frágeis ecossistemas e sociedades
tradicionais. Os alertas não foram suficientes para impedir sua execução. Quase
dez anos depois do início do projeto, nesse ou no próximo ano, o governo
brasileiro irá inaugurar a última turbina da hidrelétrica que entrará em
funcionamento. É incrível como no Brasil algumas tragédias se sobrepõe a outras
como num passe de mágica. Porém, pouco tempo é suficiente para cair no
esquecimento.
A
hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, foi uma das maiores manobras de
corrupção envolvendo políticos, empreiteiras na execução da obra. Desde o seu
início críticas eram lançadas alertando sobra a inviabilidade econômica da
obra, pelo fato do rio Xingu, nas estações de estiagem, não fornecer água
suficiente para movimentar as turbinas. Um dos acordos assinados era para que o
fluxo de vazão da água da barragem seria monitorado e controlado para o não
comprometimento das comunidades situadas a montante do rio cuja sobrevivência
dependia do fluxo normal da água do Xingu.
Reportagens
dão conta que comunidades inteiras como os povos Juruna estão vivendo em condições
quase subumanas em decorrência da redução drástica de pescado, uma de suas
principais fontes de subsistência. Alegam que os administradores da barragem
não estão cumprindo o que foi pré-estabelecido. E não para por aí. A Belo Monte
também é protagonista de outra tragédia que está matando de fome e pela violência
centenas, milhares de pessoas todos os anos.
Tais
acontecimentos trágicos fazem referência à cidade de Altamira, no Pará, que a
partir da hidrelétrica de Belo Monte viu crescer sua população em números
alarmantes. A maioria da população ou foram expulsas de suas terras
pressionadas pela barragem ou migraram de outras regiões atraídas pela promessa
de emprego. A cidade de Altamira é atualmente considerada uma das mais
violentas do Brasil. Na região da Amazônia já é considerada a mais violenta.
Há
poucos dias os/as brasileiros/as ficaram estáticos frente a televisão acompanhando
os horrores em Altamira, quando 62 pessoas foram brutalmente assassinadas por
gangs rivais no interior do principal presídio do município. A tragédia em
Altamira só perdeu para o massacre do Carandiru, RJ, onde morreram mais de duas
centenas de pessoas assassinadas pela polícia.
Todo
o problema na região tem relação direta e indireta com as políticas equivocadas
dos governos anteriores, alucinados pelo “vírus” do nefasto do desenvolvimentismo,
que tão mal proporcionou à sociedade, a exemplo do regime militar. Altamira é
um reflexo desse equivoco político. O que é gritante é saber que ninguém mais
ousa trazer para o debate Belo Monte, como de outras barragens construídas
equivocadamente na região. Nem o atual governo fez ou faz qualquer menção ao
fato, pois os projetos muito lhe interessam.
Na
realidade esses projetos se encaixam ao seu programa neo-desenvolvimentista,
porém mais sórdido ainda que dos governos anteriores. A expansão da fronteira
agrícola não é o principal problema enfrentado pelas populações indígenas na
Amazônia. O apoio incondicional à prática da mineração na Amazônia pode
acelerar a tragédia ambiental e humana na mesma proporção das barragens. Populações
inteiras, indígenas, ribeirinhas, que dependia diretamente do rio Xingu para
sua sobrevivência, poderão sucumbir.
O
restabelecimento da mineração em Serra Pelada, no estado do Pará, poderá
resultar no crescimento desordenado do fluxo migratório para a região, com
impactos ambientais e sociais dramáticos a exemplo do município de Altamira. Do
mesmo modo que a Belo Monte é responsabilizada por um etnocídio em toda a
região abrangida pela hidrelétrica, a mineração na serra pelada poderá ser
responsabilizada no futuro por outro genocídio, de proporção gigantesca.
Antes
da instalação da hidrelétrica Belo Monte, a população de Altamira beirava os 80
mil habitantes. Mesmo com as dificuldades de uma região pouco assistida pelo
Estado, a população encontra saídas para sobreviver. Em 2019, a população da
cidade já alcançava os 111 mil habitantes. Com pouca infraestrutura e emprego,
a violência e os homicídios tornaram-se freqüentes. Em termos comparativos, o município
do Rio de Janeiro as cifras de homicídio chegam a 35,6 mortes por cem mil.
Altamira, o número de homicídios por cem mil habitantes atingiu os assustadores
133,7 mortes. É bom frisar que a população na qual inchou o município de
Altamira são os retirantes das áreas ocupadas pela represa.
É
importante também frisar que jamais o governo federal, durante a gestão Rousseff,
jamais deveria ter permitido a funcionamento da hidrelétrica de Belo Monte sem
que os responsáveis da obra tivessem comprido com as ações mitigatórias. A
construção de um complexo penitenciário em Vitória do Xingu, a quarenta e oito
quilômetros de Altamira, era uma dessas obrigações da empresa. Não cumpriu.
Para
a execução desse elefante Branco no coração da Amazônia somente foi possível
graças a um bem sucedido plano macabro de suspensão da lei para a concretização
da obra. O custo da Belo Monte solapou dos cofres públicos cerca de quarenta
bilhões de reais. A corrupção e um plano estratégico para silenciar indígenas fizeram
parte desse plano.
Prof.
Jairo Cezar
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