A inexistência de políticas
públicas em âmbito federal e municipal para o esporte
Na
curta trajetória histórica da humanidade o esperte sempre assumiu um papel
determinante na integração dos diferentes grupos sociais como também na
reaproximação de sociedades separadas por guerras. Troca de experiências, integração social e
principalmente qualidade de vida são alguns dos benefícios oferecidos pela
prática esportiva, que não é privilégio apenas de atletas bem nutridos, e sim
um hábito a ser cultivado por todos a partir da infância. Durante o final
século XIX e começo do XX, o esporte assumiu uma função política de caráter
doutrinário como no Brasil. A construção de escolas públicas com programas e
metodologias seguiam critérios rigorosamente pensado pelo Estado atendendo os
preceitos republicanos. Entre as áreas de ensino oferecidas, a educação física era
prioridade. Era por meio do esperte que se promoveria o espírito patriótico, de
amor à pátria, às cores da bandeira, ao hino nacional, etc. Em muitos casos o
culto exacerbado ao corpo resultava no segregacionismo, a uma concepção tosca
de superioridade racial. Os jogos Olímpicos
de Berlin, em 1936, tiveram esse papel, um evento patrocinado por um governo nacionalista
para promover a “raça ariana”, e a inferioridade das demais.
A
guerra fria se transformou em divisor de águas entre dois mundos, o capitalista
e o socialista, tendo o esporte se transformado em instrumento de guerra
ideológica, uma espécie de pêndulo cujos movimentos sincronizados penderiam tanto
mais para o lado ocidental (EUA) como para o lado oriental (Rússia). Com a chegada
da televisão, o dinheiro passou a comandar o esporte, jogos olimpíadas e copas
do mundo, se transformariam em espetáculos atraindo milhões de pessoas à frente
da teve, consumindo imagens e produtos supérfluos. O futebol é um desses
espetáculos capaz de despertar sentimentos e emoções profundas e a televisão
tira enorme proveito acumulando fortunas na transmissão dos jogos. Estádios com
grande simbologia como o Maracanã são transformados em arenas, semelhantes às arenas
romanas onde o publico acompanhava às lutas entre gladiadores. Na época, já que
o povo não tinha pão, tinhas os espetáculos, e hoje, o povo continua não tendo
pão, porém tem a televisão, que transmite os espetáculos entre onze gladiadores
de cada lado.
Com
a transformação do futebol em negócio, as principais competições futebolísticas
são também realizadas nos países periféricos, uma estratégia do capital para
aproveitar o nicho de crescimento econômico. A ideologia propalada pela FIFA sobre
a democratização de eventos esportivos é para tentar convencer a opinião
pública de que tais eventos promoverão o crescimento econômico e a melhoria das
condições de vida da população. Esse argumento resultou em críticas acirradas
contra a entidade, pois os fatos comprovam o contrário. O México, pais
subdesenvolvido que já sediou duas copas e uma olimpíada, continua a população mergulhada
na miséria. Seguindo o exemplo mexicano, a Grécia em 2004 e a China em 2008, uma
centena aproximada de pessoas foram beneficiadas com tais eventos. O caso da Grécia
é mais contundente, acredita-se que um dos motivos de estar o país hoje mergulhado
em uma das suas piores crises da história, foram os gastos exorbitantes para a
realização dos jogos. Para pagar a conta o governo sancionou políticas de
austeridade fiscal, arrochando salários, privatizando empresas públicas,
aumentando os preços de serviços e de alimentos, entre outros. A China, muitas
das obras construídas como o estádio olímpico denominado “ninho do pássaro”, há
anos não é ocupado por eventos.
A
África do sul, muitos dos estádios construídos para a copa do mundo de 2010
permanecem ociosos ou quando é utilizados sua ocupação é mínima. Há informações
de que o estádio construído na Cidade do Cabo poderá ser demolido, devido as
dificuldades para garantir sua manutenção. Os exemplos negativos advindos da
realização desses mega eventos não seriam suficientes para alertar as
autoridades brasileiras de que a realização da Copa do Mundo no Brasil, em
2014, e as Olimpíadas, em 2016, resultarão em dívidas impagáveis cujo povo será
mais uma vez sacrificado? Acreditava-se que com a ascensão de governos
populares o Brasil entraria numa fase de prosperidade onde gargalos históricos
como os da área esportiva receberiam atenção especial. É consenso de todos que
investimentos pesados na ampliação de espaços públicos destinados ao lazer e as
práticas esportivas nos bairros, como também o engajamento da sociedade, muitos
dos problemas que hoje assombram as autoridades brasileiras relacionadas à
violência e ao consumo de drogas, poderiam ser amenizadas o solucionadas.
Não
é exatamente isso que vem acontecendo. É visível o desinteresse dos governos
federal, estadual e municipal no desenvolvimento de políticas públicas capaz de
construir uma nova cultura baseada na sensibilização, e o esporte poderia ser o
instrumento motivador. As escolas públicas deveriam manter-se abertas à população
oferecendo nos finais de semana atividades recreativas e esportivas. O que se vê
são ambientes sucateados com quadras esportivas, quando existem, não oferecendo
as mínimas condições para uso. É com essas condições que o Brasil sediará, em
2016, os jogos Olímpicos!! Certamente os governos farão de tudo para impedir
que imagens expondo o cotidiano de nossos bairros e escolas sejam divulgadas
para o mundo.
Embora
o futebol seja hoje umas das modalidades esportivas praticadas por quase todas as nações, o culto exacerbado a essa
modalidade, a paixão doentia por certa equipe ou atleta, não ocorre por acaso.
Tudo isso é criteriosamente pensado por quem detém do poder da mídia televisiva.
Atualmente não é tão interessante para o capital a presença do torcedor no estádio
e assistir seu time preferido, ficar em casa a frente da televisão torna-se mais
rentável para o capital, pois vinculada a imagem projetada da competição
esportiva estão os produtos supérfluos, o marketing. Quem realmente fatura com
toda essa engrenagem são poderosas empresas de entretenimento dentre elas a
Rede Globo, que consegue persuadir governos na tomada de decisões que venham a
beneficiar.
As
contradições socioeconômicas dificilmente serão solucionadas com mega eventos
bilionários. Não há coerência investir bilhões de reais na construção de obras
como as arenas de Manaus, Cuiabá e Natal, que comportarão, individualmente, um
público superior a cinqüenta mil expectadores. São estados que sediarão jogos
da copa, porém sem grande tradição, pois suas equipes possuem pouca
expressividade nacional. Para ilustrar o tamanho do absurdo, durante o ano de
2011, no estado do Amazonas, a quantidade de público que pagaram ingressos para
assistir os jogos foi insuficiente para ocupar a metade das cadeiras da arena
que sendo construída. A construção das arenas e de toda infraestrutura envolta
do local, além das suspeitas de irregularidades nos contratos de licenças
ambientais, ambas vem promovendo profunda alteração na geografia local com a
remoção de milhares de indivíduos para a construção de shoppings, estradas,
viadutos, etc. Fato parecido aconteceu na África do Sul, com a transferência de
pessoas de uma área a ser ocupada por obras da copa para a “cidades de latas”,
ou containeres, permanecendo confinadas até o momento.
Esse
é um caso típico do Rio de Janeiro, cidade que sediará o final da copa do mundo
e palco das próximas olimpíadas. Uma força tarefa envolvendo governo federal e
estadual resultou na ocupação dos morros pela polícia cuja justificativa
utilizada foi a reconquista pelo Estado das áreas dominadas pelo narcotráfico,
com a instalação das UPPS (Unidades de Polícia Pacificadora). Esse processo de
pacificação corroborou com a valorização repentina dos terrenos e imóveis. Empresas
do setor imobiliário disputam espaços vazios onde antes eram ocupados por
campinhos de futebol. É Estado dominando os morros ditando novas regras de
comportamento e de consumo.
Seguindo
o exemplo da esfera federal, a administração do município de Araranguá
apresenta indícios de que na área do esporte não há muito que esperar. O que se
constata, acredito que muitos irão concordar que o tema esporte só se resume em
futebol amador. Onde estão as demais modalidades como basquete, handebol, vôlei,
atletismo, etc. O que deveria ter ocorrido, no momento da posse, era a
articulação de um grande debate envolvendo profissionais do esporte, antigos
atletas e as demais secretarias: educação, cultura, bem estar, entre outras,
para discutir o esporte no município e definir estratégias de curto, médio e
longo prazo. Historicamente, as administrações que se sucederam jamais
dedicaram atenção especial ao esporte como atividade integrada ao
desenvolvimento pleno do indivíduo. Muito do que foi realizado município e que revelou
atletas de destaques em âmbito estadual, nacional e internacional, foi graças a
insistência e o empenho voluntário de profissionais da educação física e demais
pessoas apaixonadas pelo esporte.
O
município de Araranguá, com uma população aproximada de setenta mil habitantes
possui apenas um precário ginásio para competições esportivas. Os bairros são
desprovidos de qualquer infraestrutura que oportunize as crianças, jovens e
adultos à prática esportiva saudável. Os únicos espaços ainda disponíveis
embora precários são as quadras ou ginásios das escolas estaduais e municipais.
Porém, sua utilização somente ocorre durante o horário das aulas, fora desse
período, especialmente nos finais de semana, esses ambientes mantém-se fechados
ao público. O que farão as crianças se nos seus bairros não há ambientes
adequados e protegidos para o desenvolvimento das brincadeiras e jogos.
Certamente ficarão em casa a frente da televisão, do computador ou perambulando
pelas ruas e vindo a se transformar e prezas fáceis de traficantes. Já é
comprovado que municípios que investiram pesadamente em educação, cultura e
esportes tiveram seus índices de violência reduzidos significativamente.
O
que esperar de um município como Araranguá, com cento e trinta e dois anos de
emancipação política e uma população aproximada de 70 mil, onde não tem ainda um
projeto político para o esporte, que muitos atletas que se destacam, para
participarem de competições, são compelidos a mendigarem ajuda ou promoverem
rifas, bingos e outras ações para poderem arcar com os custos de viagens ou
estadias. É comum casos como a de uma atleta do Judô, primeira no ranque
catarinense na categoria infanto-juvenil, de ter que competir pelo município de
Criciúma, pois a cidade na qual a mesma vive e estuda, não demonstrou
interesse. Além desse exemplo, outros poderiam ser mensurados, e que tiveram o
mesmo caminho da atleta judoca.
É
importante ressaltar que a prioridade agora não é investir milhões de reais na
construção de um centro esportivo polivalente como está sendo cogitado e que
certamente privilegiará poucas pessoas. É necessário concentrar esforços e
recursos na construção e recuperação de áreas esportivas nos bairros e no
interior do município que estão abandonadas, depredadas e invadidas pelo mato.
É possível, se houver interesse da administração municipal, aproveitar os
espaços das unidades de ensino, mantendo-as disponíveis à população nos finais
de semana, para usufruir das quadras esportivas e dos ginásios. Deve-se destacar
a importância da presença de monitores, profissionais da educação física, para
coordenar tais trabalhos.
Na década de 1990, em uma das campanhas eleitorais do partido dos trabalhadores, uma experiência de campanha foi colocada em prática sendo bem assimilada pela população que foi a Rua do Lazer. Porém hoje caiu no esquecimento de muitos dos atuais membros do partido que estão no governo, que na época tiveram participação na experiência. A ideia foi concretizada não apenas para impressionar a população e conquistar o voto, mas para mostrar que era possível governar diferente, que uma sociedade só constrói plenamente quando seus governantes priorizarem às crianças oferecendo-as educação de qualidade e lazer saudável. Foi isso que se fez naquele momento quando dezenas de simpatizantes e idealistas, voluntariamente, promoviam nos bairros atividades recreativas com ampla participação das crianças e da população adulta.
Era
um momento de integração social e ao mesmo tempo de oportunizar as pessoas a
vivenciarem algumas brincadeiras que hoje quase estão esquecidas ou não são
mais praticadas pelas crianças como perna de pau, dominó gigante, boliche com
bolas de meia, pinturas, corridas do saco, ovo, salto em altura, pular corda, busca
do tesouro, brinquedos cantados, bambolê, basquete de rua, cabo de guerra,
derrubando a casinha, entre outros. Cabe lembrar que projeto como este além de
ser extremamente importante tanto para integração e o desenvolvimento pleno do
indivíduo, é de baixo custo financeiro. Pois, se for envolvida as escolas,
muitos desses brinquedos podem ser construídos com materiais reciclados,
desenvolvendo na criança consciência de sustentabilidade, condição essa que a
atual administração procura incutir no município.
Prof.
Jairo Cezar
Nenhum comentário:
Postar um comentário