PLANO DE CONSTRUÇÃO DE ETA (ESTAÇÃO
DE TRATAMENTO DE ÁGUA) NA LAGOA DO
CAVERÁ ABRE OUTRA VEZ DEBATE SOBRE SUA PRESERVAÇÃO
Não
é segredo para ninguém que o complexo lagunar do extremo sul de Santa Catarina
(Rio Mampituba) formado pelas Lagoas do Caverá e do Sombrio sofrem a décadas
processo de degradação que pode resultar na sua extinção muito mais rápida do
que se imagina. São incalculáveis as investidas da sociedade civil, das
autoridades locais/ regionais e do próprio Estado nas tentativas de solucionar
os problemas, porém, todas infrutíferas. No momento penso ser difícil afirmar
se a gravidade se recai mais no manancial do Sombrio ou do Caverá, pois ambas
estão agonizando.
A
realidade é que muita gente, muitos políticos locais e da região obtiveram êxitos políticos eleitorais significativos ao
legislativo, executivo e outros postos relevantes, a partir de promessas não cumpridas de que intercederiam no
salvamento das lagoas. A integração dos afluentes da bacia do Rio Mampituba,
lado catarinense, ao Comitê Hidrográfico da Bacia do rio Araranguá abriu
expectativa positiva para uma solução plausível desse complexo lagunar cuja foz
é o rio Mampituba.
Em
2014 foi constituída uma comissão junto ao comitê hidrográfico de Ararangua
para atuar com exclusividade nas tratativas dessa complexa questão. O fato
importante ocorrido na época foi a realização de uma audiência pública no salão
de festas da igreja matriz no Sombrio,
que teve a presença da presidente da Comissão do Meio Ambiente na ALESC, a
deputada Paula de Lima. Além da parlamentar, inúmeras autoridades representativas
do judiciário, dos legislativos e executivos municipais, membros de ONG, OSCIP
e demais cidadãos debateram por longas horas caminhos possíveis ao salvamento
dos mananciais.
No
final da audiência foi acordada proposta de que fosse agendada reunião com os
gestores públicos dos sete municípios que compõem esse complexo lagunar. A
partir dessa reunião seria agendada, no ano seguinte, 2015, audiência com representantes do governo
estadual, em Florianópolis, cuja intenção era pressionar o executivo na criação
de uma unidade de conservação envolvendo os três mananciais: Lagoa da Serra,
Lagoa do Caverá e Lagoa do Sombrio. Até hoje essas deliberações jamais se
concretizaram.
O
fato é que o problema da lagoa do caverá, considerada a mais sensível por estar
dia após dia reduzindo de tamanho devido a perdas significativas de água,
poderia já estar solucionado se fosse construído vertedouro de cerca de
cinquenta metros de comprimento e próximo a de dois metros de altura. Esse sistema,
depois de construído, iria repor o nível normal da mesma, passando dos atuais
70 a 80 cm para 2 m ou mais de profundidade. A dúvida que permeia o imaginário
da sociedade é por que tanto descaso, tanta resistência em solucionar um problema, de certo modo simples,
que seria a construção de um simples desaguadouro.
Um
robusto estudo já foi realizado com custo orçado em quase um milhão de reais. O
documento especificava todas as condutas necessárias para o salvamento da
lagoa. Acreditava-se na época que existem
muitos interesses escusos envolvendo o não salvamento desse manancial e da
Lagoa do Sombrio. Fazendas de gado, campos de arroz irrigado, empresas de
extração de turfa e areia, todas situadas as margens desses mananciais vinham
se beneficiando com o encolhimento dos mesmos.
O
agravamento dos inconvenientes envolvendo a lagoa do caverá se intensificou
ainda mais a partir da retificação do córrego ou canal que faz conexão com a
lagoa do Sombrio. Os cidadãos mais antigos vão concordar que no passado essa
sanga era toda serpenteada e cujo fluxo da água corria lentamente pelo seu
leito. A partir do alinhamento do canal, mesmo em períodos chuvosos, a água
tende a escorrer rapidamente. Não faz muito tempo a Lagoa do Caverá havia
adquirido o título honroso de ser um dos maiores mananciais de água doce do
estado de Santa Catarina. O que causa espanto é a passividade da sociedade e a
negligência das autoridades no salvamento da mesma. Essa lagoa não se credencia
apenas por possuir água de excelente qualidade e fonte de reserva para o
futuro, no seu leito dezenas de espécies de pescados e crustáceos as utilizam
como berçários para se reproduzirem.
A
elaboração de um plano para a produção de pescados e crustáceos em cativeiro,
sempre debatido em encontros passados, poderia revolucionar a região nesse
segmento. Sem contar o turismo sustentável, que poderia também fazer parte dos
debates, integrando essa região ao Geoparque Caminho dos Cânions. Mas tudo isso
está longe de virar realidade. O fato é que estão asfixiando, matando a galinha dos ovos de ouro. Desde
2013, por estar envolvido diretamente no salvamento do complexo lagunar,
representando o comitê da Bacia do Rio Araranguá, produzi alguns textos
discorrendo a situação calamitosa de todo o complexo sistema hídrico. São sete
produções, disponíveis no Blog morrodosconventos-jairo.blogspot.com,
que estão acessíveis aos interessados.[1][2][3][4][5][6][7]
No
final do mês de agosto em entrevista concedida em uma radio do município de Araranguá, um
representante do SAMAE e da FAMA falaram da proposta de instalação de uma ETA (Estação de Tratamento de Água) no manancial
lagoa do caverá. Fiquei um tanto apreensivo com a proposição pois achei
estranho que depois de quase duas décadas de lutas infrutíferas para o
salvamento da mesma, de repente, como um passe de mágica, alguém fosse lá e
instalasse os equipamentos para captação da água e pronto, sem resolver primeiro
as demandas ambientais.
Percebi,
na entrevista, que ambos possuíam pouca informação consistente do histórico de lutas envolvendo as mesmas.
Disseram que já tem o terreno para a construção da estação, e que aguardam
outras licenças vindas o IMA (Instituto do Meio Ambiente). Disseram que a
tramitação de alguns procedimentos no órgão ambiental estadual foi bem rápido e
que ficaram até surpreendidos com tal agilidade. Falaram na necessidade de realizar estudos mais
complexos, bem como da construção de um barramento. Na realidade não é um
barramento que se pretende construir e sim um vertedouro. Esse termo, barramento,
foi sempre um dos fatores impeditivos no salvamento da lagoa há mais tempo,
pois os órgãos ambientais, na época a FATMA, recomendavam que fosse realizado
um EIA-RIMA, que era desnecessário. Também
disseram os entrevistados que o município de Araranguá não deveria se
responsabilizar sozinho com tais demandas da lagoa.
Foram
falas confusas, dissonantes, bem ao estilo de pessoas pouco conhecedoras
daquela realidade. O fato é que nenhum projeto estruturante dever ser executado
nessa lagoa sem que demandas emergentes sejam executadas, uma delas seria a
criação da unidade de conservação, principal proposição tirada em reuniões e
audiências passadas. Claro, a construção do vertedouro também está inserido no
escopo dessas demandas.
Como
venho fazendo durante anos, no último dia sete de setembro estive outra vez na
lagoa do caverá conferindo de perto a situação da mesma. Por ter chovido
bastante nos últimos dias o volume de água do manancial se elevou
sensivelmente. Porém se sabia que essa elevação era paliativa, pois em menos de
uma semana voltaria ao leito normal e com redução gradativa. Um grupo de
esportistas, praticantes do SkySurf estavam deslizando sobre suas águas naquele
momento, aproveitando o forte vento nordestão naquele dia. Mais uma atividade
que poderia ser incentivado para dinamizar a economia da região.
Conversando
com uma relevante liderança da comunidade que atua em defesa do complexo
lagunar, o mesmo revelou que se mostra um tanto otimista depois de saber que o
município de Araranguá irá instalar uma ETA naquele manancial. Disse que ouviu
dos representantes do poder público que antes da instalação dos equipamentos
serão executados planos de recuperação da lagoa, que culminará com a instalação
do vertedouro.
Pouca
gente sabe que a lagoa da serra e do caverá não se conectam, mesmo existindo
um canal que divide os municípios
de Araranguá e Arroio do Silva na extremidade oeste. Toda a água acumulada no
leito da lagoa do caverá escorre de inúmeras nascentes existentes no seu
entorno. Portanto, a preservação do manancial não passa apenas por ações intrínsecas
em seu leito, devendo sim extrapolar, incluindo na lista todas as nascentes, das
quais estão seriamente ameaças pela monocultura agrícola, pecuária, mineração
predatória e, sobretudo, pelo avanço demográfico vertiginoso.
Prof.
Jairo Cesa
Nenhum comentário:
Postar um comentário