NEM
MESMO O SAGRADO INTERVALO PARA AS REFEIÇÕES FICOU IMUNE AOS ATAQUES DA REFORMA
TRABALHISTA BRASILEIRA
É de
se prever que muitos dos que estão lendo esse texto nesse momento devam ter
assistindo algumas vezes a célebre comédia Tempos Modernos protagonizado por
Charles Chaplin que interpretou Carlitos. No filme há uma cena hilária em que
os funcionários da companhia testam com o próprio Carlitos, funcionário da
empresa, uma máquina que lhe permite trabalhar mesmo durante as refeições. Mas
o equipamento apresentou falhas frustrando seus inventores.
A mensagem do filme, cujo roteiro foi escrito
pelo próprio protagonista Chaplin, foi revelar ao mundo moderno as
transformações tecnológicas em curso e seus reflexos na estruturação e no relacionamento
entre capital e trabalho. Quase cem anos
depois do seu lançamento em 1936, o filme ainda se mestra extremamente atual, fazendo
refletir o cotidiano das atuais organizações produtivas liberais, a mentalidade
dos proprietários e dos governos, abertamente insensíveis ao trabalho humano.
Em
se tratando de Brasil tais insensibilidades estão mais expostas nas reformas
que estão em curso, algumas já encaminhadas como a PEC dos gastos públicos, lei
da terceirização e trabalhista, e a previdenciárias, ainda em estado de
incubação. Quanto a reforma trabalhista, observando os mais de cem pontos
alterados na CLT, é de se concluir que a mesma golpeou uma legislação com quase
cem anos de existência. Não há dúvida de que a legislação teria que passar por
alguns ajustes, porém, não do modo como foi articulado, que segundo os seus reformadores,
proclamando um discurso quase consensual, afirmavam categoricamente que tornou-se
mais moderna, flexível, compatível à atual realidade do sistema produtivo.
É
claro que as opiniões dos parlamentares e dos demais setores favoráveis a
reforma seriam interpretadas como de uma grande vitória. Mas vitória de quem? Não
há dúvida que é do empresariado ganancioso, explorador, que conseguiu se
libertar das ditas “agruras” de uma legislação que bem ou mal assegurava aos
trabalhadores certos direitos elementares que agora foram solapados. Com a
reforma, o Estado tem a sua participação limitada, ou seja, estado mínimo para
mediar os impasses envolvendo trabalhadores e patrões. Quase tudo poderá ser
negociado agora. Já podemos imaginar seus resultados, pouquíssimos favoráveis aos
trabalhadores.
O
negociado se sobreporá ao legislado. Ou seja, o que valerá será o que os
sindicatos das categorias negociarem com os proprietários das empresas. Imagine,
hipoteticamente, nos finais de semana, trabalhadores, dirigentes sindicais,
diretores ou proprietários de empresas, se reunindo para uma partida de futebol
ou encontros de confraternização. São
esses “iguais” que anualmente ou durante as datas bases, se sentarão à mesa
para negociar reajustes salariais ou outros direitos. Se o respectivo dirigente
sindical tiver uma relação um tanto quanto familiar com os diretores da
empresa, como ficarão as negociações? Prevalecerá a imparcialidade, a isonomia
no momento de negociar.
Dentre as aberrações vistas na nova redação e
que serviu de inspiração para o título do artigo, está o item que trata do
intervalo mínimo diário que o/a trabalhador/a ter direito para descansar ou
fazer suas refeições, que poderá ser inferior a 30 minutos caso seja negociado
em convenção coletiva. Antes da aprovação da lei, esse tempo era de uma hora. Veja
só, numa sociedade como a brasileira, na qual a atual crise vem minando dia
após dia milhares de postos de trabalho é quase que óbvio que em qualquer
convenção coletiva, o trabalhador pouco poder terá para fazer aprovar os
percentuais de reajustes que tem direito. Ou acatam a proposta/sem proposta ou
pedem as contas, pois lá fora há um enorme exército de desempregados esperando a
vaga. Não é assim que acontece?
Pois
é assim mesmo que o texto da legislação tende a se configurar, extremamente
pertinente ou favorável ao seguimento mais forte, o empresariado. Dos 473 deputados
presentes no dia 27 de abril de 2017 na sessão da câmara dos deputados para a
votação da reforma trabalhista, votaram a favor da mesma 296 parlamentares,
sendo que 177 se posicionaram contrários. Num texto visivelmente rentista ao
capital como foi confirmado a partir de sua análise, é de se concluir que os parlamentares
que referendaram os 120 itens alterados da CLT são empresários ou representam
vários seguimentos econômicos congêneres. Além do mais, esses mesmos protegidos
pelo Estado, foram avalizados por milhões de trabalhadores, ludibriados no
período eleitoral por discursos e promessas vazias de que legislariam pelo povo
e para o povo.
Com
a vitória do governo na câmara, o documento dificilmente sofreria alterações
expressivas ou quem sabe a inclusão de emendas no senado favoráveis aos
trabalhadores. O próprio presidente da casa já tinha sido enfático no seu
discurso afirmando que o texto vindo da câmara não sofreria modificações. Numa
democracia verdadeira, esse tipo de discurso se caracterizaria como uma
aberração aos princípios da isonomia de poderes. Nada foi alterado no texto. Isso
porque no próprio senado, majoritariamente os parlamentares estavam articulados
com o governo, afinados num mesmo discurso de que “as reformas colocariam o Brasil
nos trilhos”. Dito e feito, no dia 11 de julho de 2017, por 50 votos a favor e
26 contrários, a CLT enfim estava alterada. Os trabalhadores, portanto, a
partir dessa data começariam o longo calvário de submissão aos ditames do
capital.
Para
avalizar tais observações feitas acima e evitar possíveis críticas desnecessárias
ao autor do texto, acusando-o de leviano e antipatriótico, aí vai outros pontos
do documento aprovado que reafirma a posição de que a reforma coloca sim a
população trabalhadora na ponta do precipício.
A jornada de trabalho de 12 horas diárias por 36 horas de descanso para
todas as categorias e insalubridade, tornar-se-á regra a partir de decisões
coletivas, ou seja, sobre a jornada de trabalho, perde poder de lei o que
estava até o momento descrito na CLT, onde estabelecia extensão de horas apenas
para categorias muito específicas.
O
item da reforma relativo às gestantes se constitui também outra aberração
aprovada pelos congressistas, que permite as trabalhadoras atuarem em ambientes
insalubres a partir da apresentação de atestado médico comprovando que o local
não oferece riscos às mesmas. É tão insana essa proposta que o próprio
presidente, veja só, o próprio presidente Temer, informou que vedará, admitindo
que somente será permitido de forma “excepcional” e com atestado médico. O que
seria excepcional e quem seriam os profissionais indicados para inspecionar os
locais considerados ou não insalubres?
Quanto
ao crime de dano moral, a lei agora permite que na hipótese de a justiça assegurar
ganho de causa ao trabalhador prejudicado, sua indenização variará de acordo
com o salário recebido. Se esmagadora parcela dos trabalhadores é assalariada e
reféns ao empregador, é de se prever que “engolirão sapos e lagartos” na
empresa ou em outro espaço de trabalho para permanecer no emprego. Não é mesmo?
É outro ponto que o governo diz que irá rever, pois admite que a lei limita o
trabalhador do direito de uma indenização mais consistente em casos de estrito
abuso de sua moral.
Enfim
estamos às voltas com um dos maiores retrocessos do ainda embrionário Estado
republicano brasileiro. É preciso repensar o atual modelo de governo e toda sua
estrutura, o legislativo, executivo e o judiciário, nas diferentes instâncias, que
vem mostrando, dia após dia, que se servem do povo para extrair do próprio povo
o sangue, o suor e as lagrimas necessárias para fazer funcionar as engrenagens
de uma máquina viciada pelo cinismo, corrupção e falta de ética.
E os
exemplos são quase que imensuráveis.
Basta assistir diariamente os telejornais e esperar a divulgação dos
novos denunciados por corrupção passiva, recebimento de propina, etc. Até mesmo
o presidente da republica não ficou imune ao “vírus contagioso” da roubalheira
brasileira. É importante saber que somente o voto ou pleito eleitoral não
resolverá o problema da crise política e econômica brasileira. É necessária a
construção de um plano alternativo de governo popular, que restabeleça a
confiança do povo com a política e com os seus representantes.
Prof.
Jairo Cezar
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