FALTA
DE CHUVA JÁ PROVOCA CONFLITOS PELO USO DA ÁGUA EM VÁRIOS MUNICÍPIOS DA BACIA DO RIO ARARANGUÁ
A
cada ano o clima vem apresentando sinais de que é urgente repensar os modelos
de produção e de consumo no planeta. As primeiras ações com intuito de
sensibilizar as autoridades e os seguimentos produtivos globais em rever suas
políticas ocorreram nas últimas décadas do século XX através de encontros
sistemáticos de centenas de países, onde referendaram acordos e protocolos com
vistas a cumprir metas de redução da emissão de gases poluentes responsáveis
pelo efeito estufa.
Estiagens
prolongadas, inundações e outros eventos climáticos extremos como furações e
tornados passaram a fazer parte do cotidiano de regiões como do extremo sul de
santa Catarina, cuja população sempre se vangloriou por acreditar que a estivesse
imune a tais instabilidades. Ainda hoje é comum encontrar pessoas que
consideram as afirmações dos meteorologistas e demais estudiosos do clima como absurda
quando reiteram que o aquecimento global já é uma realidade, que seus efeitos
poderão ser muito mais agressivos se medidas corretivas não forem tomadas urgentemente.
Entre
2010 e 2011 a região que integra a bacia do rio Araranguá, bem como todo o
estado catarinense, sofreu uma das maiores estiagens dos últimos cinqüenta anos.
O impacto da falta de chuva atingiu além dos seguimentos produtivos,
agricultura, indústria, pecuária, também o abastecimento humano, com poços,
mananciais e barragens que tiveram seus volumes reduzidos em proporções críticas.
É de se presumir que muitos devem ter ouvido, lido ou até mesmo aprendido na
escola, entre as décadas de 1980 e 1990, que o próximo grande conflito mundial,
não seria por disputas por poços de petróleo, nem por ouro ou outros minerais
metálicos, mas sim por mananciais ou aquíferos.
Alguém
poderia imaginar que a bacia do rio Araranguá, cuja precipitação média anual de
chuva chega a quase 2000 mm, viesse um dia ter escassez de água e tornar-se
palco de inúmeros conflitos entre os usuários? Pois isso aconteceu pela
primeira vez em 2011 quando se confrontaram empresa do setor agroindustrial e grupo
de agricultores, ambos da região de Forquilhinha. Para contornar o impasse, o
Comitê da Bacia do Rio Araranguá teve atuação decisiva negociando com os
seguimentos litigantes estratégias que contornaram a crise.
Embora
os níveis das chuvas e dos rios tenham se restabelecidos anos depois, as
estiagens do biênio 2010 e 2011 serviriam de alerta às autoridades, ao comitê e
a própria sociedade de que o micro clima na região estava dando mostras das
suas mudanças e que era necessário o Comitê desenvolver um plano de uso eficiente
dos recursos hídricos da bacia do rio Araranguá. Foram necessários dois anos, 2014 a 2015,
para que o plano que atenderá 16 municípios ficasse pronto. O programa conta
com seis metas e 33 ações estratégicas, sendo que 12 dessas estratégias se
constituem como prioritárias e devem ser executadas nos próximos cinco anos.
Como
prioridade das prioridades, duas das estratégias elencadas já deveriam estar sendo
executadas, pois suas aplicações poderiam conter conflitos que outra vez põem
em lados opostos setores usuários de água, são elas: a realização de estudos
sobre limites de exploração de minerais em calhas dos rios da região; programas
para a preservação das matas nativas e das nascentes da bacia e incentivar
programas de manutenção e recuperação da mata ciliar. O fato é que depois da
conclusão do plano e da entrega do documento aos conselheiros e demais
entidades envolvidas na construção do plano, o conselho executor do comitê
enfrenta a escassez de recursos que pode colocar por terra todo o empenho,
esforço, tempo dedicados no projeto.
No
dia 27 de julho de 2017, durante a Assembléia Geral do Comitê da Bacia do Rio
Araranguá, um dos primeiros assuntos da pauta apresentado pelo presidente do
comitê foi a leitura de vários ofícios e abaixo assinados encaminhados por
associações de agricultores e demais setores solicitando apoio da entidade para
mediar conflitos envolvendo disputas por água na região. Tais conflitos são
decorrentes da nova estiagem que assola a região do extremo sul do estado,
considerada pelos meteorologistas tão ou mais agressiva que a registrada há
seis anos.
Os
impasses talvez não alcançaram proporções mais gigantescas pelo fato da
estiagem estar ocorrendo em um período do ano, meses de junho e julho,
considerada entressafra da rizicultura
de irrigação. A maioria dos abaixo assinados, porém, trata do mesmo problema,
ou seja, extração sem critério de seixos rolados (pedra de cachoeira) dos
leitos dos rios da região, como o rio Manoel Alves. Não é de hoje que os cursos
d’água da região vêm sendo solapados por esse tipo de atividade, com o próprio aval
dos órgãos ambientais.
Sem
critérios e muito menos fiscalização, os responsáveis pela exploração dos
seixos produzem danos irreversíveis nos leitos e margens dos rios. Há casos de
rios em que as máquinas chegam a escavar até 8 metros de profundidade produzindo
um violento rebaixamento dos lençóis freáticos. São as populações que residem
no entorno desses afluentes e subafluentes do rio Araranguá que mais sofrem,
pois as ponteiras e os poços artesianos que abastecem suas residências estão
secando literalmente. Está faltando água
até para beber, e se em 2011 o problema atingia um ou dois municípios, a atual
estiagem já ameaça o abastecimento dos municípios de Jacinto Machado,
Forquilhinha, Turvo, Morro Grande, Nova Veneza, etc.
Deve-se
considerar que o problema do rebaixamento do lençol freático e a falta de água
não é uma realidade somente das regiões onde estão se está extraído seixos.
Outros municípios da região, dentre eles Araranguá, a população vem sentindo gradativamente
a redução dos níveis de água dos poços e dos mananciais de abastecimento
público. E os motivos são as várias jazidas, tanto de extração de terra turfa
como de areia para construção civil. Comunidades como Manhoso, Sanga da Toca,
Ilhas, Sangradouro, entre outras, já são afetadas pela falta d’água. É preciso
intensificar a fiscalização por parte dos órgãos ambientais municipais e
estaduais, punindo as empresas que descumprem as legislações relativas à
extração mineral.
O
que mais causa indignação que a água que escorre pelos leitos dos afluentes da
bacia do rio Araranguá, como o rio Mãe Luzia, a mesma está imprópria para o
consumo devido a alta incidência de metais pesados provenientes do carvão
mineral. Os demais rios também sofrem impactos semelhantes com rejeitos
orgânicos, industriais, agrotóxicos, destruição da mata ciliar, entre outros. De
todos os municípios que integram a Bacia, Criciúma é o único que trata
parcialmente o esgoto produzido. Os demais, os resíduos orgânicos têm como um
dos destinos os rios.
Os
lençóis freáticos que abastecem atualmente milhares de famílias na região da
bacia, embora sendo a principal alternativa, mesmo com a atual estiagem,
apresenta alta incidência de metais pesados como manganês, mercúrio, alumínio,
etc. Esses elementos químicos causadores de inúmeras doenças degenerativas são
provenientes do uso indiscriminado de agrotóxicos e fertilizantes. Nos debates
que se sucederam durante a assembléia sobre a estiagem, várias proposições
foram elencadas, até mesmo a construção de cisternas nas propriedades rurais
para o armazenamento da água das chuvas como já ocorre em outras regiões do
estado. O que foi consenso entre os
presentes é a execução indiscutível do plano de recursos hídricos na sua
totalidade, que o documento não se transforme em material decorativo ou
propaganda política, como é comum em governos descomprometidos com a sociedade.
Prof.
Jairo Cezar
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