PARA ENTENDER A ABSURDA LEI
APROVADA NA CÂMARA DE VEREADORES QUE TRATA SOBRE A GESTÃO DAS PRAIAS URBANAS DO MUNICÍPIO DE
ARARANGUÁ
Há
poucos dias, em 02 de agosto de 2017, a câmara de vereadores de Araranguá
aprovou projeto de lei que trata sobre a Gestão das Praias Urbanas do Município,
atendendo a portaria 113, de 12 de julho de 2017, do Ministério do
Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. O que causa estranheza foi a rapidez na
tramitação do processo, sem que fosse ao menos discutido com o grupo do Comitê
Gestor do Projeto Orla, constituído por decreto do executivo municipal. É de admirar que muitos dos vereadores
reeleitos da atual gestão, que aprovaram a lei, talvez tenham participado de
uma ou duas reuniões, durante os quase três anos de reuniões e discussões sobre
o projeto orla no Balneário Morro dos Conventos.
Desde o começo dos encontros, os/as delegados/as
do projeto orla e o grupo gestor dedicaram horas, semanas, meses do seu tempo,
para construir um plano que fosse no mínimo condigno para o desenvolvimento
sustentável dos balneários, sem ameaçar o equilíbrio dos frágeis ecossistemas
locais. Quando se pensou que o texto final do projeto, quando adentrasse a
câmara de vereadores, os legisladores respeitassem a decisão da sociedade,
inserido as proposições no plano diretor sem qualquer alteração ou emenda, veio
a surpresa.
A poucas horas da sessão extraordinária na
câmara para a discussão e aprovação do plano diretor, contendo cláusulas
relativas ao projeto orla, saiu a informação de que algumas emendas aditivas de
última hora estavam sendo elaboradas para modificar pontos já aprovados em
assembléia do projeto orla. Como incluir emendas, sem antes discutir com os
integrantes do projeto Orla, que, voluntariamente, doaram longas horas do seu
tempo para em prol do município de Araranguá?
Para
muitos/as delegados/as do projeto orla, a atitude dos vereadores que mediaram
tais “manobras” de bastidores, soava como um golpe contra os princípios da
democracia. Todos que integraram o orla sabiam que embora o relatório
conclusivo do documento não tenha sido o desejado, foi o que se pode construir
depois de muitas negociações. O texto, por sua vez, estabelece planos de ações
de curto, médio e longo prazo, dentre os quais a gestão da própria orla, praia,
dos balneários.
Se
for realizada enquete na câmara de vereadores e perguntar aos vereadores
eleitos e reeleitos se ambos conhecem na integra os dispositivos elencados nas
oficinas e nas dezenas de reuniões e que estão inseridas no relatório do orla,
talvez um ou dois diriam que sim. Um ou
dois, talvez mais legisladores, devem saber que o projeto orla, mesmo concluído
os debates e as oficinas, deve seguir um rito em conformidade com as normas que
o rege. Dentre os itens obrigatórios está a formação do comitê gestor que atuará
na execução das metas e estratégias, de curto, médio e longo prazo, elaboradas.
Com
a aprovação na câmara do texto de adesão do município ao plano de gestão das
praias urbanas, conforme a portaria 113 do Ministério do Planejamento, o que
mais se ouviu falar no município nos dias seguintes à aprovação foi de que com
a proposta promoverá o desenvolvimento do balneário, com impulsão do turismo.
Quanta hipocrisia, desconhecimento desses que representam o povo de Araranguá.
Há quantos anos os balneários que integram o município, Ilhas, Morro Agudo,
Barra Velha e Morro dos Conventos, vem sofrendo o abandono das autoridades. É
só ir até o morro dos conventos e observar em loco a realidade. Quando em impostos
o município arrecada da comunidade e quanto é revertido em melhorias para o
balneário?
Ilhas
e Morro agudo, barra velha, são comunidades quase desconhecidos pela população.
Aprovado o projeto sobre a adesão da gestão das praias urbanas, inúmeras foram
as reportagens publicadas nos jornais de circulação do município, ambos
ressaltando o grande feito do legislativo e suas preocupações com o meio
ambiente, o turismo e o desenvolvimento das comunidades que integram a orla. No
entanto, o que causou mais estarrecimento foi uma entrevista ocorrida em uma
das rádios do município de Araranguá, onde o apresentador justificou as ações
dos órgãos federais, Tribunal Federal e MPF, que decidiram pelo bloqueio da
orla para o trânsito de veículos não oficiais, às constantes denúncias
encaminhadas àqueles órgãos.
A
priori, se não havia infração ou algum outro tipo de irregularidade, as
denúncias não teriam surtido nenhum efeito significativo. Não é mesmo? Se a 4ª Regional
do Tribunal de Justiça de Porto Alegre despachou liminar decretando o
fechamento definitivo da orla, isso não se deu de forma aleatória, extemporânea,
de ambas as instâncias. Também dizer que os integrantes dos respectivos órgãos
federais “ficam dentro dos seus escritórios, com ar condicionado, simplesmente
despachando, talvez nem saber onde fica a barra” é também um argumento pobre,
rasteiro e de certo modo calunioso do apresentador, que além de desconhecer os
fatos, afronta a honra de profissionais que atuam em defesa dos frágeis
ecossistemas costeiros.
Para
refrescar a memória do apresentador, desde 2012, o órgão federal, MPF, vem
insistentemente recomendando que o município tome providências para cuidar de
suas praias, coibirem os abusos na orla, dunas, restingas e ocupações
irregulares, muitas das quais com o consentimento do órgão ambiental municipal.
A primeira visita do Ministério Público Federal ao Balneário Morro dos
Conventos ocorreu em outubro de 2012, quando a procuradora da república, Drª
Rafaela, acompanhada pelo geólogo do órgão federal, MPE, FAMA, OSCIP
PRESERV’AÇÃO, IMPRENSA E MORADORES LOCAIS, realizaram inspeção em toda orla.
No instante da inspeção a procuradora determinou
que o órgão ambiental municipal, FAMA, lavrasse o embargo de construções
indevidas em APP na parte baixa do balneário Morro dos Conventos. Um ano depois
da primeira inspeção realizada no balneário, em 01 de agosto de 2013, outra vez
a MPF acompanhado pelo comando da polícia ambiental fizeram nova vistoria, para
conferir se as recomendações elencadas haviam sido compridas. Como
encaminhamento, a procuradora agendou, para o mesmo ano, a realização de
audiência na sede do MPF, Criciúma, para discutir uma solução negociável para o
Balneário.
Participaram da audiência, representantes da
AMOCO, PROCURADORIA DO MUNICIPIO, POLICIA AMBIENTAL, COMANDO DA POLÍCIA
MILITAR, FAMA E OSCIP PRESERV’AÇÃO. A procuradora federal justificou que a
forte atuação do órgão federal no Morro dos Conventos está sendo motivado pela
inoperância do poder público municipal que vem se isentando de suas obrigações
como órgão gestor e fiscalizador. O MPF questionou o procurador do município se
havia algum plano de gestão da orla, especialmente sobre uso turístico da barra
para apresentar.
Como
não foi apresentado qualquer plano alternativo, a procuradora federal propôs
que a própria comunidade tomasse a iniciativa de explorar a orla
turisticamente, elaborando um sistema de transporte coletivo para transportar
turistas à barra. Também nesse mesmo ano, em outubro de 2013, houve audiência
no quartel da Polícia Militar de Araranguá, com a presença de representantes da
Prefeitura, Fama e Oscip Preserv’Ação, para discutir o trânsito de na orla. Segundo
o comandante da polícia, a orla do balneário não é considerada via pública,
portanto, não é permitido o transito de veículos. Para que o comando da polícia
pudesse atuar, seria necessária a fixação de placas informativas na orla,
seguindo os mesmos moldes adotados em via pública. Essas ações justificariam a atuação
da polícia.
Transcorreu
um ano e os problemas permaneceram sem que o município cumprisse as determinações
do órgão federal. Com o esgotamento de prazos previsto, para assegurar a integridade
física dos freqüentadores da orla e preservação do ambiente, o Tribunal de
Justiça de Porto Alegre decidiu pelo fechamento definitivo da orla. Então, como
alguém pode afirmar que o Ministério Público Federal somente despacha
liminares, resoluções, sem conhecer o objeto de suas ações? Outra prova do
desconhecimento dos temas abordados pelos entrevistados foi quando argumentaram
sobre as modalidades das unidades de conservação dos balneários.
O
representante do Coma, em nenhum momento informou que no final de 2016, três
decretos foram assinados pelo executivo, criando o MONA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO
MORRO DOS CONENTOS; APA – MORRO DOS CONVENTOS, MORRO AGUDO E ILHAS E RESEX EM ILHAS. Citou apenas a APA, que
segundo ele não vai estar necessariamente inserida no projeto Orla. Como não
vai estar? Ele deveria ter clarificado ao publico que é função agora do Comitê Gestor
do Projeto Orla, o compromisso de adequar as três modalidades de preservação ao
Projeto Orla.
Na
área urbanizada da orla do Morro dos Conventos, além de fazer parte da APA, se constituiu
em uma MONA (Monumento Natural Morro dos Conventos), ou seja, uma Unidade de Conservação
com normatizações próprias. Deve se ressaltar que com o decreto, que já está
valendo, o comitê terá que inserir o MONA-UC (representado no mapa abaixo pela
cor laranja) no orla, respeitando as leis que disciplinam sua gestão, como as
zonas de amortecimento. Vê no mapa que quase toda orla, até a barra do rio
Araranguá, está integrada a Unidade de Conservação. Não serão o SPU e muito
menos o MPF, os órgãos que decidirão como deverá ser gestado esse programa, e
sim o comitê gestor do projeto orla em conjunto com toda a sociedade civil
organizada, poder público e demais entidades afins.
Outro
detalhe importante. A reunião que foi agenda para o dia 23 de agosto de 2017,
com o COAMA, para tratar sobre a portaria 113, deveria ser de direito com o
Comitê do Orla, pois são os que mais apresentam condições para debater o
assunto, pelo vasto conhecimento das peculiaridades relativas ao Morro dos
Conventos. A pargunta que não quer calar é: por que razão que em nenhum momento
o legislativo e muito menos o executivo se predispôs em realizar encontro com o
comitê do projeto orla para discorrer sobre a portaria 113?
Por
que cargas d’água, também querer aprovar com tanta urgência uma lei sobre um
tema complexo, sem conhecer a fundo o seu teor e suas implicâncias para o
município? Será que agora, com uma portaria que impõe ao o município tantas exigências,
todas as cláusulas serão cumpridas? Observe o absurdo: a câmara aprova uma lei
relativa a uma portaria sobre praia urbana, onde o próprio presidente da casa informou
que irá à sede do SPU em Florianópolis para entender melhor a lei. O correto não
seria primeiro ir à Capital, tirar todas as dúvidas acerca da proposta,
retornar, reunir as entidades, Comitê Gestor Projeto Orla, Coama, Câmara de
Vereadores, Poder executivo, Ongs e Oscips, etc, e discutir a proposta,
verificar a sua viabilidade?
Mais
uma vez, como integrante de uma organização ambiental, delegado do projeto e do
atual comitê gestor do orla, venho por meio deste lançar meu repúdio, minha
indignação, a forma desrespeitosa dos poderes constituídos municipais,
legislativo e executivo, com os delegados do comitê gestor, que não foram em
nenhum momento consultados para opinar acerca da portaria 113 e do projeto de
lei que autoriza o município a assumir a gestão das suas parias. Reitero também meu repúdio aos responsáveis
pela elaboração do projeto de lei, que poderiam ao menos ter considerado a Clausula
Quarta, inciso I da portaria onde diz que São deveres
da União, por intermédio da Secretaria do Patrimônio da União: I - mediante solicitação do Município, garantir-lhe
disponibilidade de corpo técnico apto a orientar a elaboração ou atualização do
seu respectivo Plano de Gestão Integrada da Orla (PGI). Em nenhum momento o comitê foi procurado ou consultado.
Essa
cláusula deixa explícito que qualquer projeto pensado para faixa costeira do
município de Araranguá deve, necessariamente, passar primeiro pelo crivo do
comitê gestor do Orla, que não ocorreu. É bem provável que no SPU, no momento
que receber alguma visita de alguém do executivo ou legislativo, para pedir
melhores esclarecimentos sobre a portaria, vai ter como resposta, volte e converse
com o comitê gestor do orla, eles possuem as diretrizes de como deve proceder
os trâmites.
Prof. Jairo Cezar
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