Os
efeitos perversos da aprovação do Projeto de Lei Complementar 257/ 2016 na vida
dos trabalhadores brasileiros.
As
expectativas de que com a posse do presidente interino Michel Temer a situação
funcional dos trabalhadores especialmente da iniciativa pública das instâncias federais,
estaduais e municipais se deteriorariam ainda mais, se concretizaram quando foi
divulgado que o Projeto de Lei Complementar ou PLP 257-16, que trata sobre o
refinanciamento das dívidas dos estados, entraria na pauta do congresso já no
começo do segundo semestre em caráter de urgência.
Como
não bastasse toda a roubalheira que solapou bilhões e bilhões de reais dos
cofres públicos, dinheiro quase que suficiente para amenizar as nefastas
condições estruturais dos hospitais, escolas, saneamento básico, segurança
pública, entre outros, agora, para agravar ainda mais, um novo ataque do executivo
e do legislativo. O que vem se apregoando nos bastidores do poder e através das
mídias entreguistas é querer responsabilizar os trabalhadores pelo atual quadro
de instabilidade econômica no qual se encontra o Brasil.
É
inacreditável pensar que um país tão extenso territorialmente, com pujante
capacidade produtiva e de extraordinárias reservas naturais, capaz até de se
auto subsistir, esteja passando por terrível “calvário”, fruto da brutalidade insana
de um modelo econômico perverso, capitaneado por poderosos grupos financeiros,
com total cobertura e apoio de governos entreguistas de plantão.
Não
é de hoje que os mal escolhidos “representantes do povo” vêm se comportando
como verdadeiros fantoches de seus financiadores de campanha. Nessa direção, as
frágeis políticas de gestão política dos países capitalistas periféricos e
centrais os mantêm historicamente sob a órbita de poderosas organizações como Banco
Mundial, FMI, entre outros tantos grupos financistas. Não podendo esquecer, todavia,
da forte dependência do capital especulativo transnacional que consome parte de
nossas reservas cambiais aproveitando as generosas taxas de juros oferecidas, uma
das maiores do planeta.
Quando
nos atemos aos discursos favoráveis aos ajustes da economia convém lembrar o
período pós-ditadura quando iniciou no Brasil um violento processo de reorganização
do Estado brasileiro, transferindo parte de patrimônio nacional, empresas de
mineração, petróleo, eletricidade, bancos, telefonia, transportes, etc. a
verdadeiros conglomerados transnacionais. Todos (as), suponho, devem se lembrar
do modo como se procedeu a venda da Vale do Rio Doce. Um patrimônio de trilhões
de reais em reservas minerais vendido, vendido não, entregue por um poucos
bilhões de reais.
E
não parou por aí. Um ajuste também requer limitar gastos públicos em educação,
saúde, segurança, etc. Lembram da lei de responsabilidade fiscal homologada em
2000, no governo de Fernando Henrique Cardoso? Um instrumento dito eficiente de
controle dos gastos públicos que condicionou o governo brasileiro ao
cumprimento de metas fiscais como vendas de ativos públicos e congelamento dos
salários. Tais medidas asseguraram
economia de bilhões de reais para o refinanciamento das dívidas com fundos e
bancos internacionais.
Na época, a propaganda que foi intensamente disseminada
pelos veículos de comunicação, aliados do poder, procuram justificar os ajustes
como medidas imprescindíveis, admitindo que quanto mais “enxuto” fosse o
Estado, mais investimentos seriam alocados ao setor produtivo, que por conseqüência
alavancaria a economia, o emprego e a renda dos trabalhadores. Nada disso
aconteceu. O fato é que Estado enxuto ou mínimo tem, ideologicamente, um
sentido ideológico, de desemprego, arrocho salarial e precarização dos serviços
básicos oferecidos. A ascensão política do Partido dos Trabalhadores criou a
expectativa de um novo ciclo de poder popular, de um possível rompimento
definitivo com as tradicionais oligarquias, enraizadas em todas as instâncias
do frágil Estado republicano. Quem se
lembra das primeiras edições do Fórum Social Mundial ocorrido no Brasil, na
cidade de Porto Alegre?
Quem
esteve lá e acompanhou os acalorados discursos sobre outro Brasil que se
pretendia construir, deve ter se frustrado a partir do segundo ano de governo Lula
e, posteriormente, tendo continuidade por Dilma Rousseff. Ambos não tiveram
coragem o suficiente e nem competência para promover o que estabelecia o
estatuto do partido dos trabalhadores, ou seja, uma profunda transformação estrutural,
que pudesse romper definitivamente com o histórico e nefasto domínio das elites
predadoras que, como vampiros vorazes, “sugam o sangue” dos trabalhadores. Nada
de revolução, menos ainda melhorias substantivas em áreas estratégicas, que a
meu ver a educação deveria ser uma delas por ser um instrumento impulsionador
do desenvolvimento.
No lugar de transformações significativas, o
que se viu foram modestas e acanhadas ações de caráter filantrópico, através de
transferência de recursos às populações carentes, sem ao menos condicionar o
apoio a um plano mais estruturado que pudesse resultar em uma real “revolução
social”, não nos moldes tradicionais, mas que brotasse no interior dos grupos
sociais, fundamentado em teóricos como o educador brasileiro Paulo Freire, o italiano
Antônio Gramisc, entre outros.
Nem
educação, nem saúde, nem segurança foram priorizados durante mais de uma década
que perdurou o ciclo “lulismo” e Dilma. E não foi por falta de recursos. Como
em qualquer país que alcançou o desenvolvimento econômico e social, como exemplos,
Noruega, Suécia, Finlândia, etc. ambos aproveitaram de maneira eficiente suas riquezas
naturais: petróleo, minérios, pescados, entre outros, para dinamizar suas
economias, transferindo parte dos vultosos recursos para revolucionar a
educação.
No Brasil,
o processo dito “transformador” foi e está sendo realizado de modo invertido. E
por quê? A resposta, portanto, pode estar condicionada a vários fatores, dentre
eles, talvez, o que mais aproxima a realidade, é o político administrativo. No
Brasil, tal sistema foi forjado há mais dequinhentos anos, que a pretexto de
assegurar o bem comum, muitos as utilizam em benefício próprio e de seus
“iguais”. Manter a educação pública em condição de precariedade como se vê
hoje, permite que sejam reproduzidas as relações de domínio de classe.
Construir um Estado verdadeiramente
republicano no Brasil, seguindo os princípios do modelo clássico, nesse caso o
positivismo, está ainda distante para se consolidar. Basta conferir o modo como
se sucede as eleições daqueles que integram os poderes legislativos e executivos,
nas instâncias federal, municipais e estaduais. Com raras exceções, prevalece
até os dias atuais o emprego de critérios questionáveis para alcançar os fins
pretendidos, a obsessão exacerbada pelo poder.
O
critério de escolha, portanto, ainda se baseia na mercantilização do voto, do
toma lá dá cá. Aspectos como competência e capacidade de gestão, compromisso
social e honestidade, são esquecidos ou desprezados no instante que o voto é
depositado na urna. Para conferir tais adjetivos bastam relembrar o fatídico e emblemático
momento em que cerca de trezentos deputados envergonharam milhões de
brasileiros expressando frases ou bordões que revelam a limitada capacidade
intelectual nos cargos que exercem quando votaram a favor ou contra o
impeachment de Dilma Rousseff.
São
esses mesmos legisladores que vem decidindo ou vão decidir o futuro de milhões
de brasileiros, que os elegeram, na votação de projetos que tornarão a vida
desses mesmos brasileiros ainda mais deploráveis. São perdas de direitos e a
imposição de sacrifícios ainda mais brutais para tentar recuperar um país
devassado pela corrupção e injustiças sociais. A designação positivista “ordem e progresso”,
que se tornou o slogan escolhido pelo governo interino, Michel Temer, já dá o
tom de como será seu governo. Quem se lembra dos protagonistas do pensamento
Neoliberal do começo da década de 1990, onde seus articuladores, Consenso de
Washington, lançaram receituário de reformas estruturais e que foram aceitas e
aplicadas inicialmente por Collor de Mello e, posteriormente, FHC. Estado máximo
para os trabalhadores e mínimo para o mercado, essa foi a regra estabelecida.
Lembra-se
das manifestações dos professores da rede pública estadual do Paraná, no inicio
de 2015? É isso mesmo, Estado Máximo foi o que ocorreu, com polícia na rua
reprimindo-os com cassetetes, spray de pimenta e balas de borracha. Com o
slogan Ordem e Progresso, não há qualquer dúvida quanto sobre o uso da força
repressora do Estado, para aqueles que ousarem se opor às políticas de ajustes.
Julgam os seus articuladores, que tais medidas restabelecerão os rumos do país,
trazendo estabilidade econômica e desenvolvimento social. Isso mesmo, “primeiro
fazer crescer o bolo para depois distribuir à população”.
Afinal
qual o custo social para tudo isso? Para um país em crise, com hospitais e
escolas aos frangalhos, com todas as benesses possíveis aos seguimentos
financeiros internacionais, bem como isenções fiscais generosas às grandes
corporações econômicas, o custo social será, com certeza, doloroso. O Projeto
de Lei Complementar 157/2016 é um sinal de que teremos dias muitos difíceis se
a mesma for aprovada no congresso. O modo como o respectivo congresso hoje está
constituído, o mais conservador de todos os tempos, pouquíssimas são as chances
de ocorrer um revés favorável aos trabalhadores.
A
questão central desse projeto de lei está na proposta de refinanciamento das
dívidas dos estados, orçado hoje em cerca de 300 bilhões de reais. Não se
enganem a dívida dos estados era muito menor, porém, seus financiadores, os
bancos internacionais, criaram um dispositivo de calcular juro sobre o juro. Como forma de ter o apoio dos governadores num
momento delicado, de crise institucional, o acordo fechado com os governadores
foi tentar atraí-los a aderir ao plano, cujas dívidas serão proteladas por
vários anos. No entanto, como ação compensatória terão os governos estaduais e
o próprio executivo federal o compromisso de aplicar as metas do ajuste fiscal.
Mais
uma vez o funcionalismo público e companhias estatais de importância
estratégica serão penalizados com mais um ajuste estrutural. O fato é que os
bancos detentores de fluxo de capitais que transitam pelo planeta e que
financiam as economias dos países em desenvolvimento, impõe regras ante populares
para assegurar que não haja calote da divida. No entanto, devido a limitação cada
vez maior de capitais disponíveis, a tendência são os bancos disponibilizarem
os capitais a quem ofereça juros compensadores. Países como o Brasil com uma
forte estagnação no setor produtivo, são os elevados e atraentes juros
oferecidos que asseguram a entrada de capitais voláteis. Atualmente os juros da
taxa Selic são de 14%, muito alto para uma economia quase congelada. O impacto
dessa elevada taxa para a economia é o agravamento da recessão.
Outro
critério estabelecido tanto para garantir o fluxo de capitais para o pagamento
da dívida pública como também a absorção de novos recursos externos via fundo
monetário internacional é, além dos ajustes fiscais, a formação de um superávit
primário, ou seja, sobras de recursos para o pagamento das dívidas. Para 2017 a
proposta do governo federal é reduzir a inflação de 9,5% para 4,5%. A
tendência, portanto, é o aumento da taxa da Selic, que por sua vez refletirá na
elevação dos preços dos produtos e serviços e a redução do consumo. Isso quer
dizer, menos dinheiro circulando, menos consumo, mais desemprego, mais pobreza,
mais violência, mais insegurança, etc.
Preste
a atenção de como funcionará essa equação matemática que, segundo o governo
federal, será o caminho para a retomada do crescimento econômico. Cada estado
da federação deverá promover cortes de despesas com o funcionalismo público,
dentre outras medidas. Nesse caso, nos próximos anos nenhum reajuste salarial
poderá ser concedido. Na continuidade do déficit público, ou seja, inflação
acima do patamar pré-estabelecido, os governos estaduais poderão executar outras
medidas mais austeras como suspensão de contratação de trabalhadores e
demissões voluntárias.
O sistema
previdenciário também sofrerá forte revés. Além da prorrogação do tempo para a
aposentadoria, redução dos benefícios e equiparação entre os vários níveis, também
ocorrerá a elevação da alíquota cobrada que poderá ultrapassar os 14%. No
projeto há dispositivos que estimula os contribuintes a recorrer o regime de
previdência complementar. Essa medida cria precedentes para que companhias
particulares vinculadas ao seguimento previdenciário se instalem no Brasil e
cujos recursos advindos dos fundos complementares ou fundos de pensão serão
injetados no capital especulativo rendendo bilhões aos seus proprietários. É esse mesmo dinheiro dos fundos complementares
que financiará as economias débeis como a brasileira. Nosso próprio dinheiro
financiando a incompetência dos governos.
Os
estados também deverão promover suas reformas administrativas. Santa Catarina
saiu à frente e já vem cumprindo tais medidas. No final de 2015 a Assembleia
Legislativa aprovou vários projetos flexibilizando direitos já assegurados aos
servidores da segurança pública e educação. Na educação, foi sancionado o novo plano de
carreira do magistério público estadual alterando, entre outros, o tempo para a
aposentadoria. Além, claro, o congelamento dos salários até 2018, com
possibilidade de prorrogação. Talvez depois das eleições o ataque do governo
será no regime geral dos servidores que alterará dispositivos jurídicos dos
ativos e inativos, extinguindo benefícios e alterando regras de
aposentadoria.
A
PLP 157/2016 também autoriza os estados na hipótese das medidas não forem
suficientes para atingir os limites pré-estabelecidos de gastos, avançar ainda
mais reduzindo em até 30% os gastos com servidores públicos. A tendência aqui é
estimular a demissão voluntária no serviço público e alterar o regime jurídico
de contratação de trabalhadores, podendo, até, expandir o regime de
terceirizados. Esse já é um dispositivo
empregado em vários seguimentos, dentre eles as OS (Organizações Sociais) que
administram muitos dos hospitais públicos do Estado. Na educação, serviços como
vigilância e alimentação dos estudantes, são terceirizados. A tendência é se
estender ainda mais, podendo até o governo terceirizar a contratação de
professores e outros serviços executados nas escolas. É só esperar.
E o
ataque contra servidores públicos continua. Mais uma vez são os profissionais
da educação os alvos diretos do terrorismo praticado pelo governo do estado. E
por que será? Por que não adota os mesmos procedimentos contra as Agências de Desenvolvimento
Regionais, que acomodam milhares de pessoas em cargos comissionados, cujos
benefícios pró-desenvolvimento das regiões são questionáveis? É claro que não! Por que matar logo a galinha dos ovos de ouro,
instrumento que garante a perpetuação de um modelo de governo respaldado por
grupos econômicos e grandes empresários da comunicação no estado.
Se a
proposta é reduzir gastos públicos mantendo intocáveis tais calcanhares de
Aquiles, como ADRs e o seguimento empresarial beneficiando por isenções fiscais
milionários, então é necessário forjar bodes expiatórios produzindo situações
problemas que justifiquem a adoção de novos procedimentos que resultem na
redução do quadro de profissionais, bem como na própria extinção do cargo. A
vítima insana do governo desta vez foram os profissionais que monitoram as
salas de tecnologia das escolas públicas estaduais.
A
questão é que esses profissionais além de exercerem o importante papel de
assessorarem os estudantes nos laboratórios de informática, também estão incumbidos
de prestar assistência técnica aos equipamentos, assegurando o funcionamento mediante
transferência de peças de uma máquina para outra. Isso mesmo. É bem possível
que o governo do estado e seu secretário da educação não tenham qualquer noção
da condição de abandono e sucateamento dos laboratórios de quase todas as
escolas públicas.
Enfim,
todo esse imbróglio envolvendo o aparelho estatal, cujos serviços oferecidos
são o retrato de um sistema montado para beneficiar partidos políticos e seus
apadrinhados, não é de estranhar que nas eleições municipais de outubro de
2016, partidos políticos que integram a base aliada do governo obtenham o
máximo de prefeituras e cadeiras no legislativo. Pode ser também que a partir
do instante que a população sinta na própria carne os efeitos perversos das
medidas previstas na economia, ocorra um revés violento quebrando um ciclo
quase centenário de hegemonia das oligarquias no estado. É esperar para ver.
Prof.
Jairo Cezar
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