RAIZ
ARTE - A MÍSTICA ESCONDIDA NAS RAIZES DAS
FLORESTAS TRANSFORMADAS EM ARTE MOVIMENTO
A
arte sempre fez parte da existência humana. Desde os primórdios grupos humanos
expressavam suas opiniões e sentimentos a partir de desenhos nas paredes de
cavernas ou esculpidas em pedras. Além desses registros para se comunicarem,
esculturas em madeiras, pedras ou amontoados de conchas de crustáceos também
eram confeccionadas e usadas em ritos para celebrar a vida, a morte, bem como acalentar
os espíritos, os deuses.
A
arte ou as artes são formas ou meio simbólicos de expressar sentimentos, emoções,
valores, de determinados povos, culturas, no tempo e espaço. Para compreender
melhor, são representações arquetípicas, imagens, por exemplo, presentes no
inconsciente coletivo, como registros de tudo o que a espécie humana construiu
em sua trajetória existencial. A arte, tanto pode ter uma intenção puramente
comercial, como também auxiliar na supressão de traumas e transtornos emocionais
tanto do público infantil como adultos.
Quanto
mais crianças são estimuladas a criação, a representação artística, gerações de
cidadãos livres, críticos, felizes estarão sendo forjados e se replicando
permanentemente. Como foi destacado em parágrafo anterior, a pintura, a escultura,
a música, a dança, o teatro e tantas outras formas culturais, tem a capacidade
de curar, de transformar substancialmente a vida de qualquer cidadão.
Tanto
é verdade que em 2006 fui acometido por instabilidade emocional me fez abreviar
momentaneamente uma série de compromissos profissionais. Devido à intensidade
da crise fui forçado a buscar acompanhamento de profissionais da área da psiquiatria
e da psicologia. Um ano depois, em 2007, minha companheira me levou a um
atelier de pintura em tela onde me apresentou ao professor e artista plástico
Abrão Scotti. Foi o contato com a tela, com as tintas, que minha vida foi se transformando
dia após dia, pois jamais imaginei que havia dentro de mim elementos desconhecidos
relacionados à arte. O incrível é que além de curar o trauma psíquico abriu
fronteiras para outras habilidades artísticas ainda desconhecidas.
De
2007 até 2019 foram confeccionadas mais de uma dezena de pinturas em telas,
muitas das quais retratando a história de Araranguá a partir de fotografias
tiradas no começo do século XX. A ideia foi retratar em cores, dar vida, luz, as
imagens fotográficas que revelavam cenários todos em preto em branco. Além de casarios
antigos, também fizeram parte do meu arcabouço criativo paisagens parasidíacas
dos Balneários Ilhas e Morro dos Conventos. E não parou por aí, trabalhos em
mosaicos, esculturas com argilas e trabalhos em bambus incrementaram meu campo
de experimentos, mostrando que podemos aprender tudo o queremos, basta pitadas
de esforços e perseverança.
Não
imaginei que em 2020, no começo da Pandemia do COVID 19, algo novo, um tanto
inusitado, viesse a transformar meus dias de reclusão ao vírus em um
extraordinário ócio criativo. Descobri em uma das inúmeras caminhadas até a foz
do rio Araranguá, Ilhas, que era possível a partir de raízes de árvores secas
depositadas pela força das águas às suas margens, transformá-las em figuras,
muitas das quais com traços quase perfeitos. O que impressionava foi a
quantidade de troncos, de tamanhos absurdos, arrancados das encostas da serra
geral, durante as inúmeras enxurradas, dentre elas, a de 1995, que devastou o
município de Timbé do Sul. Toda a orla de Araranguá, foi tomada por milhares de
metros cúbicos de madeiras, material suficiente para a construção de centenas
de residências.
Transportando
esse material para meu improvisado atelier, no momento que eu estava cortando
era possível identificar e diferenciar os diversos aromas, cores, texturas de
um pedaço de madeira, raiz, do outro. Em
três anos de contínuas caminhadas e coletas de materiais espalhados ou
discretamente cobertos pelas dunas, somam-se hoje mais de cento e cinquenta peças
artísticas.
Não
há repetição de peças de artes, cada objeto é único. É possível que muitos até
queiram levantar questionamentos sobre a enormidade de peças retratando figuras
humanas, bailarinas em especial, cujos corpos demonstram estar em movimento. Essa
formação, traços, se deu de forma natural, ou seja, as raízes em seu
gravitropismo, movimento gravitacional no solo, no seu movimento de entrelaçamento
teve a tendência de moldar desenhos que se confundem com corpos humanos.
Possuo
no meu atelier algumas peças que quando as encontrei e comecei a trabalhá-las,
ambas me deixaram um tanto intrigado diante da incrível semelhança das raízes às
pernas humanas, não um único par de pernas, mas diversos, simetricamente torneadas.
Esse extraordinário espetáculo da natureza me fez acreditar que há sim forte
interação envolvendo humano e florestas, que existe uma mística, cujos povos
das florestas interpretam como sendo espírito, algo sagrado, que media os
limites do permissível, do tolerável junto à mãe natureza.
Prof.
Jairo Cesa
Nenhum comentário:
Postar um comentário