AGROTOXICOS
E O AUMENTO DOS DIAGNÓSTICOS DE CÂNCERES E OUTRAS DOENÇAS DEGENERATIVAS
Antes
de aprofundar o tema agrotóxico quero aqui testemunhar um fato ocorrido no
Hospital Regional de Araranguá. Foi numa sexta-feira, pela manha, quando meu
pai teve que ser internado no setor de emergência devido a uma crise
respiratória. No quarto onde ele estava, um cidadão aparentando sessenta ou
setenta anos, com corpo quase esquelético esperava por atendimento. Como é de
costume das inúmeras vezes que acompanhei meu pai nas internações realizadas,
sempre procurei conversar com os pacientes para saber mais sobre o histórico
delas, pois geralmente nas falas estão as respostas das enfermidades das quais
estão acometidos.
O
cidadão que dividia o quarto de emergência com o meu pai me falou que estava
enfrentando um câncer de pulmão há algum tempo, que sua idade era bem aquém do
que eu havia presumido quando o vi, não sessenta ou setenta, mas cinquenta
anos. Ainda era muito jovem de acordo com sua idade cronológica, porém, a
doença estava lhe consumindo dia após dia, apresentando mínimas as chances de
cura.
O
paciente me confessou que havia fumado por trinta e quatro anos, que trabalhou bastante
tempo no cultivo de tabaco e arroz. Perguntei se ele usava com rigor o EPI –
Equipamento de Proteção Individual. Respondeu que quando trabalhou com o
cultivo de arroz não havia equipamentos mais complexos como as atuais máquinas
para pulverização de agrotóxicos, que na época o processo era manual, que não
sabe o número de quantas vezes ficou intoxicado com o veneno.
Ouvindo-o
pude ter mais clareza de que dezenas, centenas de pacientes que procuram as
unidades de pronto atendimento, hospitais e centros de tratamento de doenças
degenerativas como câncer, tem, sim, a/as doença/as motivada/as por contato
contínuo com venenos aplicados na agricultura. Lembro que há pouco tempo uma
das poderosas corporações que controla o segmento de sementes transgênico e
agrotóxico foi condenada nos EUA a pagar indenização bilionária de 7,6 bilhões
de reais a quatro pessoas por ter sido ela responsável por melanomas contraídos
decorrente da exposição ao glifosato, um dos principais agrotóxicos
comercializados pela empresa.
Se
a decisão não for derrubada por liminares essa decisão poderá sofrer efeito
cascata e valer para o resto do planeta onde o produto é comercializado e
existir outros casos confirmados de ter sido o principio ativo Monsanto o
causador. Voltando ao caso do cidadão internado no Hospital Regional de
Araranguá, acometido por melanoma no pulmão, é fato que a doença contraída teve
relação direta e indireta com o consumo de cigarros e contaminação por
agrotóxicos durante o cultivo de tabaco e o arroz.
Claro
que tanto ele quanto outros milhões de brasileiros, muitos dos quais já
falecidos por doenças semelhantes, se tivessem acessado a justiça durante a
enfermidade processando as empresas, principalmente as companhias de tabaco,
por crime de responsabilidade, dificilmente as investidas teriam sucesso, pois
uma das alegações atenuantes às empresas seria liberdade de escolha. Ninguém forçou
o agricultor cultivar tabaco ou fumar, foi escolha voluntária, argumentariam os
responsáveis. Muitos devem se lembrar das décadas de 1970, 1980.. da enormidade
de publicidades transmitidas pelas mídias, principalmente emissoras de TV, incitando
a população ao consumo de cigarro.
A
estratégia era conquistar o jovem tímido, retraído, a partir de um pool de
profissionais capacitados, marqueteiros, psicólogos, etc, para bolar meios
eficazes que convencessem o frágil cidadão a fumar, pois seria o caminho seguro
para alcançar o sucesso individual, profissional. As próprias marcas de cigarros eram pensadas nessa
direção. Hollywood, minister, Arizona. Charme, nomes de cigarros que geralmente
eram artistas, jogadores ou certas celebridades de sucesso os contratados para
atuarem nas publicidades, não era mesmo?
O
fato é que essas companhias lucrarem e vem lucrando rios de dinheiro no
comercio de insumos e cigarros. Nos
países que atuam o legado que deixam são os passivos de milhões de doentes e
sequelados cujo Estado se coloca, obrigatoriamente, como principal fiador no
tratamento, por meio do SUS, a exemplo do Brasil. Quem visita ou já visitou
locais como o UNACON (Unidade de Alta Complexidade Oncológica) distribuídos em
diversas cidades do estado de Santa Catarina, deve ter notado o turbilhão de
pacientes fazendo tratamento contra tumores todos os dias. Contatando alguns
pacientes, agricultores, por exemplo, ambos relataram terem tido contato com
agrotóxicos por longo tempo em suas vidas.
Nas
décadas passadas quando se falava em veneno/pesticida/agrotóxicos, o que vinha
em mente era o cultivo de tabaco, atividade predominante no sul do Brasil. Também
nessa época não tão comum a prática da capina química com glifosato em áreas
urbanas como acontece hoje. A difusão desse agrotóxico, junto com outras
dezenas de princípios ativos tóxicos disponíveis para todos os tipos de “pragas”,
no campo e áreas urbanas, vem progressivamente colapsando os sistemas de saúde pública
no Brasil. O problema é que muitos desses aditivos químicos aplicados no campo foi
há muito tempo banidos em outras partes do planeta por serem causadores de cânceres
e tantas outras doenças degenerativas.
Se
hoje as legislações em vigor impedem a divulgação de publicidades estimulando o
consumo de cigarros, o mesmo não ocorre com os agrotóxicos. De modo sutil, os
meios de comunicação de massa recebem pagamentos polpudos de companhias
multinacionais que comercializam sementes e insumos para o agronegócio
brasileiro. Durante a onda do cigarro, décadas passadas, as publicidades tinham
por estratégia provocar o desejo em crianças e jovens ao consumo de cigarros, argüindo
que fumar era uma questão de “classe” e “sucesso”, porém, omitindo riscos
eminentes de ficarem viciados, doentes e virem a falecer.
Atualmente
as estratégias das corporações que controlam o comércio de venenos e das
sementes modificadas, seguem princípios muito parecidos, porém, mais agressivos
até que durante a onda do tabaco. Quem cultiva milho, soja, sorgo, algodão,
entre outras variedades de cultivares é estimulado a comprar sementes geneticamente
melhoradas, por produzirem mais, com menos trabalho e menor custo de produção. A
empresa força o produtor a adquirir um combo, ou seja, sementes e insumos, onde
tudo tem de ser consumido naquela safra. Na safra seguinte, o ciclo se repete, e
assim sucessivamente por tempo ininterrupto.
Se
o cigarro escravizava as mentes dos jovens, porém com chances de se libertarem depois
de um longo tratamento, as grandes corporações e o agronegócio adotam hoje
mecanismos de escravização tão ou mais perversos que das pretéritas companhias
de cigarros. No instante que o agricultor opta pelo modelo agrícola convencional
ele está assinando de modo não oficial um termo para se tornar cativo dessas
estruturas de poder. Um exemplo é com o milho geneticamente modificado, cujas
sementes colhidas não poderão ser cultivadas no ano seguinte pelo fato da fraca
germinação. Outro agravante, a cada safra o agricultor tenderá a elevar as doses
de agrotóxicos nos cultivos devido a incidência de “novas pragas”, mais e mais
resistentes aos venenos.
O
agravante disso é o fato de segmentos políticos, membros do congresso nacional
e até mesmo governos ditos progressistas estarem compactuando com essa ciranda
destrutiva dos biomas e da vida humana. Nos últimos anos houve crescimento
assustador de fórmulas de agrotóxicos liberadas para o uso agrícola. Como havia
descrito no inicio desse texto, muitos dos princípios ativos autorizados à
agricultura já foram banidos na União Europeia e outras regiões do planeta. Até
meados de julho de 2023, o presidente Lula já havia liberado o registro de 231
agrotóxicos. O ritmo se equipara a do primeiro mandato do governo Bolsonaro, e
superando a soma anual de qualquer mandato petista.
Prof.
Jairo Cesa
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