AS DEMANDAS
DO PROJETO ORLA E OS DESAFIOS PARA SUA EXECUÇÃO EM TODA FAIXA COSTEIRA DO
MUNICÍPIO DE ARARANGUÁ
Quanto ao projeto orla, embora inúmeros
dispositivos contidos no documento tenham sido incluído na lei do plano diretor
que trata sobre Zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, aprovado pela câmara de
vereadores no dia 14 de dezembro de 2016, inexpressiva são as pessoas que
conhecem o documento integral que cotem sete volumes: apresentação; diagnóstico
socioambiental; cenário da orla; estratégias de gestão; instrumentos e
normativa; cronograma e considerações e mapa temáticos.
Seria quase que impossível detalhar o que
consta em cada volume. No entanto é cabível traçar considerações importantes
mostrando o que poderá acontecer especificamente no balneário Morro dos Conventos
se as mais de 80 proposições discutidas e encaminhadas nas reuniões e oficinas
forem realmente concretizadas. Devido a sua peculiaridade ambiental, dentre os
temas polêmicos discutidos a questão do saneamento básico, coleta e tratamento
de esgoto e uso e ocupação do solo sem dúvida foram os que nortearam os debates.
A partir da década de 1950 o Morro dos Conventos
começou a atrair turistas e especialmente veranistas que iniciaram a ocupação
da sua faixa costeira. Na época, talvez aproveitando a fragilidade das
legislações ambientais, empresários do setor hoteleiro, entre outros,
quadricularam todo trecho que começava do loteamento Paiquerê até a foz do rio
Araranguá. Observando o mapa elaborado naquele momento, causa espanto como o
legislativo e o executivo municipal teve ousadia de aprovar tamanho descalabro.
As décadas se passaram e o Morro, contemplado
pela geologia e geografia, seu complexo e frágil solo continuou cedendo lugar a
novas residências e edifícios contendo até quatro pavimentos. Novas legislações
mais restritivas e disciplinadoras à ocupação desses espaços foram sancionadas
em âmbito federal e estadual, porém muitas delas que obrigam o poder público a
implantação de políticas de destinação do lixo e o tratamento de esgoto ainda
estão muito longe de se tornar realidade no balneário.
O fato é que na própria sede do município
mesmo tendo as duas ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) já inauguradas no
final de 2016, não se sabe com precisão quando entrarão em funcionamento. A ETE
mais importante, construída no bairro vila são Jose depois de inúmeros entraves,
não possui ainda nem mesmo rede de energia elétrica, cujos testes dos
equipamentos e a manutenção dos motores e lâmpadas acesas foram graças à
gentileza de um produtor de arroz que cedeu um dos seus postes para conectar na
rede da estação.[1]
Os órgãos ambientais e o próprio poder
público, cujas funções seriam restringir ao máximo e fiscalizar possíveis
ocupações irregulares em App, fazem vistas grossas chegando ao extremo de
conceder licenças ambientais para novos empreendimentos com status duvidosos de
proteção ambiental. Exemplos são os que não faltam no balneário, basta subir
até aos vários mirantes do balneário e observar quantas infrações cometidas. E
o descalabro ocorreu até mesmo durante os encontros do projeto Orla, quando
vários empreendimentos e terraplanagens se sucederam e tendo sido passiveis de
denúncias por parte de entidades ambientais.
A tendência, isso se não houver uma rígida
fiscalização mesmo com a homologação do projeto orla, é repetir no Morro dos
Conventos, parte baixa, o que se sucedeu no loteamento paiquerê, que foi embargado
pelo poder judiciário por não cumprir dispositivos ambientais pré acordados. Um
deles é a insuficiência do tratamento de efluentes domésticos por fossa séptica
e sumidouro indicado no licenciamento feito pela FATMA quando da homologação do
loteamento. O fato é que toda a área de faixa costeira onde estão os loteamentos
Paiquerê e Morro dos Conventos, o lençol freático tem baixa profundidade,
podendo os efluentes domésticos contaminar todo o ecossistema do entorno e a
própria água do oceano.
A análise de balneabilidade realizada pela
FATMA em 2015, que detectou alto índice de contaminantes na água do oceano,
deve servir de alerta quanto aos novos licenciamentos sem considerar as
diretrizes contidas no documento do projeto orla. Delimitar áreas de APP e
aquelas possíveis de ocupação turística e residenciais transformou os encontros
do orla em momentos de extrema tensão. A participação foi muito maior de
representantes de grupos econômicos interessados em limitar ao máximo as áreas
protegidas. Algo que pode servir de atenuante a forte pressão do capital no Morro
dos Conventos é a unidade de conservação que foi homologada via decreto no
final de 2015.
O balneário, parte baixa, muitas das
residências foram construídas há muitos anos e cujos sistemas de esgotamento
estão deficitários. Temos exemplos parecidos na parte superior do bairro, de um
empreendimento hoteleiro, cuja fossa séptica foi construída há cerca de trinta
anos e os resíduos da lavanderia estão sendo lançados na fossa pluvial, que por
sua vez escoam para um lago extinto no bairro. A ocupação com construções
também foi outro item muito discutido nos encontros. Pelas peculiaridades da
geografia do local, residências ou prédios com verticalização acentuada, ou
seja, acima de dois pavimentos, pode comprometer toda dinâmica do complexo
ecossistema. Por isso a restrição para no máximo dois compartimentos a altura
das futuras residências.
A constituição de dunas móveis e fixas nas
áreas do entorno da paleofalesia tem relação direta com a dinâmica dos ventos.
A proliferação de residências ou edifícios com quatro pavimentos, bem como a
proliferação de espécies exóticas da flora, pinos SSP e casuarinas, estão paulatinamente
produzindo mudanças na direção dos ventos que moldam o desenho das dunas.[2]
Conforme decisão do MPF e resolução do
Conselho Estadual do Meio Ambiente, que impede plantação e comercialização de
casuarinas, a FAMA processou o corte de tais espécies e de pinos em trecho de
dunas da orla do Morro dos Conventos. No entanto, a resolução estabelece que
feita a supressão o órgão ambiental deveria repovoar a área com espécies
nativas, que não o fez. O agravante é que a FAMA não executou o trabalho na sua
totalidade como havia prometido, conforme reportagem publicada pela revista W3
em julho de 2016.[3]
A questão turística nos balneários que
congregam o município de Araranguá é outro gargalo que vem impedindo a região de
fortalecer o turismo como uma das opções para o desenvolvimento local e do
extremo sul de Santa Catarina. Desde a década de 1950 com a construção do campo
de aviação e do Hotel Morro dos Conventos deu início os primeiros passos de um ousado
projeto que por décadas inseriu o balneário e o município no cenário regional,
nacional e internacional como uma das rotas mais procuradas e apreciadas.
A falta de uma cultura empreendedora de
trabalho coletivo, somada a incompetência administrativa e política, fez com
que o balneário e o próprio município, num todo, regredissem nesse seguimento
nas últimas décadas em níveis vergonhosos. O declínio do Camping Morro dos Conventos
premiado na década de 1980 com o título de um dos mais estruturados da América
latina está cedendo lugar a um empreendimento imobiliário duvidoso em termos
econômicos e ambientais. Além do município não possuir uma secretaria vinculada
ao turismo, a fragilidade desse seguimento salta aos olhos da população do
bairro e dos veranistas e turistas que freqüentam sazonalmente o balneário.
Não há o mínimo de infraestrutura compatível
às necessidades sociais e ambientais e que foram discutidas no Orla, como posto
de atendimento ao turista; banheiros públicos; equipamentos de lazer;
sinalização compatível nas vias públicas e orla; lixeiras distribuídas pelas
principais ruas do bairro; placas informativas e guias para transitar sobre as
trilhas, as que possuem erros de ortografia;
estudo e estruturação dos sítios arqueológicos para visitação; sistema
de transporte coletivo para levar as pessoas à barra e outros pontos
turísticos, etc.
O projeto orla e os três decretos assinados
no final de 2015, que criaram a MONA (Monumento Natural Morro dos Conventos;
APA (Morro Agudo) e a RESEX (Ilhas) alimentaram as esperanças de um futuro mais
promissor no setor turístico para o município de Araranguá. Mais uma vez, toda
essa expectativa de tentativa de despertar a vocação do município para o turismo,
vai depender da vontade dos novos integrantes do legislativo, executivo e da
própria Fundação Ambiental do municipal de Araranguá. Ambas como entidades
políticas têm por tarefas mobilizar todas as forças vivas da sociedade
organizada. O trabalho de educação ambiental e patrimonial deverá ser uma das
primeiras iniciativas do poder público e da FAMA, entidade ambiental municipal
criada em 2007 com a lei 2.608.
Dos 25 artigos que constituem a lei, o art. 4
trata sobre as 27 finalidades, que aplicadas promoveriam uma extraordinária
revolução no seguimento ambiental e patrimonial no município. Um exemplo é o inciso II sobre as finalidades
onde estabelece a implantação,
fiscalização e administração de unidades de conservação e áreas ambientais e
arqueológicas protegidas do Município, em consonância com o que dispõe a
legislação vigente, visando à proteção de mananciais, ecossistemas naturais,
flora e fauna, recursos genéticos, e outros bens de interesse ambiental e
arqueológico.
Promover o desenvolvimento econômico com o
mínimo possível de impacto ambiental em todo o trecho da faixa costeira nos
limites do município de Araranguá deverá ser compromisso de todos. As três
unidades, criadas em 2016, (MONA, APA E RESEX) junto com o documento do projeto
Orla, atuarão como mediadores desse processo. Portanto, o empenho agora é fazer
cumprir as etapas sistematizadas a partir da elaboração de um plano de manejo
consistente e possível de ser realizado.
Prof. Jairo Cezar
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