BRASIL:
A NAÇÃO QUE OPRIMIDOS RECORREM AOS OPRESSORES PARA SEREM GUIADOS
Quem
acompanha os desdobramentos da política nacional e seus efeitos no campo das
organizações e relações sociais, observa que o Brasil vem se cristalizando dias
após dia com práticas comportamentais repressores semelhantes aos regimes
opressores europeus das décadas de 1930 e 1940. É sabido também que o
afloramento maior ou menor desses ciclos de instabilidade comportamentais e suas
inserções nas camadas sociais, têm relação com a falta de transparência e
corrupção generalizada nas instâncias dos poderes. A violenta guinada à direita
nos últimos anos coloca o Brasil em alerta vermelho, sob risco eminente de vir
a se repetir o nefasto e trágico regime opressor do militarismo entre os anos
1964 a 1980.
A
total descrença da população acerca aos partidos políticos; o crescimento
exacerbado da violência; o desrespeito à constituição; à desmoralização da
política e políticos, tudo isso faz assombrar a incerteza quanto ao futuro,
inclinando ou polarizando as disputas das eleições de 2018 para nomes e
partidos que verbalizam discursos populistas ou ultra-reacionários. E a
história tem registros documentados de episódios recentes que resultaram em
décadas de opressão e violação aos direitos humanos. Isso não significa que o
Brasil esteja hoje imune a tais atrocidades protagonizadas pelo “Estado
Democrático”. As próprias reformas estruturais, trabalhista, previdenciária, em
curso, deixam vácuos perigosos para o aprofundamento das violações e injustiças
sociais.
A
chacina nas periferias das grandes cidades, o assassinato de índios e
trabalhadores sem terra; o feminicídeo; o racismo; a homofobia são consideradas
violações aos direitos humanos naturalizadas no Brasil. Ao mesmo tempo em que
se descumprem abertamente os princípios contidos na declaração dos direitos
humanos, os políticos, na sua maioria, repetem como papagaio o mesmo discurso
quando questionado: “é necessário consolidar os preceitos da república e da
democracia”. Que república, que
democracia, quando 80% da população brasileira ou acima disso são consideradas
analfabetas funcionais, que pouco consegue escrever e interpretar um pequeno
parágrafo.
São
essas mesmas pessoas e outras tantas que vem declarando voto à Lula e a Bolsonáro,
nas eleições do próximo ano. O que esperar do futuro quando ventos ameaçadores
seguem em direção contrária, trazendo riscos de vir germinar governos
populistas e totalitários. Atacar à criminalidade, à corrupção, com legislações
mais severas e edificação de novos presídios não está evitando que o Brasil
mantenha-se no topo dos mais violentos. Quando uma sociedade se sente acuada,
desprotegida, desperta no imaginário coletivo o desesperado apelo por proteção.
São
nesses cenários turbulentos que brotam das profundezas do nosso cérebro a
necessidade de uma “messias”, um líder, cujo discurso e promessa, consegue
atrair os olhares e as esperanças de parcela significativa da sociedade marginalizada.
Propostas como liberação do porte de armas, redução da idade penal,
criminalização do aborto, cura guei, escola sem partido, etc, etc, são típicas aberrações
que atraem mais e mais atenções do desatento e desassistido eleitorado
brasileiro.
Isso
mostra que o Brasil não amadureceu nas suas instituições, que tais cenários
ameaçadores são reflexos da decadência do sistema educacional público
brasileiro. O educador Paulo Freire, atualmente quase esquecido nos espaços
acadêmicos e instituições públicas de ensino básico, todas as obras que
escreveu trazem extraordinários ensinamentos e inspirações sobre humanidade e o
combate a alienação social. No entanto,
os governos que se sucederam ao período pós-ditadura sempre agiram na tentativa
de negligenciar suas idéias, teorias, concepções, distorcendo ou inviabilizando
o afloramento de qualquer projeto alternativo de educação popular.
O
quadro político atual é tão previsível e ameaçador, que forças
ultraconservadoras tentam a todo custo criminalizar Paulo Freire e todo o seu
legado deixado. Usam as mídias sociais
para replicar conceitos errôneos e até mesmo criminosos acerca da sua rica trajetória
política e educacional. A tentativa é enquadrá-lo como personalidade não grata pelos
brasileiros, por ter tido no passado ligações com idéias ou teorias revolucionárias
que se confrontavam com o conservadorismo retrógrado das elites dominantes.
Para uma população semi-analfabeta, que sofre todo o tipo de opressão,
expressões descontextualizadas e insistentemente repetidas vão se cristalizando
no imaginário social coletivo, ao ponto de se tornar verdades absolutas. Há de
concordar que países que menos investem em educação e cultura são mais
suscetíveis a golpes de estado e a regimes opressores.
Mesmo
aqueles regidos por governos ditos democráticos, prevalecem o domínio político
das castas, dos caudilhos e das oligarquias. No entanto, para assegurar a
estabilidade ou status quo institucional desses distintos sistemas, se faz
necessário a cooptação do quadro intelectual das classes subalternas, que irão compor
os principais postos de decisão do Estado. E por que razão? A resposta,
portanto, não é tão simplista como se imagina. As ciências do comportamento,
como a psicologia, neurociência, podem contribuir para responder tais questões
complexas relativas à psique humana. Por estar inserido em uma cultura
historicamente moldada entre dois seguimentos repressores convergentes, Estado
e igreja católica, há de se convir que substâncias de um e de outro se amalgamariam
no cérebro humano e permaneceriam latentes e atuantes por muitas gerações.
Por
ser uma cultura patriarcal, a mulher se condicionou a condição de subalterna em
relação ao sexo oposto, tanto profissionalmente quanto nos espaços de decisão
política. Muitas vezes essa condição de desigualdade e de submissão se
manifesta de forma inconsciente, quase natural. E as tais hierarquizações não
se dão apenas no campo sexual, homem e mulher, são observadas também nas relações
professor/aluno, pai/filho, patrão/empregado.
A
escolha de lideranças ou governos mais liberais ou repressores são reflexos do
modo como as sociedades foram construídas. Desconstruir conceitos e concepções
sobre o modo de ver, pensar, sentir o mundo, dura décadas, até mesmo gerações.
Que sirva de alerta às atuais gerações, as duas décadas recentes e outros
momentos longos no passado, marcados por regimes políticos totalitários. Os
arquivos e livros de história são nossos aliados para que tais episódios sejam
relembrados e jamais repetidos. Embora com todas as falhas e contradições
observadas, a democracia ainda é, teoricamente, a que possibilita as vozes de
serem ouvidas.
Como
fazer valer ouvir as vozes dos oprimidos num regime dominado por meia dúzia mídias
tão poderosas que manipulam informações, corações e mentes? A única esperança é a revolução na educação
pública. Fazer germinar os legados de Paulo Freire, Vigotsk, Gramisc, entre
outros, que idealizaram uma escola autônoma, transformadora, trazendo para o
seu interior os problemas do dia a dia e contextualizá-los com as estruturas
dominantes. Entender que o espaço
escolar é repleto de conflitos e contradições é outro quesito importante para a
desalienação social. O ato de ensinar, como ensinar e para que ensinar deve ser
entendido como ato verdadeiramente político, de construção de possibilidades,
de avanços e rupturas das forças opressivas que dominam e os mantém presos na
caverna escura do desconhecido.
Prof.
Jairo Cezar
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