FRAGILIZAÇÃO DAS REGRAS AMBIENTAIS COLOCA EM RISCO O FRAGIL ECOSSISTEMA COSTEIRO DE ARARANGUÁ
Desde
o instante que criei meu blog para expor opiniões sobre temas variados do
cotidiano, além é claro levar as pessoas a refletirem sobre seus papéis na construção de um mundo mais inclusivo
e justo, até o momento foram mais de 80
mil acessos, porém poucos foram os que encaminharam suas opiniões acerca dos
temas abordados. O fato é que embora não tenha havido muitos comentários acerca
dos temas postados, continuei escrevendo mantendo-me sempre fiel aos princípios que defendo e acredito,
criticidade aos fatos abordados.
Claro
que por ter atuado na educação como professor por quase quatro décadas, esse é
um campo de investigação e reflexão que sempre me instigou. Temas relacionados
à política, à economia e a toda complexidade socioambiental global e local preponderam as páginas do meu
blog. Muito do escrevi sobre questões do cotidiano do município de Araranguá,
nos últimos treze anos, garante ao leitor uma compreensão sem filtro da atuação
dos gestores locais no modo de administrar os recursos públicos nos diversos
segmentos sociais.
Nesse
período em que o blog está em atividade, uma Oscip Ambiental foi fundada no Morro
dos Conventos, cujo objetivo foi e é
servir de interlocutora junto ao poder
público nas demandas ambientais. Como em qualquer sociedade onde os interesses
do capital preponderam sobre o social e o ambiental, no Morro dos Conventos não
foi diferente. Raros foram os momentos em que OSCIP conseguiu articular laços
confiáveis de comunicação e diálogos com qualquer dos gestores públicos que
ocuparam e ocupam o paço municipal. A resistência, porem, sempre foi muito
maior com o órgão ambiental municipal, FAMA, que nos viam como opositores às
políticas de desenvolvimento elencadas para o balneário.
Criminalizar
ambientalistas, transformá-los em bode expiatórios às políticas de fragilização
das regras ambientais passou ser a Tonica dos gestores e das elites políticas e
econômicas de plantão. Poucos sabem que a faixa costeira de Araranguá, da Barra
Velha ao Paiquere, as políticas de ocupação e desenvolvimento passaram a ser
mediadas pelo PGI (Plano de Gestão Integrada) elencados pelos delegados nos
dois anos de projeto orla, de 2012 a 2014. Entendo que esse assunto foi
discorrido em outros textos publicados no meu blog. Entretanto, acredito que pela sua relevância ambiental, repetir
dados, conceitos, ajuda a mantê-lo na memória e no fortalecimento da opinião
critica.
Então
vou mais uma vez repetir aqui, os governos que se sucederam ao Projeto Orla, a
criação por decreto de três unidades de conservação no final de 2016, se evidenciaram
em uma “pedra no sapato” aos interesses do mercado imobiliário especulativo. Sendo assim o que
aconteceu depois de 2016, a partir do governo de Mariano Mazzuco, foi uma forte
investida da gestão em desmontar o que se construiu durante o projeto orla,
sendo uma delas o fim das reuniões do grupo gestor para a execução das demandas
do projeto orla.
A
criação das unidades de conservação, como a APA a RESEX e o MONA-UC, tinha como
propósito atuar como instrumentos mediadores nas políticas de desenvolvimento
sustentável de toda a faixa costeira. Além das unidades, muitas das demandas dos
bairros costeiros do município foram inseridas no plano diretor do município,
cujas alterações ou supressões de qualquer item teriam que passar por audiências com a
presença dos delegados do projeto orla. Cabe frisar que unidades de
conservações são interpretadas como obstáculos aos segmentos do capital imobiliário, entre
outros.
Dito
e feito. Passo a passo as administrações subseqüentes deram inicio ao desmonte ádos
legados ambientais criados pelo governo do PT em Araranguá. O primeiro foi a
APA (Área de Proteção Ambiental) que por intermédio do COAMA (Conselho
Ambiental do Município de Araranguá), suprimiu o Art.2 do decreto 7828/16, que
tratava sobre a proteção da vegetação de restinga. O segundo ato do desmonte
aconteceu em votação de emergência na câmara legislativa, onde foram alterados
dispositivos relativos aos zoneamentos
do balneário, inseridas no plano diretor. Áreas até então definidas como de APP (Área de Proteção
Permanente), agora estão inseridas no zoneamento turístico.
Findado
os quatro anos de governo Mariano Mazzuco, novas eleições foram realizadas
levando ao paço municipal mais uma vez o MDB, partido já experimentado na
gestão do município em outros momentos. Imbuído de uma postura de gestão de
caráter pragmática, com escassa habilidade no campo do dialogo, essa nova
gestão assumiu o compromisso de remover a ferro e fogo todos os obstáculos
legais possíveis à transformar o município, Morro dos Conventos, em especial,
em um verdadeiro canteiro de obras.
Indicou
o turismo como uma das bandeiras importantes da administração nos quatro anos
de governo. Se a proposta é o turismo, é claro que o foco da administração
seria o Balneário Morro dos Conventos. Como já havia exposto acima, como
executar o programa de governo nesse segmento, de um viés desenvolvimentista,
tendo que respeitar um arcabouço de regras elencadas no projeto orla. Os decretos da APA e do MONA/UC, embora não concluídas todas as
etapas para a sua efetivação, também seriam instrumentos que impunham alguma
resistência às demandas turísticas nada sustentáveis ao balneário.
Primeiro ano de governo MDB, uma das primeiras iniciativas da administração foi “abrir a porteira” ambiental para que suas demandas turísticas se concretizassem. Primeiro, é claro, era necessário remover alguns obstáculos legais para neutralizar constrangimentos com os órgãos ambientais fiscalizadores. Em 2022 o governo municipal sancionou lei complementar n. 0417/22 que na mesma tacada alterou o decreto municipal 7829/16 que criou o MONA/UC, reduzindo em 60% da área de abrangência, e a revogação definitiva do decreto municipal 7828/16 que criou a APA, em toda a faixa costeira do município de Araranguá.
Decreto 7829/16 – Mapa delimetando a área do MONA/UC Morro dos Conventos (280.202 há) – MAPA-1
LC
447/22 - Mapa delimetando a área do MONA/UC Morro dos Conventos (109.95ha) –
MAPA-2
Os
três mapas acima que definem os limites do MONA/UC (Monumento Unidade de
Conservação Unidade de Conservação) revelam o pouco interesse das ultimas
administrações em defesa dos nossos
complexos e frágeis ecossistemas do balneário Morro dos Conventos. Na primeira imagem revela uma área de proteção
muito mais abrangente que as duas seguintes. Para que se chegasse ao consenso de
uma unidade mais protetiva houve muitos debates e o empenho insistente, ininterrupto
das organizações ambientais, a exemplo da OSCIP PRESERV’AÇÃO. A intenção era
assegurar a proteção não somente dos ecossistemas, como também do complexo
conjunto de sítios arqueológicos milenares ali existentes.
A
redução progressiva da área de abrangência do MONA/UC se constituiu como um dos
grandes retrocessos ao meio ambiente do sul de Santa Catarina, principalmente
em um momento tão tenso, incerto, como estamos passando devido as mudanças
climáticas. O que deveria estar sendo pensado e executado não seria a redução
das unidades de conservação, mas sua ampliação, bem como a sensibilizando da
sociedade araranguaense na sua proteção. O que se nota na terceira imagem
acima, observando a linha que delimita do Monumento Natural Unidade de Conservação,
parte baixa do balneário, é a exclusão criminosa da área onde estão os sítios
arqueológicos, considerados acervos de informações sobre o clima, solo, fauna,
flora, ou seja, de todo o ecossistema local nos últimos dois, três, quatro mil
anos.
No
projeto de Lei Complementar n. 015/22 que trata sobre a revogação do decreto que criou a APA,
em nenhum momento a administração abriu espaço para ouvir a comunidade
envolvida nas discussões do projeto orla,
prerrogativas acordadas entre os delegados envolvidos na construção do
Plano. A alegação da administração aos ataques aos decretos, a APA, por
exemplo, onde foi suprimida na sua totalidade, se deve a morosidade na conclusão das suas etapas como o plano de manejo e a
indicação da chefia da mesma. Nesse
argumento o governo municipal se contradiz, pois se estava havendo demora na execução das demandas
a culpa era do órgão ambiental municipal, cuja gestão, superintendência, é indicação
do executivo.
O
segundo argumento que “rasgou” de vez o decreto da APA se fundamentou no inciso
V, do art. 4 do decreto municipal 7828/16, que proíbe a mineração na APA. Cabe
aqui esclarecer que a inserção do Art 4 no decreto, se baseou na Lei Complementar
n. 149/12 que discorre sobre o código ambiental municipal. No seu inciso I, Art.
71 afirma que é proibida a mineração de
carvão em todo o território municipal. Pode se presumir que a decisão do
governo municipal em suprimir o decreto da APA, cuja alegação é o seu Art 4, pode ter sido influenciado por
pressões de outros segmentos da mineração no município, dos derivados de área,
cujas jazidas estão posicionadas nos limites da APA.
Violar
os decretos das UCs não foi suficiente para frear a ânsia de “predador ambiental” da atual gestão pública.
Essa denominação de gestão antiambiental foi confirmado em um encontro de
inspeção do MPF (Ministério Público Federal), IMA (Instituto do Meio Ambiente)
e Polícia Ambiental com a administração pública em 2021 no balneário Morro dos Conventos.
Durante a inspeção foi detectado descumprimento das normas ambientais na
construção de um deck nas proximidades do salva-vidas central do balneário. Os
órgãos fiscalizadores recomendaram que
fosse refeito o projeto para que as dunas frontais não fossem cobertas pela
edificação.
Também durante a inspeção foi ouvido da administração que a abertura da rua entre Balneário e o loteamento Paiquere seria executada de imediato. Entretanto meses depois maquinários removeram toda a duna frontal para a abertura da via. O que se constatou foi que o poder público também não seguiu o que foi protocolado no projeto orla, ou seja, a realização de três estudos para escolher o traçado menos impactante para o ecossistema. Depois de concluída a abertura da rua, o MPF deferiu ação de embargo onde permanece até o momento. As últimas ressacas ocorridas no Balneário, parte da rua já foi erodida, como já se presumia e a administração alertada da ocorrência.
11/2021
Google Earth |
Google Earth 02/2024 |
Ficou muito claro que a supressão do decreto da APA contribuiu para a execução de outros projetos que certamente jamais seriam licenciados se as etapas do plano de gestão da mesma fossem concluídas pela administração. Dois desses projetos tiveram como local as margens da manancial Lago Dourado, um loteamento e uma possível marina. Ambos foram denunciados no MPSC, porém, o órgão do judiciário manteve a autorização de continuidade das obras.
10/2020
02/2024
Observe
os dois mapas acima, ambos se referem ao manancial Lago Dourado, fonte de água
que abastece o Balneário Morro dos Conventos. As linhas traçadas em vermelho
demarcam dois empreendimentos em execução no seu entorno. As legislações
ambientais em vigor, o código florestal brasileiro, determina que fontes de
abastecimento público, o lago dourado, por exemplo, teriam que manter no mínimo 50m ou 100m de
área de proteção, que não é cumprido. Outro agravante que foi motivo de
denuncia ao MPSC. No projeto de loteamento licenciado na margem leste do lago
há confirmação da existência de nascentes que ajudam na recarga do manancial.
O terceiro projeto autorizado foi outro loteamento nas imediações do farol, no qual sofreu embargo por descumprimento de regras legais, dentre elas o levantamento da existência de sítios arqueológicos na área do loteamento. Outro detalhe importante nessas imagens. Quanto foi assinado o decreto de criação do MONA-UC, umas das intenções era proteger a paisagem natural no entorno da falésia. Com a aprovação do loteamento, pelo o que se sabe é da década de 1970, toda a paisagem foi alterada. O que o poder público deveria ter exigido ao empreendedor antes do licenciamento era a realização do ECA (Estudo de Conformidade Ambiental), que também não aconteceu.
10/2022
Prof.
Jairo Cesa
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