quinta-feira, 19 de setembro de 2024

 

LIVRO II, DO PESQUISADOR VANDERLEI GOMES, SOBRE ARARANGUÁ (1842-1883) TRAZ  REVELAÇÕES QUE AJUDAM A ENTENDER POR QUE A SEDE DO MUNICIPIO NÃO FOI INSTALADA EM HERCILIO LUZ.

Foto-Jairo


Penso que todos/as os/as araranguaenses teriam de estar se sentindo agradecidos/as, orgulhosos/as por terem a disposição obras historiográficas tão relevantes que narram episódios singulares do extremo sul de Santa Catarina. Produções de nível extraordinário como do Padre Paulo Hobold, História de Araranguá, a primeira pesquisa de excelência que tanto serviu e ainda é hoje fonte obrigatória em investigações sobre as três primeiras décadas da república do embrionário município de Araranguá. Essa obra foi mais tarde revisada e ampliada pelo professor Alexandre Rocha, tornando-a mais robusta e rica em informações

Temos outras importantes pesquisas da nossa história, também produzida por um sacerdote, o padre João Leonir Dal’Alba, no qual publicou duas obras magníficas, a primeira, Memórias de Bernardino Senna Campos, e a segunda, Historia do Grande Araranguá.  Essa última, no entanto, foi construída a partir de entrevistas com cidadãos de diferentes localidades dos municípios da AMESC e AMREC. Outro trabalho exemplar que é merecedor de aplausos e elogios foi escrito pelo professor e também historiador, Antônio Cesar Sprícigo, com o titulo Sujeitos Esquecidos, Sujeitos Lembrados. Uma robusta investigação documental que traz a luz importantes fragmentos da escravidão em solo araranguaense durante o século XIX.

 Tanto a obra do professor Sprícigo quanto a que disserta  sobre o diário de Bernardino Senna campos, ambos os trabalhos permaneceram expostos por algum tempo nas dependências do museu no Centro Cultura de Araranguá.  Claro que não devemos esquecer de citar aqui outras importantes pesquisas historiográficas, uma que virou livro, enquanto que as demais estão disponíveis em forma digital para consulta. A primeira delas é a tese do professor Lucio Vânio Moraes, que investigou o Mercado Religioso e Práticas Pedagógicas: a Congregação de Santa Catarina no Município de Araranguá-SC (1951-1982); a segunda, do professor Cássio Pereira de Souza, que pesquisou a Educação e Memória: uma análise historiografia do Colégio Norma de Araranguá, de 1964-1980; a seguinte, do professor Rodrigo Antônio Matos, Entre lembranças e lutas: memórias de professores sobre a constituição do SINTE Regional de Araranguá. Essa sondagem do professor Rodrigo foi transformada em livro.

O último trabalho historiográfico disponível que também traz fragmentos da educação elementar nos três primeiros anos da república, foi a dissertação construída pelo professor Jairo Cesa em 2004, pela UDESC, com o titulo A Institucionalização do Magistério Público Elementar Catarinense na Primeira República. É possível que existam outras pesquisas desconhecidas para o público no campo historiográfico sobre a região do Vale do Araranguá, podendo estar nos arquivos de inúmeras universidades brasileiras. É importante relembrar aqui muito do que se escreveu acerca de Araranguá, tem o século XX e XXI como corte cronológico investigativo. Isso porém até uma ou duas semanas atrás, quando veio a publico duas relevantes obras expondo o vale do Araranguá, de 1605-1843 e de 1843-1883.

São pesquisas contendo  informações inéditas de uma região que por mais de dois séculos pertenceu à coroa espanhola a partir da assinatura do tratado de Tordesilhas. De Laguna/Capitania de Sant’Ana, para o sul, onde hoje está Araranguá, todo esse imenso território estava do lado espanhol, até que acordos ou tratados posteriores definiram os limites, muito semelhante ao atual desenho do mapa da América do Sul. Da abertura do Caminho dos Conventos à criação da Paróquia Nossa Senhora Mãe dos Homens, onde se instalou o distrito de Araranguá, passaram mais de cem anos. O pesquisador Vanderlei Gomes, no livro I, História do Vale do Araranguá, 1605-1842, o definiu como tempos heroicos.

No preâmbulo que fiz acerca da obra procurei resumir o emaranhado de fatos relevantes nesse intervalo de quase trezentos anos de história. A obra pode se caracterizar como um achado, a peça que faltava de um quebra cabeça, que completado descortinou um cenário bem distinto do que se pensava, abandonado, tomado por densas florestas e povos originários. Nada disso, a região borbulhava vida, tensões, disputas, além de ter sido caminho trilhado por viajantes, navegadores, pesquisadores, como de Augusto de  Saint-Hilaire e outros,  responsáveis pela construção  dos primeiros mapas contendo os cursos de rios, lagos e o conjunto de morros e escarpas a exemplo do Morro dos Conventos.

O livro número II, a obra é tão fascinante quanto a primeira. Como havia dito, sem ter lido o primeiro volume, não havia como compreender o motivo pelo qual a sede do município de Araranguá se estabelecera exatamente onde está hoje e não no distrito de Hercílio Luz. Na capa do livro 2, o rio, a terra, o povo (1842-1883), embora tenha um intervalo cronológico curto está recheado de episódios curiosos e pouco conhecido dos araranguaenses.

Não pretendo aqui esmiuçar a obra, pois deixarei para que os/as leitores/as o/a façam, pois imagino que terão entusiasmos de se imaginar trilhando por densas florestas, por caminhos arenosas, acompanhando o movimento de rudimentares carretas puxadas por cinco, seis ou mais parelhas de bois. Penso que o/a leitor/a irá se surpreender quando perceber que pelas águas do rio Araranguá cruzavam semanalmente barcos/iates, não um ou dois, mais uma dezena ou mais, transportando toneladas de farinha de mandioca, uma das principais atividades econômicas que se destacou durante a segunda metade do século XIX no Vale do Araranguá.

Não há dúvida que a cultura da mandioca foi amplamente discutida em outras obras relevantes da história social local, como o livro do Padre Hobold, a História de Araranguá. Cabe destacar que a cultura da mandioca se credenciou como produto condutor na construção de uma base econômica regional importante. Portanto foi nessa atividade, em maior proporção que outras culturas, que fez gerar um excedente econômico, que por sua vez gerou uma elite que passou a reivindicar autonomia político administrativa. Quem acreditava ser a região um reduto isolado e pouco relevante no cenário estadual, vai perceber, lendo essa obra, que a realidade é outra. A região do Vale do Araranguá, a partir da metade do século XIX em diante foi inquestionavelmente uma das locomotivas que contribuiu para alavancar o estado catarinense como um dos mais pujantes do território nacional.

Prof. Jairo Cesa    

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