Um
pedaço do Brasil visto pela ótica de quatro cidadãos(ãs) sul catarinenses:
Br.101, Araranguá/SC – Natal/RN
Poucas
são as pessoas que se aventuraram em conhecer o Brasil de ponta a ponta
embarcados em um automóvel ou outros meios de transportes, exceto avião que
atinge apenas as capitais e cidades importantes. É ousadia de qualquer um que
seja acreditar que tenha havido indivíduos que tenha conseguido trilhar cada
estrada, cada cidade desse imenso pais com uma área territorial que supera os 9
milhões de quilômetros quadrados. Para alcançar tal êxito seriam necessários
meses e quem sabe até anos de estrada. Diante dessas dificuldades, as imagens
que muitos tem do Brasil são aquelas transmitidas pela televisão e jornais, cuidadosamente
selecionadas de acordo com os interesses de quem a produz.
Com
a intenção de conhecer uma pequena fração desse imenso território, no dia 29 de
dezembro de 2012, quatro aventureiros do sul de Santa Catarina, iniciaram uma
longa jornada que duraria 23 dias e cujo objetivo final era chegar a capital do
estado do Ceará, Fortaleza, distante 5 mil quilômetros aproximadamente de
Araranguá, cidade onde iniciou a aventura. Depois de ter percorrido 4,5 mil
quilômetros de estrada, sempre margeando o litoral pela Br. 101 chegamos a
Natal/RN, última cidade visitada, iniciando a partir dali o retorno. A não
continuidade da viagem até fortaleza foi em decorrência do cansaço e do pouco
dinheiro disponível.
No
trajeto entre Araranguá a Rio de Janeiro a rodovia 101 está totalmente
duplicada, com exceção a alguns pontos ainda em construção no trecho sul de
Santa Catarina. A surpresa foi a existência de uma grande quantidade de pedágios
instalados em vários pontos da rodovia, cujos valores cobrados compartilham com
as condições das mesmas. Nos trechos com preços menores percebemos certo
desleixo quanto a conservação da rodovia. Porém na Via Dutra, ligando a capital
de São Paulo à cidade de Rio de Janeiro as condições da rodovia são melhores
que as demais, porém o valor do pedágio cobrado nas três praças é superior as
demais praças, atingindo dez reais cada uma. No entanto constatamos que este
valor, superior as outras praças, é apenas aparente, pois as distâncias das
demais praças fora do eixo rio são Paulo são menores, equivalendo a 20km
aproximadamente, enquanto que na via Dutra, é de 60 a 70 km entre um pedágio e
outro.
Em toda
extensão já duplicada da rodovia e conseqüentemente controlada pelas concessionárias
foram gastos aproximadamente 200 reais entre ida e volta cuja distância total
não atingiu a 1.500 km. A indignação era tamanha quando chegávamos a uma das
muitas praças de pedágio e ter que pagar pelo uso da rodovia, sabendo da
enormidade de carros que circulavam pela mesma e da enormidade de recursos cobrados
pelo governo que seriam suficientes para melhorar todas as rodovias brasileiras.
Quando chegamos ao município de Rio Bonito, 50 km de distância da cidade do
Rio, sabíamos que a partir daquele trecho até Recife, a rodovia seria em pista
única e em péssimas condições de acesso.
A
sensação era de que estávamos entrando em outro país esquecido pelas
autoridades, pois além da precariedade das estradas, a miséria beirava a
rodovia cujas cidades na qual visitamos servia de referência acerca do
distanciamento do estado quanto aos
projetos de infra-estrutura básica.
O cenário da geografia foi mudando
gradativamente a medida que íamos nos deslocando. A região que abrange o norte
do Rio de Janeiro, todo o litoral do Espírito Santo e sul da Bahia a cultura do
café expõe seu traço econômico dominante, porém, especialmente no norte do
Espírito Santo e sul da Bahia percebemos que essa cultura vem sofrendo os
efeitos da estiagem, com exceção a algumas propriedades que adotam o sistema de
irrigação. Também entre os estados do RJ
e ES, enormes áreas da mata atlântica estão desmatadas ou queimadas e
substituídas por reflorestamento de eucaliptos para abastecer as grandes
indústrias de celulose ali existentes. São dezenas, centenas de caminhões bi e tri
trens que trafegam diariamente pela 101 agravando ainda mais a trafegabilidade
devido aos enormes buracos produzidos pelos mesmos. Um pouco mais a frente, já nos
estados de Sergipe e Alagoas o problema são com os caminhões que transportam
cana de açúcar para abastecer as usinas de álcool que além de danificar a rodovia devido ao
excesso de peso, transitam sem nenhuma proteção, lançando sobre a estrada pedaços de cana
causando riscos para aqueles que ali transitam. O fato mais grave é que não
vimos em nenhum momento do caminho fiscalização policial ou balança de pesagem.
O problema
da estiagem na região saltava aos olhos quando observávamos a paisagem seca e
fosca dos campos e especialmente as condições dos rios tanto os pequenos como
os considerados importantes entre eles o Rio Doce e o São Francisco cujos níveis
de vazão estavam abaixo do limite normal.
Afetados
pela longa estiagem, as condições de subsistência da população localizada no
interior da região nordeste acredita ser nitidamente piores que aquelas
situadas próximas a rodovia que, aproveitando-se do fluxo de veículos que
trafegam pela mesma diariamente, principalmente caminhões e carros de passeio, desenvolvem um comércio paralelo de frutas e
produtos artesanais.
Saindo da
região cafeeira viajamos uma longa distância até a região de Itabuna/BA cuja
rodovia nas duas margens estão as plantações de cacau protegidas por uma
floresta ainda preservada. Como em qualquer cidade de médio porte, Itabuna que
teve sua origem associada a cultura do Cacau, nos deixou uma impressão negativa
quando constatamos que o principal rio que corta a cidade e cujo hotel que hospedamos
ficava muito próximo da sua margem, estava também poluído. O intenso calor da manhã misturado com o odor
vindo do leito do rio não tirava o estímulo das pessoas, dezenas delas que
faziam suas caminhadas na sua duas margens. O grau de contaminação era tamanho
que grande parte de sua extensão estava recoberto por água-pés, planta aquática
que dependendo da sua quantidade nos fornece uma noção da intensidade de
contaminação da água.
Saindo
da região do Cacau um novo cenário nos aguardava, agora bem diferente dos
anteriores. Vastas extensões de terras ocupadas por plantações de laranjas nos
impressionavam desconstruindo a idéia de que a cultura da laranja não se
concentrava somente no interior de São Paulo. No entanto, era visível aos olhos de todos
que a estiagem também afetara tal atividade, pois os laranjais estavam quase
que completamente secos. Inúmeras barracas com frutas e produtos regionais como em outros trechos da
rodovia estavam distribuídas as margens da mesma, uma forma talvez de garantir
a sobrevivência da população local.
Próximo
a capital da Bahia, visitamos duas cidades próximas a Br.101, Cruz das Almas,
conhecida nacionalmente pelas brincadeiras com fogos de artifícios durante os
festejos juninos e Conceição que nos apavorou quanto a sua condição de higiene,
o lixo e o esgoto a céu aberto dava as boas vidas ao visitante. No entanto,
seus habitantes calmamente transitavam
por suas ruas sem se incomodarem com o problema, parecendo se conformarem com
tudo aquilo.
O
trecho mais crítico da Br. 101 foi entre os estados de Sergipe e Alagoas,
considerado por muitos moradores da região como um dos mais perigosos em
decorrência dos assaltos frequentes. Percebemos trechos que estão sendo
duplicados, porém completamente parados, semelhante ao que vinha ocorrendo no
trecho sul da Br.101, anos atrás. A estrada não deixa dúvidas de que é muito
arriscado dirigir a noite, pois são enormes crateras que tornam a viagem lenta de
tediosa. Pelos buracos e matagal existente, acredita-se que há muito tempo a
mesma não recebe manutenção.
Desde o
litoral nordeste da Bahia, passando pelos estados de Sergipe, Alagoas,
Pernambuco, Paraíba até Rio Grande do Norte, quase toda extensão de terras que
margeia a rodovia 101 é ocupada pela cultura da cana de açúcar, cuja atividade
como se constatou pela presença das usinas, tem por objetivo a produção de
etanol. Deixa claro que a atividade canavieira tem uma grande
representatividade na economia desses estados. No entanto, embora o cultivo,
transporte e beneficiamento sejam
totalmente mecanizados, sem esquecer que a prática da irrigação é presente em
todas as propriedades, quanto a realização do corte os enormes incêndios que
eram possível de serem vistos na queima da palha abria uma suspeita de que o
corte da mesma continuava manual.
Dito e
feito, em pleno domingo pela manhã, debaixo de um sol escaldante dezenas de
trabalhadores uniformizados faziam o corte da cana, um ambiente, como se viu,
completamente insalubre. Por que o uso da mão de obra no corte da cana, sabendo
que já havia tecnologia suficiente para a realização desse trabalho? Esse foi o
questionamento que dominou o ambiente do automóvel durante alguns minutos. Analisando o problema da estiagem que atinge
vasta área da região, a presença de trabalhadores no corte da cana nos deu a
certeza de que para o proprietário da fazendo era mais barato o emprego do
trabalho manual que o mecanizado.
Na
mesma região ocupada por canaviais, em muitos trechos, próximo a rodovia, nos
deparamos com acampamentos dos sem terras, cujo estado das residências nos
impressionava devido a precariedade. As imagens das favelas divulgadas pela
televisão e jornais são verdadeiros palacetes em comparação aos casebres feitos
de barro e cobertos de palhas dos acampamentos e assentamentos dos sem terras.
Entre as capitais visitadas, Recife nos deu a
impressão de ser uma cidade muito semelhante a cidade de São Paulo, com um
trânsito inchado de automóveis, um rio que corta a cidade totalmente
contaminado e suas praias como a de Boa Viagem dominada por arranha céus e
quiosques a beira mar cujos proprietários dominam toda a orla instalando guarda
sóis e cadeiras para serem alugadas aos turistas. Constata-se um processo
gradativo de privatizando das praias, fato também corriqueiro nas praias do Rio
Grande do Norte.
Em
termos de preservação do patrimônio histórico e arquitetônico tanto de recife
como de Olinda, percebemos que o descaso do poder público é enorme. Na cidade
de Olinda, é visível a depredação das igrejas e demais construções datadas dos
séculos XVII e XVIII. Sem contar o impacto que a cidade vem sofrendo diante do
crescimento do fluxo de veículos sobre suas ruas e vielas comprometendo a
estrutura local. Na cidade de recife não é diferente, são poucas as construções
preservadas, muitas das quais transformadas em centros culturais adotadas por
organizações financeiras como Banco do Brasil, Caixa Econômica entre outros.
Antes
de chegarmos a capital pernambucana, ficamos um dia em Aracaju. Procuramos
conhecer a cidade a pé. Foram quase 12 quilômetros de ida e volta, sob um sol escaldante.
Durante o percurso notamos que a cidade tinha passado por melhoramentos a pouco
tempo. Nas margens de um mangue na qual transitamos notamos que a calçada e a
ciclovia tinham sido construídos ou restauradas recentemente, sendo que ambos faziam
ligação ao principal parque da cidade, um local moderno com boa infra-estrutura
esportiva de lazer.
No
centro da cidade de Aracaju, além do grande movimento de pessoas nas ruas, há um
grande mercado público com uma arquitetura colonial, demonstrando a presença do
colonizador europeu na região. O mercado é certamente uma das principais atrações
do local, atraindo pessoas de diferentes regiões e países na busca de produtos
regionais.
Chegando
ao estado do Rio Grande do Norte, fomos direto para uma praia cujo nome era
Ponta Negra, considerada para os cidadãos locais uma das mais preferidas por
turistas estrangeiros. O que nos surpreendeu foi o enorme movimento de automóveis
bugues, principalmente pela manhã. São esses veículos que transportam turistas diariamente para conhecer
as famosas dunas de Genipabu. Passeando na Orla de Ponta Negra nos deparamos que
a mesma há muito tempo não recebia manutenção, pois o lixo e o mau cheiro
ocupava toda o trecho da praia onde
estavam localizados os hotéis e pousadas mais importantes do balneário. Sem
contar a existência de alguns córregos que lançavam no mar o esgoto.
Quando
perguntamos as pessoas o motivo pelo qual do lixo espalhado, a resposta foi
unânime, a prefeita de natal tinha sido caçada por corrupção, deixando o
município de natal numa situação de penúria. Muitos diziam, principalmente os
comerciantes ambulantes, que o número de turistas no local tinha caído
expressivamente nessa temporada e o
motivo principal era a depredação da praia.
Outro
observação interessante presenciada em Ponta Negra é a progressiva destruição
do calçadão em decorrência da elevação do nível do mar. Segundo os moradores,
em julho de 2012, a praia foi atingida por uma imensa maré que destruiu parte
da calçada. No entanto, até o momento que visitamos, a situação continuava a
mesma.
Quando
iniciamos o retorno, hospedamos na famosa praia de Porto de Galinhas, conhecida
pelas suas belas praias e por suas piscinas naturais que se formam nas marés
altas no oceano graças a presença de arrecifes, servindo de atração para o
turista. O que se viu no local foi a existência de inúmeros hotéis e pousadas
de categoria cinco estrelas cujas diárias impossibilitam o cidadão comum de
usufruí-los.
No entanto, são as grandes redes hoteleiras
internacionais que estão se instalando no local, estimuladas certamente por
incentivos fiscais e também graças a certeza de uma farta uma mão de obra
barata, que garante a essas empresas ganhos fabulosos. Para se ter uma idéia do
tamanho do lucro, a diária mais barata para um casal, com café da manhã chega a
custar 650 reais.
A surpresa
em Porto de Galinhas, um bairro que pertence ao município de Ipojuca, foi
quando chegamos a vila onde estão instalados o comércio em geral e os bancos. A sujeira e o mau cheiro tomava conta
do local, sem contar com o esgoto a céu aberto margeando lojas, bares e
restaurantes.
TRANSPORTE DE CANA DE AÇÚCAR - ESTADO DE ALAGOAS
USINA DE ETANOL - ALAGOAS
CORTE DE CANA - ESTADOS DE SERGIPE E ALAGOAS
ACAMPAMENTOS DE SEM TERRA - AS MARGENS DA BR-101, ALAGOAS E SERGIPE
ASSENTAMENTOS DE SEM TERRA NAS PROXIMIDADES DA BR-101: SERGIPE E ALAGOAS
PORTAL DE UM PARQUE - CIDADE DE ARACAJU
COMÉRCIO DE AMBULANTES - PRAÇA DE ARACAJU
PRAIA DE BOA VIAGEM - RECIFE/PE
AREIAS MONAZÍTICAS - PRAIA DE GUARARAPI/ES
CICLOVIA E CALÇADA - ARACAJU/SE
PRAIA DE PONTA NEGRA - NATAL/RN
CENTRO HISTÓRICO DE RECIFE
ASSENTAMENTOS DE SEM TERRA - SERGIPE E ALAGOAS
CENTRO HISTÓRICO DE RECIFE
PRAIA DE BOA VIAGEM - RECIFE
PRAIA DE PONTA NEGRA - NATAL/RN